A curiosa trajetória de Marcão Gomes: do berço no PT aos braços de Jair Bolsonaro em 2022

As eleições de 2022 estão sendo apresentadas como um confronto entre projetos bem disitntos que colocam em cada um dos polos o ex-presidente Lula e o atual ocupante da cadeira presidencial, o capitão reformado Jair Bolsonaro.  Em princípio essas posições são apresentadas como irreconciliáveis e de difícil assimilação pelos dois lados em embate.

No entanto, quem vem a Campos dos Goytacazes e circula pelas ruas vai encontrar um exemplo que coloca toda essa tese em questão. Falo aqui da candidatura do ex-vereador e suplente de deputado federal, o advogado e servidor público Marcão Gomes. 

É que tendo aparecido na política partidária como vereador do PT, Marcão Gomes sabe-se lá o porquê bandeou-se para a Rede durante o fatídico governo de Rafael Diniz para depois, também sem muita explicação, passar para o PL que recentemente também deu abrigo ao presidente Jair Bolsonaro. 

E é aí que a porca de Marcão Gomes torceu o rabo.  Contrariamente até a muitos candidatos do próprio PL, o idealizador da Lei Municipal 002/2018 que instituiu um programa municipal de entrega de sacolões está com um material de campanha em que procura utilizar a figura de Jair Bolsonaro para angariar votos suficientes para repetir a votação de 40.000 votos de 2018 e voltar para o conforto dos corredores do congresso nacional em 2023 (ver imagem abaixo).

marcao gomes

Eu fico pessoalmente em dúvida sobre qual seria a explicação que Marcão Gomes daria para tamanha amplitude de opções ideológicas. Entretanto, mais importante seria refletir sobre como o PT de Campos dos Goytacazes conseguiu encher a bola de um militante que agora se revela um bolsonarista de carteirinha. Isso mais do que pesar sobre Marcão Gomes, pesa sobre a organização partidária do PT, na medida em que as posições ora apresentadas não devem diferir muito daquelas em que ele apresentado como o futuro do partido na cidade.

Ah sim, tive a curiosidade de checar a performance de Marcão Gomes enquanto ocupou o mandato de deputado federal entre 18/12/2019 e 08/10/2020.  Marcão teve 0 proposições transformadas em norma jurídica (o fato de que ele apresentou apenas 2 proposições apresentadas pode ser parte da explicação) e e 0 relatórias transformadas em norma jurídica. Convenhamos que é muito pouco para quem esteve em Brasília por quase 1 ano.

Governo Rafael Diniz deixa agricultura familiar subfinanciada para gastar fortunas com sacolões de merenda escolar

Da produção dos assentamentos para o prato da cidade, no Rio de ...

Na Feira Estadual da Reforma Agrária Cícero Guedes, parte significativa dos produtos comercializados é originada dos assentamentos localizados em Campos dos Goytacazes.

A partir do blog do economista José Alves Neto pude verificar a profunda involução orçamentária que a Secretaria Municipal de Agricultura sofreu durante o governo Rafael Diniz que chegou a investiu 30 menos do que o fez o prefeito Arnaldo Vianna no distante ano de 2001 (ver gráfico abaixo).

agricul 2020

Fonte: Blog do José Alves Neto

Se pegarmos apenas os 3 anos iniciais do governo Rafael Diniz, o montante aplicado na Secretaria Municipal de Agricultura chega a minguados R$ 1.776.160,00! 

O peculiar (vamos achar assim) é que temos agora a informação de que o prefeito Rafael Diniz (Cidadania) e o agora ex-secretário municipal de Educação, Brand Arenari (PSB), teriam sido instados pelo Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro a devolver a bagatela de R$ 6,7 milhões por superfaturamento em contratos para o fornecimento de merenda escolar, envolvendo as empresas Nutriplus Alimentação e Tecnologia Ltda (sediada em Joinville, SC) , Casa de Farinha S/A (sediada em Recife, PE) e Verde Mar alimentação (sediada em Ortolândia, SP). 

Mas o montante fabuloso que levou à determinação do TCE contra Diniz e Arenari chega a ficar pálido diante do que noticiei aqui em relação à extrato de dispensa de licitação para aquisição de “kits de alimentação” pela Secretaria Municipal de Educação de Campos dos Goytacazes no valor de R$10.184.681,25. O interessante é que coincidentemente também neste contrato há a presença, ainda que indireta, da Nutriplus Alimentação e Tecnologia Ltda que participa do quadro societário da empresa beneficiada pela milionária dispensa de licitação, a  Quotidien Comercial Atacadista Ltda.  

Mas voltando ao ponto inicial desta postagem que é o subfinanciamento da Secretaria Municipal de Agricultura, é preciso notar que apenas no negócio firmado sem licitação com a Quotidien Comercial Atacadista Ltda, o valor gasto em um único contrato é quase seis vezes maior do que o investido pelo governo Rafael diniz na agricultura municipal em seus 3 anos iniciais.

Antes que alguém diga que não existe alimento produzido localmente em escala suficiente no município de Campos dos Goytacazes para justificar a elevação dos investimentos feitos a partir da secretaria municipal de Agricultura, eu mostro o mapa abaixo com os assentamentos de reforma agrária existentes em Campos dos Goytacazes (que estão assinalados em vermelho).

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A questão aqui é estes nove assentamentos são um celeiro agrícola que, apesar de negligenciado por diferentes administrações municipais, produz comida que acaba sendo exportada para vários estados brasileiros. E o pior é que parte desta comida produzida em solo campista acaba retornando para cá na forma, sim, isso mesmo!, de sacolões, e com os valores que chamaram tanto a atenção dos técnicos do TCE.

Então, se algum candidato a prefeito me perguntasse o que deveria ser feito para garantir comida abundante e localmente produzido, a minha sugestão seria para que parassem com as compras (muitas vezes sem licitação) e investissem na agricultura familiar que produz, apesar de todo o abandono a quem sido relegado. Aí teríamos mais comida e a preços muito mais econômicos para os cofres públicos municipais. Uma boa iniciativa seria criar uma versão municipal do programa federal de aquisição de alimentos (PAA) ao qual o município nunca efetivamente participou.

 

Sacolões com preços salgados são o maior negócio da pandemia

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Logo após as fortes tempestades que assolaram a região Serrana do Rio de Janeiro em 2011, causando milhares de mortos e deixando um rastro de destruição, o que se viu logo em seguida foi a erupção de uma série de denúncias (posteriormente confirmadas) de que o dinheiro enviado pelo governo federal tinha sido ilegalmente desviado por parte daqueles que deveriam ter zelado pelo seu correto uso em prol das vítimas.

Pois bem, agora em meio à pandemia da COVID-19, estão aparecendo uma série de matérias que dão conta que prefeituras estão adquirindo os chamados “sacolões” sem o devido processo licitatório e a preços que são incompatíveis com o que é praticado corriqueiramente até para quem compra em pequenas quantidades.

Dois casos me chamaram a atenção em relação à compra de sacolões com preços exorbitantes. O primeiro ocorreu em Búzios onde a prefeitura local teria comprado 20.000 cestas básicas a um preço unitário de R$ 185,25, com o valor total do contrato chegando a R$ 3,5 milhões! O caso foi levantado pelo site “Iniciativa Popular Búzios” que verificou, entre outras coisas que a empresa que supostamente vendeu os sacolões não foi a mesma que fez as entregas.

Segundo reportagem da “Iniciativa Popular Búzios” caminhão fez entrega de sacolões não era da empresa que venceu o processo licitatório no valor de R$ 3,5 milhões

O segundo caso ocorreu aqui mesmo em Campos dos Goytacazes onde a Secretaria Municipal de Educação adquiriu,  com dispensa de licitação, supostamente por causa da emergência sanitária causada pela COVID-19, kits de merenda escolar no valor de R$10.184.681,25 (dez milhões, cento e oitenta e quatro mil, seiscentos e oitenta e um reais e vinte e cinco centavos) por um período de 90 (noventa) dias, sem que houvesse a especificação do número de unidades adquiridas. O que chamou a atenção nesse caso foi o fato que a vencedora, a QUOTIDIEN COMERCIAL ATACADISTA LTDA, tem no seu quadro societário a NUTRIPLUS ALIMENTACAO E TECNOLOGIA LTDAinvestigada na operação contra a máfia da merenda de São Paulo.

Extrato de dispensa de licitação para aquisição de “kits de alimentação” pela Secretaria Municipal de Educação de Campos dos Goytacazes no valor de R$10.184.681,25

Ainda que não se possa afirmar que os gestores envolvidos agiram de má fé, não deixa de ser espantosa a coincidência não apenas na contratação milionária para a entrega de sacolões por prefeituras que vivem afirmando estar em crise financeira, como também a participação de empresas que, olhadas de perto, não são exatamente um exemplo de boas práticas comerciais.

O problema é que enquanto a Prefeitura Municipal de Campos dos Goytacazes se dispõe a um gasto milionário, e sem licitação, para a compra de sacolões, não há qualquer movimento para que se reabra o Restaurante Popular “Romilton Bárbara” que foi fechado no dia 09 de junho de 2017. Com isso, as filas que já eram grandes em frente ao Mosteiro da Santa Face se tornaram gigantescas, tornando aquele local um ponto crítico para possível disseminação do coronavírus.  

Mosteiro do Jardim São Benedito alimenta 150 pessoas por dia em ...

Daí é que eu pergunto: o que ainda impede a reabertura do restaurante popular de Campos dos Goytacazes? É que se possível dispensar licitação para a compra de kits de alimentação, e sem licitação, em nome da emergência causada pela COVID-19, por que isso não pode ser feito para oferecer comida para os mais pobres em condições mais controladas do que está ocorrendo neste momento em frente ao Mosteiro da Santa Face, em que pese o estupendo trabalho das freiras que estão oferecendo alimentos?