O mote da campanha comercial de descontos nos preços de vendas proporcionais aos impostos é uma espécie de Black Friday de promoção de indignidade à cidadania.
Chamando os descontos de “Dia Livre de Impostos”, faz esse mau uso paradoxal do valor da liberdade, como se ficar privado da cooperação pelos esforços econômicos coletivos não fosse uma violência contra a sociedade e contra a própria noção civilizatória.
Um dos kits promocionais estampa um posto de gasolina vendendo o produto com valor mais baixo que o praticado. As entidades realmente compromissadas com o bem-estar social precisam advertir a população que, se essa distopia da ausência de tributos se concretizasse, o veículo abastecido sequer poderia trafegar com esse combustível adquirido com desconto, já que necessitaria de vias públicas e estas existem porque são um dos inúmeros benefícios que existem por causa dos impostos.
A propriedade de um posto de combustíveis é outro bem que é mantido e garantido pelo Estado que existe em razão dos impostos. Não fossem os impostos, não haveria os registros públicos nem a força coercitiva do Estado que se lhes os fizesse respeitar e o estabelecimento varejista seria apropriado por terceiros numa sociedade sem lei. E quem se investisse do domínio do estabelecimento não necessitaria fazer campanha de descontos como essa, uma vez a força incontida por qualquer regra lhe permitiria exigir o que quisesse pelos seus bens. Pois não só a garantia de direito de propriedade, mas as próprias regras que permitem a existência do mercado são de ordem pública.
Sequer o malfadado post de rede social divulgando essa campanha desinformativa chegaria aos usuários uma vez que a própria internet, a própria rede mundial, é resultado de investimentos públicos, possibilitados pelos impostos.
O pior dessa campanha é o elitismo que a fundamenta. Os mais pobres são os que mais dependem de serviços públicos garantidos pelos impostos: então a ideia tenciona os ludibriar com um dia de descontos (mas sem o corte dos serviços públicos de saúde, educação, segurança etc.), como se fosse possível eles terem acesso a bens públicos, sem o financiamento coletivo dos mesmos: ou seja, teriam todos os serviços públicos e ainda uma renda maior já que o salário poderia comprar mais com preços menores.
E os engodos vão se empilhando: porque retirando-se o imposto não seria o bem-estar social genérico a prioridade de uma empresa no mercado, mas provavelmente o alargamento de seu lucro, porquanto há pouca possibilidade que a redução de custos seria automática e totalmente repassada ao consumidor.
A desinformação principal é a ocultação à cidadania que as sociedades mais desenvolvidas do mundo guardam relação direta com uma carga tributária per capita maior. Seguem o princípio pelo qual as riquezas são fruto do esforço coletivo e por isso esses frutos precisam ser usufruídos coletivamente. Com um investimento em serviços públicos maior por cidadão conseguem reduzir desigualdades e oferecer condições para uma sociedade mais justa e inclusiva. Os impostos são, portanto, as condições de possibilidade do seu desenvolvimento.
A campanha promocional desinforma e desvia da verdadeira questão tributária brasileira que é a anomalia da solidariedade arrecadatória: nosso sistema tributário vigente faz com que os impostos sejam mais arrecadados pelos mais pobres que pelos mais ricos, diferente do que acontece em países mais desenvolvidos e menos desiguais que o nosso. O poder econômico consegue, com muita eficiência no Brasil, esquivar-se de pagar sua parcela e sobrecarregar os mais necessitados.
A saída civilizatória não é precarizar o financiamento dos serviços públicos, mas sim reorganizar a progressividade tributária de nossa arrecadação com nova robustez, para que possamos ofertar o mesmo nível e qualidade de serviços e bens públicos que as sociedades mais desenvolvidas colocam à disposição de seus cidadãos.
Cássio Vieira Pereira dos Santos
Presidente da Anafisco
Vilson Antonio Romero
Presidente da Anfip
Marcos Sérgio da Silva Ferreira Neto
Presidente da Febrafisco
Fábio Henrique de Sousa Macêdo
Presidente da Fenafim
Francelino das Chagas Valença Junior
Presidente da Fenafisco
André Horta
Diretor Institucional do Comsefaz
Isac Moreno Falcão Santos
Presidente do Sindifisco Nacional
Antônio Geraldo de Oliveira Seixas
Presidente do Sindireceita
Mauro Silva
Presidente da Unafisco