A Petrobras e o derrame de tolueno no sistema Imunana-Laranjal: filho feio não tem dono

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Audiência pública da Comissão de Meio Ambiente da Alerj. Foto: Thiago Lontra

A convite da Comissão de Meio Ambiente da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro estive presente em uma audiência pública que reuniu autoridades, ativistas ambientais, líderes dos pescadores artesanais e agricultores, e representantes da Petrobras.  O objetivo desta audiência era não apenas discutir um grande derrame de tolueno (um produto com alta toxicidade e capaz de de causar fortes danos ambientais e à saúde humana) que suspendeu o abastecimento de água potável para mais de 2 milhões de pessoas no início de abril deste ano em função da contaminação ocorrida nas águas que abastecem o chamado sistema Imunana-Laranjal.

A parte inicial foi marcada por uma série de manifestações de representantes de entidades que representam os interesses de pescadores artesanais, caranguejeiros e marisqueiros que atuam na região afetada pelo derramamento do tolueno.  Ainda nessa fase pude colocar algumas questões pontuais sobre aspectos aparentemente ainda não devidamente esclarecidos, incluindo o ponto exato do derramamento, do total de tolueno que teria entrado nos corpos hídricos, bem como do total de compostos que teriam sido despejados, além do tolueno, e ainda da falta de informações sobre esses compostos não apenas na água, mas também em sedimentos e em peixes e outros organismos. Além disso, lembrei que em qualquer grande evento de contaminação, temos dois tipos de consequências: as agudas que são aquelas que correspondem aos momentos subsequentes à ocorrência do problema, e os crônicos que são aqueles que tratam do efeito prolongado do aporte de substâncias tóxicas sobre compartimentos ambientais e sobre a saúde humana.

Curiosamente, logo após a minha fala, quem teve a palavra foi uma representante legal da Petrobras que, apesar de ter sido surpreendida pelo objeto central da audiência, tinha uma apresentação pronta para apresentar a posição da empresa sobre o incidente do tolueno. Dentre os pontos apontados, a apresentação da Petrobras trouxe informações curiosas, dentre as quais destaco:

  • a empresa ainda não conseguiu determinar quem foi o responsável pela derramamento de tolueno, mas que já está claro que o incidente não foi causado pelas estruturas que a Petrobras possui na área do derrame,
  • que análises realizadas pela PUC/RJ em 195 amostras coletadas na área afetada pelo grave acidente ambiental apenas se detectou a presença de tolueno, o que reforçaria a premissa de que o tolueno não  teria sido lançado a partir das estruturas de dutos que a Petrobras possui na área do antigo Comperj,
  • a Petrobras aventou como possibilidade de origem o derrame do tolueno a partir de laboratórios clandestinos de produção de drogas ou até de caminhões que trafegam pela região afetada.

A conclusão desse arrozoada seria obviamente que a Petrobras até estava colaborando com equipes para controlar a difusão do tolueno nos rios que abastecem o sistema Imunana-Laranjal, mas que o fazia em uma boa demonstração de boa governança sócio-corporativa e não por qualquer admissão de culpa.

Pois bem, tudo poderia parecer bem resolvido para a Petrobras se não fosse a intervenção do presidente da Comissão do Meio Ambiente da Alerj, o deputado Jorge Felippe Neto (Avante), que rapidamente colocou algumas questões que colocaram em xeque a narrativa da Petrobras. Dentro os pontos levantados por Jorge Fellipe Neto, destaco os seguintes:

  • Como a origem do derramamento está próximo de estruturas da Petrobras e em local ermo e isolado, como seria possível que a Petrobras não saiba ainda qual foi origem do tolueno que foi chegou em grande quantidade aos rios que abastecem o sistema Imunana-Laranjal?
  • Dado o conhecimento e acordo existente de que a carga de tolueno que foi derramada nos rios do sistema Imunana-Laranjal, a hipótese “laboratório clandestino de drogas ou acidente com caminhões” parece bem mais improvável do que o acidente com um duto da Petrobras.
  • Se a Petrobras é a fabricante do tolueno que é distribuído no Brasil, como é possível que a empresa não saiba quem poderia ter causado o acidente?

Um problema a mais na linha de argumentação oferecida pela representante da Petrobras acabou aparecendo um pouco mais tarde ao longo da audiência quando o deputado Jorge Felippe Neto leu os resultados de um laudo produzido pelo Laboratório de Estudos Marinhos e Ambientais da PUC-RJ, o mesmo que teria feito as análises apresentados pela Petrobras na audiência.

Como me retirei da audiência antes do final, não sei como os representantes da Petrobras responderam às discrepâncias apontadas em relação ao tipo de composto que teria sido encontrado nas amostras de água coletadas nos rios que fornecem água bruta para o sistema Imunana-Laranjal.  Mas me parece óbvio que a narrativa trazida pela Petrobras para se isentar de responsabilidades neste grave acidente industrial não se sustenta quando confrontada com elementos lógicos básicos.

Mas sinceramente eu não me surpreendi com a postura dos representantes da Petrobras, pois não esse não é o primeiro, nem será o último caso, em que filho feio não tem pai, especialmente quando se trata de uma questão que afetou e continua afetando uma área densamente povoada que abrange os municípios de São Gonçalo, Itaboraí e Magé.

Mas como os representantes do Ministério Público Estadual do Rio de Janeiro deram conta que existem duas investigações em curso para apurar esse acidente, é bem possível que ainda tenhamos novos e dramáticos capítulos por serem vividos nesse caso.

Finalmente, vamos esperar que a Comissão de Meio Ambiente e seu presidente, o deputado Jorge Fellipe Neto, dêem a devida continuidade aos esforços não apenas de identificação e responsabilização dos culpados, mas também as ações de reparação aos que tiveram seus meios de subsistência comprometidos por esse acidente ainda sem pai.

Para quem desejar assistir a audiência em sua integralidade, basta clicar [Aqui!].

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