Extração ilegal de madeira na Amazônia tem aumento de 184% em Unidades de Conservação

Imagem do Post

Por Imaflora 

De agosto de 2023 a julho de 2024, a exploração ilegal de madeira na Amazônia brasileira aumentou 184% em Unidades de Conservação (UCs). No período analisado, foram explorados 8,1 mil hectares nessa categoria fundiária, contra 2,8 mil no período anterior. A informação consta em estudo divulgado nesta quinta (18) pela rede Simex, composta pelo ICV, Imaflora e Imazon.

Ao todo, foram extraídos 327,6 mil hectares de florestas nativas para fins madeireiros no bioma, o que representa uma redução de 10,5% em comparação com o total identificado no estudo anterior. Desse número, 69% (225,1 mil ha) foram explorados de forma legal, com autorização emitida pelos órgãos competentes, enquanto 31% (102,5 mil ha) ocorreram de forma não autorizada.

Além do aumento da extração ilegal em UCs, houve também o aumento da exploração em Terras Indígenas (TIs) e assentamentos rurais. Em TIs, a extração de madeira chegou a 25,2 mil hectares, o que corresponde a um aumento de 24%. Já em assentamentos rurais, o número é de 6,7 mil hectares, 66% superior ao explorado no período anterior.

Do total explorado de forma não autorizada, os imóveis rurais privados respondem por 53%. Foram 54,4 mil hectares de floresta com exploração  nessa categoria durante o período analisado. Em comparação com o período anterior, contudo, o número representa uma redução de 39%.

As áreas de exploração madeireira foram identificadas e mapeadas por meio de imagens de satélite e contrapostas às autorizações de exploração emitidas pelos órgãos ambientais. O Simex é o principal indicador da atividade madeireira legal e ilegal na região amazônica. Os índices reúnem informações de sete estados (Acre, Amapá, Amazonas, Mato GrossoPará, Rondônia e Roraima).

Conforme destacou Leonardo Sobral, diretor de Florestas e Restauração do Imaflora, em 2024 foi observada uma tendência de estabilidade da área total explorada, mas a persistência de exploração não autorizada em áreas críticas reforça a necessidade de políticas continuadas de governança, transparência e comando e controle.

“A consolidação dos dados do Simex para a Amazônia mostra que o avanço do monitoramento da exploração madeireira tem produzido um retrato mais preciso da atividade na região, permitindo separar o que é manejo sustentável do que ainda ocorre à margem da legalidade”, explicou o diretor do Imaflora.

A pesquisadora Camila Damasceno, do Imazon, destacou que apesar da redução da extração ilegal ser positiva, a redução da extração legal acende um alerta, pois pode indicar um enfraquecimento da gestão florestal, o que gera um mercado desleal para quem segue as práticas do manejo florestal.

“Por isso, compreender esses movimentos é essencial para orientar políticas públicas que fortaleçam o manejo florestal sustentável e ampliem a proteção da floresta. Os números do Simex ajudam a identificar os pólos de maior pressão sobre a floresta e evidenciam onde é prioritário avançar na gestão, na fiscalização e no apoio à produção legal”, disse.

Ranking

Mato Grosso é o estado com mais área florestal explorada para fins madeireiros na Amazônia brasileira, com 190 mil hectares extraídos, o que corresponde a 58% do total. Em seguida, aparece o Amazonas, com 46,1 mil hectares (15%) e o Pará, com 43 mil hectares (13%).

No ranking dos dez municípios com mais exploração ilegal no período, 6 estão localizados em Mato Grosso, sendo o primeiro Aripuanã, com 12,7 mil hectares explorados ilegalmente. Em seguida, aparecem Colniza (3º), Nova Ubiratã (4º), Paranatinga (6º), Marcelândia (7º) e Juína (9º).

Também compõem a lista Lábrea/AM (2º), Paragominas/PA (5º), Porto Velho/RO (8º) e Dom Eliseu/PA (10º). Juntos, esses dez municípios concentram 51% de toda a exploração madeireira ilegal mapeada na Amazônia brasileira no período analisado.

Para Vinicius Silgueiro, coordenador do Núcleo de Inteligência Territorial do ICV, Mato Grosso lidera o ranking dos estados com mais exploração madeireira na Amazônia por uma série de fatores, entre eles o relevante papel econômico do seu setor de base florestal, a localização e o histórico de ocupação das áreas florestais, mas também a persistência da exploração não autorizada, que se beneficia especialmente da fragilidade em áreas protegidas.

“Os caminhos para coibir a exploração madeireira ilegal e buscar sua erradicação na Amazônia devem envolver uma combinação de fortalecimento da fiscalização, aprimoramento da rastreabilidade e da transparência, e incentivo à legalidade e ao manejo florestal sustentável”, explicou.

“A fiscalização precisa ser mais focada, ágil e punitiva para desmantelar as cadeias de ilegalidade. Com isso, concentrar o esforço de fiscalização, inclusive com operações conjuntas, nos municípios com maior incidência de ilegalidade, que historicamente concentram a maior parte do problema.”

A ilegalidade avança sobre áreas protegidas

O mapeamento de 2024 traz um sinal de alerta: a exploração madeireira sem autorização cresceu justamente onde a floresta deveria estar mais blindada – Terras Indígenas (TIs) e Unidades de Conservação (UCs). Ao todo, foram 33.454 hectares explorados ilegalmente nessas duas categorias, uma alta de 44% em relação a 2023 (23.120 ha). Na prática, isso significa que cerca de um terço de toda a área explorada sem autorização no período analisado ocorreu dentro de áreas protegidas.

A maior fatia da ilegalidade recaiu sobre as Terras Indígenas, com 25.278 hectares – 25% de toda a exploração ilegal mapeada. As Unidades de Conservação responderam por 8.177 hectares, o equivalente a 8% do total identificado.

Para Júlia Niero, analista técnica do Imaflora, o dado expõe um problema estrutural: “Quando a exploração ilegal cresce dentro de Terras Indígenas e Unidades de Conservação, isso indica fragilidade nos mecanismos de comando e controle e uma resposta insuficiente diante de um problema que se repete há anos”. Ela ressaltou que os impactos vão além da retirada de árvores: “A exploração madeireira ilegal abre caminho para degradação do habitat, perda de biodiversidade e aumento do risco de incêndios – pressionando áreas estratégicas para o clima e para a proteção dos modos de vida de povos indígenas e comunidades tradicionais”.

O padrão geográfico repete o mapa de pressão já observado em 2023, com maior impacto no sul do Amazonas, norte de Rondônia e noroeste do Mato Grosso – regiões historicamente marcadas por degradação e desmatamento.

Entre as Terras Indígenas, a TI Aripuanã (MT) aparece como o principal foco em 2024, com 8.601 hectares afetados. Na sequência, estão o Parque Indígena do Xingu (MT) (4.770 ha), a TI Kaxarari (AM/RO) (2.885 ha) e a TI Amanayé (PA) (2.026 ha). Somadas, essas quatro áreas concentram 54% de toda a exploração ilegal registrada em áreas protegidas.

Já nas Unidades de Conservação, a Reserva Extrativista Guariba/Roosevelt (MT) lidera como a mais impactada — e chama atenção por não ter figurado entre as mais afetadas no levantamento anterior. Para Júlia, o dado é um recado direto: “O avanço em uma UC que não estava no topo da pressão mostra que a ilegalidade é dinâmica e pode ‘migrar’ rapidamente. Nenhuma área protegida está fora de risco quando há falhas de fiscalização e impunidade no entorno”.


Fonte: Imaflora

Stonex, grande trader dos EUA, comprou ouro extraído ilegalmente nas florestas da Amazônia brasileira

Documentos revelam como o metal escavado por garimpeiros ilegais chega às grandes empresas por meio de uma rede obscura de fornecedores

Por Grace Murray , Andrew Wasley , Poliana Dallabrida , Daniela Penha  e  André Campos para o TBIJ em parceria com a Repórter Brasil

A grande empresa de serviços financeiros dos EUA, StoneX, comprou milhões de dólares em ouro de uma empresa ligada à mineração ilegal, desmatamento e poluição por mercúrio na floresta amazônica, segundo o Bureau of Investigative Journalism (TBIJ) e a Repórter Brasil.

Documentos mostram que um dos fornecedores brasileiros da StoneX obteve ouro de uma vasta rede de mineradores informais de toda a Amazônia, incluindo alguns sancionados pela agência ambiental do Brasil.

A floresta amazônica – um amortecedor crítico contra o colapso climático – é um viveiro de produção ilícita de ouro e os altos preços levaram a uma onda de mineração informal “selvagem”, que está ligada a danos ambientais. Os investidores tendem a ver o ouro como uma aposta segura em tempos de incerteza econômica e os preços atingiram uma alta histórica recentemente em meio à ameaça de uma nova guerra comercial iniciada por Donald Trump.

Embora mineradores informais não possam exportar diretamente, grandes comerciantes internacionais ainda podem obter ouro ilícito por meio de exportadores licenciados. Documentos vistos pelo TBIJ mostram que em setembro de 2023, uma dessas empresas, a Coluna, vendeu à StoneX uma remessa de ouro de US$ 4,6 milhões (£ 3,7 milhões) que incluía mineradores sancionados entre seus fornecedores.

As duas empresas ainda estavam fazendo negócios em outubro de 2024, quando a StoneX comprou outros dois lotes de ouro por £ 1,2 milhão, embora não se saiba se parte desse ouro era ilícito.

Carga encalhada

As revelações decorrem de um incidente em setembro de 2023, quando agentes da alfândega de São Paulo pararam uma carga de ouro de US$ 4,6 milhões destinada a uma subsidiária da StoneX em Dubai. Ela foi retida após agentes do aeroporto encontrarem uma discrepância com o peso que havia sido declarado pela Coluna.

A Coluna entrou com uma ação judicial para liberar a carga e, ao fazê-lo, revelou uma extensa rede de fornecedores de mineradores ilegais.

A atividade ilegal aumentou no Brasil depois que Jair Bolsonaro se tornou presidente em 2019 e tem sido associada à poluição tóxica, à devastação de terras indígenas e a ameaças às comunidades locais.

O problema foi reduzido significativamente depois que o novo governo brasileiro implementou medidas para combater a mineração ilegal em 2023 – incluindo a digitalização de faturas, o que torna as cadeias de suprimentos mais fáceis de mapear.

Mas a origem do ouro da Amazônia ainda pode ser difícil de rastrear. Como os mineradores selvagens não são autorizados a exportar ouro eles mesmos, eles vendem para uma rede de intermediários que abastecem o pequeno número de exportadores de metais preciosos autorizados pelo banco central do Brasil.

“É muito fácil para ouro extraído ilegalmente entrar no sistema”, disse Ane Alencar, diretora de ciência da organização não governamental Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM). “É importante tornar o ouro rastreável”, ela acrescentou.

 

 

A StoneX disse à TBIJ que é um membro responsável da indústria global de metais preciosos e conduz uma extensa due diligence. A empresa acrescentou que segue políticas e processos robustos para verificar a legitimidade da origem de todos os metais preciosos que adquire, obtendo todos esses metais em estrita conformidade com os requisitos legais e regulatórios aplicáveis.

A StoneX disse que o metal impedido de sair do Brasil já estava no sistema bancário brasileiro quando a empresa o comprou, e que a StoneX coletou os certificados de origem e documentação de antecedentes necessários. Ela acrescentou que a Coluna, que continua exportando até hoje, foi licenciada pelo Banco Central no Brasil. A Coluna não respondeu aos pedidos de comentário.

 

Ouro à venda em Dubai, para onde se destinava o carregamento de ColunaAliança de Imagens DPA / Alamy

 

Rastro de papel

Os documentos que a Coluna entregou às autoridades incluem quase 1.200 faturas de mineradores ilegais para dois dos intermediários que fornecem à Coluna.

No total, mais de 12,2 kg de ouro, faturados por mais de 2,9 milhões de reais (R$) (£ 474.000), estavam vinculados a crimes ambientais, descobriram o TBIJ e a Repórter Brasil. Isso representa 16% da remessa. E mais de 200 dessas faturas, representando a grande maioria, vieram de uma cooperativa selvagem que foi multada em R$ 2,2 milhões (cerca de £ 350.000) em 2022 por crimes como desmatamento, operação em terras não autorizadas e uso de mercúrio.

O mercúrio é usado por mineradores para separar o ouro do minério, mas o produto químico é altamente tóxico e, se usado de forma irresponsável, pode envenenar o abastecimento de água local e matar a vida selvagem. “Os peixes contaminados não ficam apenas na área onde a mineração ocorreu”, disse Ana Claudia Vasconcellos, pesquisadora da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio, no Rio de Janeiro. Ela disse ao TBIJ que o mercúrio pode afetar áreas a até 100 km de distância.

Seu uso na mineração de ouro no Brasil só é permitido com licença e em conformidade com certas regulamentações nacionais. Uma das multas da cooperativa foi relacionada à aquisição de 100 kg de mercúrio. Outra detalhou o uso de mercúrio na produção de pelo menos 147,8 kg de ouro que violou requisitos ambientais.

A Coopemiga, a cooperativa, disse à Repórter Brasil que reformulou sua gestão no final de 2023 e está progressivamente adotando técnicas mais seguras e ambientalmente responsáveis ​​para extração de ouro. A StoneX disse que entendeu que os membros apropriados da cooperativa foram responsabilizados após a investigação de 2022.

A StoneX é membro da London Bullion Market Association (LBMA), que promove o fornecimento responsável de metais preciosos e define padrões do setor para empresas.

Alan Martin, seu chefe de fornecimento responsável, disse: “A LBMA leva todas as acusações relacionadas ao fornecimento impróprio de ouro com a maior seriedade [e] mantém regras rígidas para seus membros e refinadores credenciados.”

Martin disse que a LBMA investiga qualquer potencial violação da qual tenha conhecimento e observou que a investigação das autoridades brasileiras sobre a carga bloqueada da Coluna estava em andamento e ainda não havia encontrado nenhuma conclusão definitiva de irregularidade. A LBMA também não viu nenhuma evidência de violação de suas regras para membros em sua própria investigação preliminar. A LBMA está bem ciente dos desafios de fornecimento causados ​​por mineradores ilegais na região da Amazônia brasileira e trabalhou para destacar o problema, ele acrescentou.

 

Uma operação de mineração “selvagem” na Amazônia brasileira. Alain Nogues / Sygma via Getty

 

Um mercado obscuro

Embora a operação da StoneX em Dubai fosse a destinatária listada para a remessa apreendida de US$ 4,6 milhões, o ouro seria de fato carregado em um voo comercial da Swiss International Air Lines para Zurique, levantando mais questões sobre a rastreabilidade do ouro da Amazon vendido internacionalmente. Não está claro se a Suíça era ou não o destino final.

De acordo com a análise de registros comerciais do TBIJ, a operação da StoneX em Dubai movimenta regularmente ouro diretamente da Suíça para a Turquia sem passar pelos Emirados Árabes Unidos. No entanto, a entidade da StoneX na City of London transporta ouro pela mesma rota, e também dos Emirados Árabes Unidos para a Índia.

Mark Pieth, advogado e autor do livro Gold Laundering, disse ao TBIJ que o destino real de uma carga frequentemente será diferente do listado. “O que você tem que se acostumar neste mundo de comércio de trânsito é que você tem as mercadorias indo para um lado e a papelada para outro”, disse ele. No caso da carga bloqueada da Coluna, não está claro por que a documentação listou um destino diferente do voo em que deveria ser carregada.

Entre agosto de 2023 e outubro de 2024, a divisão de Dubai da StoneX transportou mais de US$ 400 milhões (cerca de £ 312 milhões) em ouro da Suíça para empresas de refino na Turquia. Essas empresas transformam o metal em barras — ouro de alta pureza, geralmente armazenado como um ativo de reserva por bancos — ou o vendem para fabricantes de joias.

Registros comerciais mostram que um dos compradores turcos, Ahlatci, enviou uma série de remessas de ouro da Suíça para os Emirados Árabes Unidos em nome da StoneX em 2023.

Ahlatci não respondeu ao pedido de comentário do TBIJ. Uguras, outro comprador turco de ouro StoneX Dubai da Suíça, disse ao TBIJ que apenas ouro de refinarias credenciadas pela LBMA tem permissão para ser importado para a Turquia, e que esta e outras medidas garantem que ele obtenha fontes responsáveis.

Os registros também mostram que outro comprador turco de ouro da StoneX de 2023 foi a Istanbul Gold Refinery. Suas barras estão disponíveis para compra no site de barras de ouro da StoneX.

A Istanbul Gold Refinery disse à TBIJ que não comprou nenhum ouro doré (barras de ouro não purificadas) da StoneX do Brasil. Quando questionada, ela não respondeu a pedidos de esclarecimento sobre se comprou ouro em outras formas, ou como garantiu que o ouro da StoneX comprado da Suíça não poderia ter vindo originalmente do Brasil.

A Swiss International Air Lines disse ao TBIJ: “Nós garantimos o transporte com os mais altos padrões de segurança e sempre cumprimos as sanções aplicáveis ​​e outras regulamentações comerciais.”

 
Imagem principal: Alain Nogues / Sygma via Getty

Repórteres: Grace Murray, Andrew Wasley, Poliana Dallabrida, Daniela Penha e André Campos
Editor de meio ambiente: Robert Soutar
Editor adjunto: Chrissie Giles
Editor: Franz Wild
Editor de produção: Alex Hess
Verificador de fatos: Alice Milliken


O TBIJ tem vários financiadores, uma lista completa dos quais pode ser encontrada aqui . Nenhum dos nossos financiadores tem qualquer influência sobre decisões editoriais ou produção.


Fonte: TBIJ

Expondo as ONGs cúmplices do projeto da BR-319 que está acelerando a destruição da Amazônia brasileira

A investigação a seguir é de Monica Piccinini, Lucas Ferrante e Philip Fearnside, e foi publicada originalmente em 9 de setembro, em português, no Amazonia Real

Ciência_na_BR-319

Por Monica Piccinini, Lucas Ferrante & Philip Fearnside para o “The Canary”

O Ministério dos Transportes do Brasil planeja “reconstruir” um trecho de 406 km da rodovia BR-319 da Amazônia, conectando Manaus, capital do estado do Amazonas, a Porto Velho, na borda sul da floresta. A estrada, abandonada em 1988, tem visto melhorias graduais desde 2015 por meio de um programa de “manutenção”:

BR-319-map

O projeto BR-319 na Amazônia brasileira

Atualmente, a rodovia BR-319 é ​​transitável durante o período de seca, embora a licença ambiental necessária para o projeto de reconstrução para criar uma nova rodovia no mesmo trajeto ainda não tenha sido concedida.

A reconstrução da rodovia BR-319 conectaria a Amazônia central relativamente intacta ao notório foco de desmatamento conhecido como “AMACRO”, um nome composto pelas siglas dos estados do Amazonas, Acre e Rondônia.

A rota da BR-319 passa por um dos blocos mais preservados da floresta amazônica , e as estradas propostas que ligam a BR-319 se abririam para a vasta área de floresta a oeste do Rio Purus, que é paralela à BR-319.

A BR-319 também permitiria que desmatadores do “arco do desmatamento” do Brasil, no sul da Amazônia, migrassem para Roraima , que faz fronteira com a Venezuela no norte da Amazônia, bem como para outras áreas já conectadas a Manaus por rodovia.

No geral, metade do que resta da floresta amazônica brasileira seria impactada, não apenas a beira da BR-319 em si, que é o foco do processo de licenciamento e dos esforços de organizações não governamentais (ONGs) para mitigar os impactos. Vários estudos fornecem informações extensas sobre os impactos do projeto e os motivos pelos quais ele deve ser interrompido.

Poder e influência das ONGs

Um fator-chave que impulsiona o desastre ambiental e social que o projeto BR-319 representa vem de um setor inesperado: várias ONGs ambientais e as fundações que as apoiam. Embora seja difícil imaginar uma organização ambiental que não se oponha ao projeto BR-319, algumas o fazem.

O Observatório do Clima, composto por 120 ONGs brasileiras , se posicionou fortemente contra o projeto da BR-319 e moveu uma Ação Civil Pública (ACP) contra o órgão ambiental federal por ter concedido uma “licença prévia” para o projeto.

O processo foi julgado favoravelmente em 25 de julho de 2024 , suspendendo a licença prévia que havia sido concedida durante a administração presidencial de 2019-2022 de Jair Bolsonaro, que havia ignorado os pareceres técnicos negativos da equipe de licenciamento para acomodar pressões políticas. A licença prévia não autoriza a construção de estradas, mas permite preparações significativas para obter uma “licença de instalação” que permitiria o início da construção de estradas.

ONGs que se recusaram a condenar o projeto da BR-319 assumiram a posição de que a aprovação e execução ambiental da estrada são inevitáveis, levando-as a adotar uma posição neutra sobre se ela deve ser construída e, em vez disso, focar em estratégias de governança para quando a estrada estiver concluída. A construção da estrada não é um fato consumado e, presumindo que o projeto seja inevitável, contribui para torná-lo uma profecia autorrealizável.

Essas ONGs acreditam que o projeto deve prosseguir desde que todos os requisitos para licenciamento ambiental sejam atendidos, incluindo consulta aos povos indígenas impactados. Isso ficou evidente em 5 de fevereiro de 2020, quando o Ministério Público Federal em Manaus realizou um evento para discutir os impactos do projeto da BR-319. O terceiro autor deste texto fez uma apresentação explicando por que o projeto da estrada não deveria ser aprovado, e tanto o segundo quanto o terceiro autores se envolveram na discussão.

Três organizações atuantes na área do projeto, o Instituto de Conservação e Desenvolvimento Sustentável da Amazônia (IDESAM), a Fundação Getúlio Vargas ( FGV) e o Fundo Mundial para a Natureza (WWF), expressaram a opinião de que o projeto de reconstrução da BR-319 não deveria sofrer oposição e poderia prosseguir, desde que os povos indígenas fossem consultados e fortes condições ambientais fossem incluídas nos requisitos para o licenciamento.

Lições do passado não devem ser esquecidas. A situação é paralela à história da luta contra a construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte no Rio Xingu, no estado do Pará. Embora a maioria das ONGs ambientais se opusesse veementemente ao projeto da barragem, algumas chegaram à área da barragem oferecendo-se para ajudar a população deslocada a obter melhores compensações e programas sociais, dizendo-lhes que o projeto da barragem era inevitável e que não deveriam se opor a ele.

Dom Erwin Kräutler, Bispo do Xingu e um proeminente oponente da barragem, apontou o evidente conflito de interesses : as ONGs que promovem melhor compensação para pessoas deslocadas não teriam razão para estar presentes se a barragem não fosse construída e a população deslocada. No caso de Belo Monte , a empresa da barragem e os políticos que a promoveram foram bem-sucedidos em provocar discórdia entre as ONGs e entre os líderes indígenas, contribuindo para a aprovação e execução deste projeto notoriamente desastroso.

Direitos indígenas na Amazônia

Nenhum dos povos indígenas impactados pelo projeto BR-319 foi consultado, conforme exigido pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) (OIT, 1989) e pela legislação brasileira que a implementa.

Entre os requisitos está que essa consulta deve ocorrer não apenas antes do projeto de construção em si, mas também antes da decisão sobre prosseguir com o projeto. Além disso, os povos indígenas devem ter o direito de rejeitar o projeto .

Algumas interpretações da convenção suavizam essa exigência para dar aos povos indígenas uma “voz” no processo de tomada de decisão sobre projetos que os afetam, mas não o poder de vetar esses projetos.

O plano do ministério dos transportes tem sido “consultar” apenas cinco grupos indígenas, embora o projeto afetasse pelo menos 68 grupos . O plano tem sido “consultar” esses grupos enquanto a construção da rodovia está em andamento, com a tarefa sendo feita antes da inauguração oficial da estrada.

“Governança”

O projeto BR-319 tem um longo histórico de promoção de cenários de “governança” altamente irrealistas, incluindo a primeira avaliação de impacto ambiental, que alegou que a rodovia se assemelharia às estradas do Parque Nacional de Yellowstone , por onde milhões de turistas viajam, sem levar ao desmatamento.

Cenários semelhantes persistem, como demonstra o relatório de um grupo de trabalho composto por cinco departamentos do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT). Infelizmente, a história não acompanha esses cenários, mesmo quando apoiada por grandes esforços do governo e de organizações da sociedade civil, como demonstra a rodovia BR-163 (Santarém-Cuiabá) que o relatório do grupo de trabalho do DNIT usa como exemplo .

As ONGs que adotaram a posição de que incluir fortes condições ambientais nos requisitos para licenciamento evitaria um desastre ambiental e social estão fornecendo endosso de fato aos cenários oficiais de governança como justificativa para permitir que o projeto avance.

Membros da polícia federal e do exército brasileiros com quem conversamos deixaram claro que um cenário de governança futura é fictício, pois os órgãos de fiscalização não teriam recursos para monitorar a área devido ao seu tamanho, complexidade e perigo. O crime organizado já controla a grilagem de terras e a mineração na região , o que impactou severamente as comunidades tradicionais.

Enquanto a neutralidade era professada na questão do licenciamento e reconstrução da rodovia, na prática essas organizações, especialmente o IDESAM e a FGV, estavam trabalhando para facilitar a aprovação da estrada. Um exemplo é o projeto da FGV intitulado “Promovendo a transparência e a governança territorial no contexto da instalação de rodovias na Amazônia – o caso da BR-319”. Como o título indica, o projeto pressupõe que a rodovia será construída. Líderes indígenas que consultamos expressaram forte oposição ao projeto, preocupados que qualquer acordo pudesse ser mal interpretado pelos tomadores de decisão como apoio à construção, apesar da resistência das comunidades à rodovia.

Outro documento da FGV, intitulado “Agenda de Desenvolvimento Territorial para a Região da BR-319: Fortalecendo Territórios do Bem Viver”, busca promover o desenvolvimento territorial em Vila Realidade, no município de Humaitá. Segundo relatório do Tribunal de Contas da União (TCU), a única atividade econômica da região é o desmatamento ilegal. Estradas ilegais originárias da área de Vila Realidade já estão invadindo territórios indígenas, e é improvável que grileiros e madeireiros parem suas atividades, movidos pela atração de lucros rápidos e fáceis.

Líderes indígenas declararam que representantes da FGV sugeriram que seria do melhor interesse deles aceitar as condições propostas, já que a rodovia BR-319 seria construída de qualquer forma. Eles foram informados de que a abordagem mais prudente seria focar em mitigar os impactos em seus territórios negociando indenização com o DNIT.

Embora algumas dessas ONGs tenham expressado o desejo de negociar com todas as partes, tentar estabelecer governança entre invasores e invadidos é impraticável, pois isso apenas intensificaria os conflitos e aumentaria as ameaças às comunidades tradicionais.

De acordo com líderes indígenas, a violação mais grave dos direitos dos povos indígenas foi cometida pelo Instituto Internacional de Educação do Brasil (IEB). Um documento, que os líderes indígenas relatam ter sido preparado pelo IEB e apresentado a eles para assinar, denuncia uma invasão de terra que é uma preocupação urgente para o grupo, mas também inclui uma declaração afirmando a aprovação do projeto de reconstrução da BR-319 desde que uma reserva extrativista seja criada para proteger os castanhais usados ​​pelo grupo. Os líderes só tomaram conhecimento da declaração aprovando o projeto da estrada depois que assinaram o documento e seguiram as instruções do IEB para enviá-lo ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis ​​(IBAMA), à Fundação Nacional do Índio (FUNAI) e ao DNIT.

Omitimos os nomes das lideranças indígenas que fizeram as denúncias, juntamente com suas etnias e comunidades, para garantir sua proteção. Todas as denúncias foram feitas durante o evento científico e reunião de lideranças realizado dentro da Universidade Federal do Amazonas (UFAM), com a presença oficial de um representante do Ministério Público Federal (MPF) e do Ministério do Meio Ambiente e Mudanças Climáticas (MMA).

O apoio das ONGs ao projeto da BR-319 permaneceu sutil até julho de 2024, quando o IDESAM se retirou do Observatório do Clima e emitiu uma declaração para a mídia e políticos pró-BR-319 selecionados . O gatilho para essa ruptura foi a aprovação judicial da ação do Observatório do Clima contestando a licença preliminar da BR-319, com a declaração do IDESAM endossando abertamente a reconstrução da rodovia.

O gabinete do procurador-geral federal entrou com um recurso para anular a suspensão de 25 de julho da licença preliminar emitida em 25 de julho. Diferentemente dos Estados Unidos, o procurador-geral do Brasil não tem independência e normalmente promove a agenda política do presidente.

O projeto da BR-319 não tem uma racionalidade econômica , a motivação para o projeto é seu valor na política eleitoral. O benefício do projeto em ganhar votos no estado do Amazonas explica não apenas o apoio de políticos locais, mas também o do presidente Luiz Inácio Lula da Silva .

Em 23 de agosto, o Tribunal Regional Federal da Primeira Instância (TRF1) rejeitou o recurso . No entanto, a Procuradoria-Geral da República pode continuar a recorrer , e futuras tentativas podem ter sucesso devido às leis de “suspensão de segurança” do Brasil. Essas leis, que remontam à ditadura militar de 1964 , permitem que qualquer decisão seja anulada se for considerada como causadora de dano “grave” à economia, à saúde ou à ordem pública.

Esse mecanismo legal já foi usado para levar o projeto da BR-319 adiante, revertendo uma decisão judicial que havia pausado a primeira audiência pública, apesar das irregularidades existentes. O sistema legal do Brasil permite uma série aparentemente interminável de recursos, permitindo que o Ministério Público continue apelando até encontrar um juiz simpático.

Motivações por trás do apoio à BR-319

Temos tentado entender por que algumas ONGs apoiam o projeto de reconstrução da BR-319, seja seu apoio aberto ou implícito. Isso tem se mostrado desafiador devido à falta de transparência tanto das organizações quanto de seus financiadores.

Há uma coincidência extraordinária: as ONGs que se recusaram a condenar o projeto BR-319 são todas financiadas pela Fundação Gordon e Betty Moore (GBMF).

É possível que a GBMF tenha instruído as ONGs que apoia a evitar se opor ao projeto BR-319? Isso pode ser feito explicitamente por uma cláusula nos contratos de concessão (que nem a GBMF nem as ONGs estão dispostas a divulgar) ou por algum tipo de advertência verbal. Esta é uma questão em aberto.

O GBMF foi criado pelo cofundador da Intel Gordon Moore e sua esposa Betty Moore em 2000, com o objetivo de apoiar a pesquisa científica e a conservação ambiental. As doações do GBMF para instituições brasileiras começaram em 2004 dentro do contexto da Iniciativa Andes-Amazônia.

A Fundação concentra suas doações ao Brasil em uma área: terra, ecossistemas terrestres e uso da terra. Suas estratégias para áreas protegidas e territórios indígenas incluem conservação, consolidação, gestão e monitoramento. A área ao longo da rodovia BR-319 é ​​uma parte particularmente importante do financiamento do GBMF.

O GBMF vem fornecendo financiamento para o objetivo desejável de promover a governança, mas os projetos de governança de ONGs têm um efeito claro na facilitação da aprovação do projeto de reconstrução da rodovia BR-319.

Em resposta a uma pergunta sobre a BR-319, o porta-voz do GBMF compartilhou a seguinte declaração conosco:

A construção e pavimentação de estradas em regiões ecologicamente frágeis pode causar grande destruição. Não somos contra estradas; somos a favor de estabelecer salvaguardas ambientais e sociais que protegerão a natureza e as pessoas.

Além do efeito dos projetos de “governança” das ONGs em facilitar a aprovação da licença para autorizar a construção, esses projetos e a continuação implícita do financiamento para “governança” após a construção da estrada fazem parte do dilema que as ONGs e seus financiadores enfrentam com projetos de desenvolvimento prejudiciais em todo o mundo, ou seja, o fato de que as atividades das ONGs reduzem o custo geral dos projetos de construção, tornando-os mais propensos a serem executados.

O projeto BR-319 se torna muito mais atraente se o governo apenas arcar com o custo do asfalto e outras partes físicas do projeto, enquanto financiadores internacionais, incluindo organizações filantrópicas, pagam a conta por medidas de governança, como controle do desmatamento e salvaguarda de territórios indígenas. No caso da BR-319, o ministro dos transportes do Brasil declarou que quer usar dinheiro do Fundo Amazônia para tornar o projeto BR-319 “viável” .

Uma questão sem resposta é se a GBMF poderia estar financiando os projetos que facilitam a aprovação da BR-319 para beneficiar os próprios investimentos da fundação. Um alinhamento entre investimentos e os beneficiários do projeto da rodovia não significa necessariamente que tal cadeia de influência exista.

Muitas fundações atribuem a gestão de seus ativos a uma empresa terceirizada ou a um departamento dentro da fundação que é separado das atividades de concessão de subsídios. Esses arranjos geralmente implicam que os ativos são administrados para maximizar os lucros sem levar em conta os impactos ambientais e sociais que eles causam. Não se pode presumir que o processo de concessão de subsídios da GBMF seja influenciado pelas implicações da BR-319 para os investimentos da fundação. Sugerimos, no entanto, que esta e outras fundações na área ambiental devem se desfazer de investimentos em atividades prejudiciais ao meio ambiente.

Interesses de petróleo e gás na BR-319

Petróleo e gás têm sido uma parte significativa do portfólio de investimentos da GBMF, apesar de seu impacto ambiental global e outras preocupações. O setor de petróleo e gás seria um grande beneficiário da rodovia BR-319 e estradas secundárias associadas.

O portfólio de investimentos da GBMF não inclui a Rosneft, a gigante russa de petróleo e gás que adquiriu as primeiras 16 concessões de perfuração na área a ser acessada pela rodovia planejada AM-366, ramificando-se da BR-319. No entanto, a GBMF investiu anteriormente no SberBank, o maior banco de investimentos da Rússia, que financia a Rosneft .

O amplo projeto da Área Sedimentar do Solimões para extração de petróleo e gás, localizado a oeste da BR-319, oferece oportunidades significativas de investimento para empresas além da Rosneft. O projeto cobre uma área total de 740.000 km² – maior que o estado americano do Texas.

A GBMF investiu em várias empresas de combustíveis fósseis , incluindo a gigante petrolífera brasileira Petrobras, a russa LukOil – PJSC, a americana Anadarko Petroleum, a China Petroleum and Chemicals, a empresa americana Perusahaan Gas Comstock (que opera na Indonésia), a indiana Petronet LNG e a TownGas China.

A Agência Nacional do Petróleo (ANP) do Brasil designou nove grandes blocos de direitos de perfuração ao longo da rota BR-319 . Embora não estejam no “trecho do meio” da rodovia, eles se beneficiariam do projeto da rodovia. Um desses blocos (AM-T-107) foi arrematado pela Eneva em parceria com a ATEM no “leilão do fim do mundo” de dezembro de 2023.

A Eneva é uma empresa brasileira de gás e petróleo altamente recomendada pela Dynamo, que é a empresa de gestão de ativos da GBMF no Brasil. A própria Dynamo detém uma participação de 10,06% na Eneva , e a Eneva pode se fundir com a Vibra , uma empresa de gás e petróleo na qual a Dynamo detém 10,28%.

Devido ao impacto sobre os povos indígenas, uma decisão judicial suspendeu a assinatura dos contratos de perfuração do bloco AM-T-107 (mais quatro blocos comprados por essas empresas no Amazonas, fora da área da BR-319). Independentemente de essa suspensão persistir ou não, o aumento da lucratividade que a BR-319 traria ao setor de petróleo e gás em áreas acessadas por essa rodovia e suas estradas secundárias estimularia a extração de combustíveis fósseis em larga escala e aumentaria as chances de superar as objeções dos povos indígenas impactados.

Além de petróleo e gás, a GBMF investiu na JBS , conhecida como a “maior empresa de proteína animal do mundo”. Os matadouros da JBS, juntamente com as fazendas de gado que os abastecem, são contribuintes significativos para o desmatamento na Amazônia.

Grandes fazendeiros da região de desmatamento da AMACRO, juntamente com produtores de soja e outros interesses do agronegócio, estão planejando se expandir para a área a oeste da BR-319 , que seria aberta pela planejada rodovia AM-366, que também dá acesso às reservas de petróleo e gás.

Subvenções

O IEB recebeu um total de 10 subsídios do GBMF , entre 2004 e 2022, totalizando mais de US$ 14 milhões, incluindo US$ 2 milhões para obras na BR-319. Os objetivos do financiamento incluem “aumentar o engajamento” dos povos indígenas na seção central da BR-319 e aumentar a “compreensão pública” de “oportunidades e ganhos para o desenvolvimento sustentável do corredor rodoviário”.

A FGV recebeu recursos do GBMF superiores a US$ 6 milhões . O financiamento é “para desenvolver parâmetros para a adoção de uma abordagem baseada em direitos humanos e voltada para a prevenção de abusos e violações socioambientais ao longo do processo decisório de grandes obras no Brasil, especialmente no caso da BR-319, em sua totalidade” e para conduzir estudos para promover a criação e implementação de um plano de governança territorial ao longo do corredor rodoviário BR-319 na Amazônia.

O IDESAM, ONG sediada em Manaus responsável pela coordenação do Observatório da BR-319, recebeu cinco bolsas do GBMF , entre 2011 e 2023, totalizando US$ 2,4 milhões, sendo mais da metade (US$ 1,24 milhão) recebida em novembro de 2023.

Um relatório do IDESAM, intitulado “Análise da Implementação de Unidades de Conservação sob a Influência da Rodovia BR-319”, em colaboração com o FUNBIO (Fundo Brasileiro para a Biodiversidade), que também é financiado pelo GBMF , delineou os benefícios e oportunidades que a reconstrução da BR-319 poderia oferecer à região amazônica.

Um porta-voz da Fundação Gordon e Betty Moore compartilhou a seguinte declaração:

A fundação Moore está apoiando parceiros para evitar o ponto de inflexão ecológica na Amazônia. Para isso, é necessário ter áreas protegidas e territórios indígenas sob gestão efetiva para conservação e uso sustentável. Existem muitos impulsionadores da mudança de habitat, um dos impulsionadores mais importantes é o desenvolvimento de infraestrutura porque perturba a conectividade ecológica e pode estabelecer condições sociais que ameaçam os meios de subsistência dos povos locais. A construção e pavimentação de estradas em regiões ecologicamente frágeis podem causar grande destruição. Não somos contra estradas; somos a favor do estabelecimento de salvaguardas ambientais e sociais que protegerão a natureza e as pessoas.

A necessidade de mudança

A proposta de reconstrução da rodovia BR-319 coloca em risco grande parte do que resta da floresta amazônica brasileira e é certamente um dos projetos mais prejudiciais ao meio ambiente do mundo .

ONGs ambientais e organizações filantrópicas devem se opor a projetos que colocam em risco áreas ricas em biodiversidade. Além disso, essas instituições precisam adotar maior transparência e responsabilidade, garantindo que suas iniciativas beneficiem genuinamente os destinatários pretendidos: o meio ambiente e as comunidades indígenas.

Imagem em destaque via Canary


Fonte: The Canary

Terras indígenas na Amazônia brasileira ajudam a prevenir doenças causadas por queimadas, diz estudo

Novo estudo de dez anos, revisado por pares, sugere que as florestas administradas por Indígenas na Amazônia Brasileira absorvem milhares de poluentes de gases venenosos provenientes de incêndios florestais, evitando 15 milhões de dispendiosos casos de doenças todos os anos

Tropical Rainforest Landscape, Amazon

Londres (6 de abril de 2023) – Uma nova pesquisa divulgada na Communications, Earth & Environment, uma publicação do Grupo Nature, sugere que a floresta tropical da Amazônia e seus territórios Indígenas podem absorver nada menos que 26.000 toneladas de poluentes nocivos liberados pelas queimadas todos os anos, evitando assim, milhares de casos de doenças cardiovasculares e respiratórias letais e reduzindo de forma significativa os custos com a saúde em algumas das cidades mais desmatadas da região.

Com base em uma análise de dados de dez anos, os autores do novo estudo constataram que cada hectare de floresta queimada custa às cidades pelo menos 2 milhões de dólares no tratamento de doenças relacionadas, enquanto demonstram que as florestas Indígenas – ao absorverem os poluentes dos incêndios – evitam cerca de 15 milhões de casos de doenças respiratórias e cardiovasculares por ano, o que, de outra forma, custaria 2 bilhões de dólares ao sistema de saúde.

A pesquisa também conclui que terras indígenas densamente florestadas estão protegendo populações urbanas e rurais, situadas muitas vezes do outro lado da Amazônia, no “arco de desmatamento”, na região sudeste da floresta, que perdeu a maior parte da sua cobertura florestal para a agroindústria e outras atividades, legais e ilegais.

Em todo o mundo, as florestas são conhecidas por absorverem poluentes de incêndios pelos poros localizados na superfície das folhas, mas esta é a primeira vez que calculamos a capacidade das florestas tropicais para fazer isso “, comentou a Dra. Paula Prist, cientista pesquisadora sênior da EcoHealth Alliance e principal autora do estudo. “Nossos resultados indicam que a floresta Amazônica pode absorver 26.000 toneladas de partículas todos os anos e os territórios Indígenas são responsáveis por 27% dessa absorção, embora ocupem apenas 22% da floresta.”

Divulgadas apenas alguns dias antes de o Presidente Lula completar seus primeiros 100 dias de mandato, as constatações podem representar mais um fator de urgência para a promessa do governante brasileiro de reconhecer e fazer cumprir os direitos dos povos Indígenas à terra, o que já se comprovou desempenhar um papel descomunal na redução do desmatamento e da perda da biodiversidade na Amazônia.

“A ciência evidenciou que as florestas administradas por indígenas sofrem menos com o desmatamento responsável pela mudança climática e risco de pandemia, mas esta é a primeira iniciativa de quantificar como elas beneficiam a saúde humana e da economia, indicando que os benefícios superam em muito os desafios desses territórios”, disse a Dra. Florencia Sangermano, coautora do novo estudo e especialista no uso de análise geoespacial e sensoriamento remoto por satélite, para avaliar as mudanças no sistema terrestre e dimensionar seus efeitos nos ecossistemas e na biodiversidade.

A equipe de pesquisadores, da Clark University, EcoHealth Alliance, George Mason University, a Universidade Nacional Autônoma do México e a Universidade de São Paulo, concentrou sua análise na Amazônia Legal Brasileira, uma área que se estende por mais da metade do território do país, incluindo 722 cidades de médio e pequeno porte. Durante o período das queimadas, do final de julho até novembro, a região torna-se “um dos lugares mais poluídos do planeta”, ressaltaram a Dra. Prist e seus  coautores.

Os incêndios florestais nos países de floresta tropical são responsáveis por 90% das emissões globais de partículas liberadas pelas queimadas, incluindo aqueles situados na Bacia do rio Amazonas. E as florestas de folhas largas da Amazônia têm mais probabilidade do que as florestas de outros biomas de liberar aerossóis carbonáceos negros e orgânicos, os principais componentes das partículas finas causadoras de aumento da taxa de incidência das doenças respiratórias e cardiovasculares da região.

Entre 19 de maio e 31 de outubro de 2021, os incêndios na Amazônia consumiram 519.000 hectares de floresta, tendo o Brasil perdido a maior parte da sua cobertura florestal para essas queimadas, segundo o relatório. “O número de incêndios vem crescendo nos últimos anos”, acrescentou Prist. “Em 2020, as taxas de desmatamento alcançaram os níveis mais elevados da década na Amazônia Brasileira.”

Outros pesquisadores demonstraram que a administração Indígena da terra está impedindo que grandes bolsões de floresta sejam queimados, concluindo que as florestas da Amazônia estão evitando o dano causado pela fumaça nas áreas próximas e protegendo as comunidades nas terras vizinhas. O novo estudo vai mais além. Observando a capacidade dos poluentes de percorrer longas distâncias e a capacidade da floresta de absorvê-los, os autores concluíram que os territórios Indígenas estão proporcionando benefícios de saúde e econômicos a populações que podem estar a uma distância de até 500 quilômetros de onde os incêndios ocorrem.

“Nossos resultados sugerem que é imprescindível agir agora – antes do período das queimadas – para proteger os povos Indígenas e suas florestas como uma questão de saúde pública”, explicou a Dra. Prist. “O não reconhecimento ou cumprimento dos direitos dos povos Indígenas à terra na Amazônia pode ocasionar o desmatamento de suas terras e um aumento no número de notificações de doenças, além do acentuado aumento dos custos de tratamentos de saúde, particularmente nas áreas já desmatadas.”

Existem atualmente 383 territórios Indígenas reconhecidos na Amazônia Legal  Brasileira, cobrindo mais de 1.160.000 quilômetros quadrados. O novo estudo concluiu que somente cinco territórios, principalmente no oeste da região densamente florestado da Amazônia Brasileira, representam oito por cento da capacidade da floresta de absorver partículas dos incêndios florestais.

Com base em uma década de relatórios de doenças cardiovasculares e respiratórias em toda a Amazônia, bem como dados sobre poluentes e cobertura florestal, os cientistas identificaram dois milhões de casos de doenças respiratórias e cardiovasculares para uma estimativa de 1,7 tonelada de partículas liberadas todos os anos por incêndios durante a estação seca, que geralmente começa no final de julho –o que sugere que devastar a floresta pode ocasionar um número muito maior de poluentes e taxas mais elevadas de doenças. Na falta de dados meteorológicos precisos, os cientistas basearam-se apenas em dados de satélite para quantificar as emissões dos incêndios, que são frequentemente perpetrados para desmatar ilegalmente a terra para cultivo ou pasto. Os pesquisadores não mediram as verdadeiras taxas de remoção da floresta, em vez disso, eles calcularam a capacidade da Amazônia de absorver as partículas emitidas pelos incêndios durante a estação da seca, fazendo previsões com base em estudos realizados em regiões temperadas.

“Apesar das dificuldades, conseguimos avaliar a contribuição da Floresta Amazônica e dos territórios indígenas para a manutenção da saúde humana e os benefícios econômicos que sua preservação pode propiciar”, disse Sangermano, Professora Assistente de Geografia na Clark University; “Nossos números provavelmente subestimam os serviços de ecossistemas fornecidos pela floresta Amazônica e seus territórios Indígenas porque não existem cálculos para as taxas de absorção de poluentes das árvores tropicais.”

A morte de Thomas Lovejoy, um cientista que aprendeu a amar e defender a Amazônia

Thomas-Lovejoy

Conheci Thomas Lovejoy no início de 1991 quando ele foi dar uma palestra na Divisão de Ciências Ambientais do Oak Ridge National Laboratory onde eu acabava de chegar para cumprir um período de intenso aprendizado que me colocou como um pesquisador interessado nos processos dos quais ele foi um dos precursores.  Em uma breve conversa após a conferência em que Lovejoy demonstrou seu profundo conhecimento sobre os processos ecológicos já angariado com seu projeto “Biological Dynamics of Forest Fragments Project (BDFFP; ou Projeto Dinâmica Biológica de Fragmentos Florestais, PDBFF) que ele havia sido iniciado em 1979. Mas mais do que ciência, Lovejoy emanava um profundo respeito pela Amazônia, sua diversidade biológica e seus povos. Desde então, sempre que lembro de Lovejoy, penso em alguém com profunda capacidade científica, mas que também possuía um forte elegância para compartilhar seu conhecimento, sempre portando uma inconfundível gravata borboleta.

Hoje soube que Thomas Lovejoy falaceu de um câncer fulminante no pâncreas e que nos priva de sua sabedoria enquanto ele tinha 80 anos (mais de 50 deles relacionados com o estudo e a proteção da Amazônia brasileira), certamente com ainda muita contribuição para dar ao avanço da ciência amazônica, e especialmente na defesa da sua diversidade biológica e cultural.

A morte de personagens como Lovejoy não é uma perda apenas para familiares e amigos, mas todos aqueles que se beneficiaram da sua tenacidade científica, e dos esforços que realizou em prol da proteção e da conservação das florestas amazônicas.

Rest in peace Thomas Lovejoy!

Degradação florestal na Amazônia brasileira: Políticas Públicas devem visar fenômeno relacionado ao desmatamento

degrad 1

Por Clarissa Gandour , Diego Menezes , João Pedro Vieira e Juliano J. Assunção para a Climate Policy Initiative 

CPI

Nas últimas décadas, o Brasil acumulou experiência significativa no uso de políticas de proteção às florestas tropicais. Mais notavelmente, o país projetou e implementou vários esforços eficazes para combater o desmatamento por corte raso na Amazônia brasileira. [1] Isso foi motivado pela necessidade urgente de conter a perda de floresta tropical no país, que estava entre as mais altas do mundo no início dos anos 2000. [2]    O desmatamento, entretanto, não é o único tipo de dano ambiental que afeta a Amazônia brasileira. A degradação florestal, fenômeno caracterizado pela perda gradativa da vegetação, surge como uma ameaça cada vez mais relevante para a região. [3] , [4]Embora a degradação possa parecer menos destrutiva do que o desmatamento, o combate à degradação deve ser uma prioridade da agenda da política de conservação do Brasil. Afinal, conter a perda de floresta em um estágio anterior aumenta a capacidade de conservar a vegetação nativa no longo prazo.

Hoje, em parte porque a degradação continua sendo um fenômeno relativamente desconhecido, raramente é priorizada em ações políticas destinadas a proteger a vegetação nativa. Um melhor entendimento da degradação na Amazônia, e particularmente de sua relação empírica com o desmatamento por corte raso, é um insumo fundamental no processo de tomada de decisão para alocar recursos escassos para a implementação de políticas públicas. Com ele, o Brasil poderia direcionar seus esforços de forma mais eficiente e fornecer uma resposta mais oportuna à degradação.

Para ampliar a compreensão desse fenômeno, pesquisadores da Climate Policy Initiative / Pontifícia Universidade Católica (CPI / PUC-Rio) caracterizaram empiricamente a dinâmica da degradação e sua relação com o desmatamento na Amazônia brasileira. Este Insight fornece uma breve introdução ao tópico da degradação tropical, um resumo dos principais resultados e orientações para pesquisas e políticas futuras. A análise reforça a relevância recente da degradação na Amazônia brasileira e constata que existe uma relação estreita entre degradação e desmatamento. Os resultados indicam que essa relação varia significativamente entre as categorias de posse da terra, enfatizando a necessidade de adaptar a política de conservação para abordar diferentes estruturas de governança com base na posse.

O que é degradação da floresta?

Este projeto define degradação florestal como a perda parcial da biomassa florestal. A Figura 1 fornece uma visão simplificada desse processo. Começando com uma floresta intacta, a degradação mina a integridade da cobertura florestal por meio da perda gradual de vegetação ao longo do tempo. Embora uma floresta degradada ainda retenha vegetação primária, ela não tem a mesma estrutura florestal, resiliência e funções como uma floresta intacta. [5] À medida que a degradação progride, a perda de biomassa florestal se aproxima do desmatamento por corte raso, no qual há remoção completa (ou quase completa) de toda a cobertura vegetal.

Figura 1. Degradação florestal e desmatamento por corte raso

Este slideshow necessita de JavaScript.

O processo representado na Figura 1, no qual uma floresta não perturbada passa por vários estágios de degradação culminando em desmatamento raso, é apenas um dos caminhos possíveis para uma área degradada. A degradação pode ocorrer mais ou menos gradualmente ao longo do tempo, dependendo do tipo de atividade que a causa. Além disso, a degradação não leva necessariamente ao desmatamento por corte raso – uma área degradada pode ser mantida intencionalmente com apenas um remanescente parcial de vegetação primária, ou pode sofrer regeneração e conter uma mistura de remanescentes primários e vegetação secundária.

Degradação da Amazônia brasileira  

Causas Primárias

As práticas mais comumente associadas à degradação tropical no Brasil são a extração seletiva de madeira e os incêndios florestais. A extração seletiva envolve o corte de espécies específicas de árvores, normalmente selecionadas com base no valor comercial de sua madeira. Além da perda de biomassa com a própria extração de árvores, a floresta ao redor das árvores derrubadas também é comprometida pela abertura de estradas de acesso e pátios de armazenamento e pelos danos causados ​​pela queda de árvores na vegetação próxima. Para minimizar esse efeito colateral, as atividades madeireiras legais devem obedecer a um plano de manejo.

Os incêndios, por outro lado, geralmente destroem primeiro as plantas mais frágeis e, após repetidos ciclos de queima no mesmo local, avançam para plantas mais resistentes. Devido à alta umidade, as florestas tropicais não queimam facilmente ou imediatamente. No primeiro contato, os incêndios consomem a vegetação mais frágil e comprometem a resiliência das plantas remanescentes, que se tornam mais vulneráveis ​​aos incêndios subsequentes.

A análise da CPI / PUC-Rio usa dados do DEGRAD, um sistema desenvolvido pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) que usa imagens de satélite para compilar mapas anuais de áreas degradadas em toda a Amazônia brasileira de 2007 a 2016. O DEGRAD não categoriza de forma consistente o tipo ou estágio de degradação, portanto, a análise empírica atualmente não cobre tal classificação.

Características Gerais

A degradação florestal é um fenômeno em grande escala na Amazônia, normalmente afetando uma área muito maior do que o desmatamento por corte raso. Entre 2007 e 2016, uma média de 11.000 km 2 de floresta foram degradados a cada ano. Isso é o dobro da média anual de áreas desmatadas no mesmo período. Enquanto o desmatamento avançou em um ritmo relativamente estável durante o período de amostra, a degradação variou consideravelmente ao longo do tempo, especialmente de 2009 a 2016. A área degradada total por ano variou de um mínimo de 2.700 km² em 2014 a um pico de 23.700 km² em 2016.

Espacialmente, a degradação florestal está geograficamente concentrada ao longo do Arco do Desmatamento , que historicamente também contém a maior parte das áreas desmatadas da Amazônia. [6] Em média, os estados de Mato Grosso e Pará somados respondem por 75% das áreas degradadas e 64% das áreas desmatadas por ano na Amazônia. Apesar da concentração regional do fenômeno, a degradação apresenta baixo índice de recorrência local ao longo dos anos . Uma determinada área é classificada como degradada, em média, apenas uma vez no período amostral.

Além disso, parece haver relativamente pouca conversão de degradação em desmatamento na Amazônia como um todo durante o período em avaliação. Em média, apenas 9% das áreas degradadas são desmatadas em até três anos, que é o tempo médio decorrido entre a ocorrência desses dois eventos. Isso, entretanto, não significa que não exista uma relação estreita entre degradação e desmatamento. Como esse número é uma média para toda a Amazônia, ele pode ocultar diferenças importantes em como as partes interessadas interagem com a floresta em regiões específicas.A posse da terra desempenha um papel potencialmente central nisso. No Brasil, a posse é um fator determinante das regras que regem o uso da terra local, incluindo a proteção e conversão da vegetação nativa. A estrutura de governança baseada na posse pode, portanto, afetar as decisões de uso da terra e, portanto, os padrões de conversão florestal local. Isso exige uma melhor compreensão da relação entre degradação e desmatamento nas diferentes categorias de posse da terra.

Degradação e desmatamento por categoria de terreno  

Observando como a degradação e o desmatamento se relacionam em diferentes categorias de posse da terra, o estudo visa explorar se a estrutura de governança influencia as interações dos atores locais com a floresta. A análise considera sete categorias: pequenas propriedades privadas, médias ou grandes propriedades privadas, territórios protegidos (áreas protegidas e terras indígenas), assentamentos rurais, terras públicas não designadas, terras não identificadas (para as quais não há informações de posse) e outros (restantes categorias).

degrad 6

Figura 2a. Desmatamento, distribuição por categoria de posse de terra, 2007-2018 Fonte: CPI / PUC-Rio com dados do PRODES / INPE, Atlas Agropecuário / IMAFLORA e Cadastro Nacional de Florestas Públicas / Serviço Florestal Brasileiro, 2021

degrad 7

Figura 2b. Degradação, distribuição por categoria de posse de terra, 2007-2016

Fonte: CPI / PUC-Rio com dados do DEGRAD / INPE, Atlas Agropecuário / IMAFLORA e Cadastro Nacional de Florestas Públicas / Serviço Florestal Brasileiro, 2021

A Figura 2 mostra a distribuição anual do desmatamento e degradação entre as categorias. Para o desmatamento, a distribuição permanece bastante estável ao longo do tempo, com participações semelhantes de perda florestal ocorrendo todos os anos em propriedades privadas (principalmente de médio ou grande porte), assentamentos rurais e terras públicas não designadas. A degradação, por outro lado, varia significativamente entre categorias e anos. Grande parte da degradação ocorre em propriedades privadas de médio ou grande porte e, em menor escala, em terras não identificadas. A menor participação de pequenas propriedades privadas e assentamentos rurais, bem como a maior participação de territórios protegidos contrastam com o padrão observado para o desmatamento.

Figura 3. Relação entre degradação e desmatamento por categoria de posse da terra, 2007-201

degrad 8

Como ler o gráfico?

Nota: Para cada categoria de posse da terra, o gráfico mostra a parcela da área degradada em cada ano que foi seguido pelo desmatamento em três anos. A análise considera o desmatamento ocorrendo no mesmo local que a degradação (conversão da degradação em desmatamento) e em suas proximidades (desmatamento próximo à degradação).

Fonte: CPI / PUC-Rio com dados do DEGRAD / INPE, PRODES / INPE , Atlas Agropecuário / IMAFLORA e Cadastro Nacional de Florestas Públicas / Serviço Florestal Brasileiro, 2021

O desmatamento segue sistematicamente a degradação em alguma das categorias de posse da terra? A Figura 3 sugere que sim. Embora a conversão local da degradação em desmatamento permaneça baixa ou moderada em todas as categorias de posse, os dados apontam para um desmatamento significativo ocorrendo perto de áreas degradadas dentro de três anos do evento de degradação. Nesse sentido, a degradação em um determinado local pode nem sempre ser um precursor do desmatamento local, mas pode servir como um indicador de que o desmatamento ocorrerá em breve naquela região .

Como mostra a Figura 3, a relação entre degradação e desmatamento varia entre as categorias de posse da terra. Embora seja impossível determinar as razões para essas diferenças a partir dos dados usados ​​no estudo, a análise levanta algumas interpretações prováveis. Existem três padrões principais. Em primeiro lugar, a conversão da degradação em desmatamento é consistentemente baixa dentro dos territórios protegidos, mesmo quando se contabiliza o desmatamento que ocorre nas proximidades de áreas degradadas. Considerando que crimes ambientais cometidos em territórios protegidos estão sujeitos a penas mais severas, as baixas taxas de conversão podem ser explicadas pelo fato de que remover mais vegetação em áreas degradadas, o que acarreta maior risco de detecção pelas autoridades ambientais, simplesmente não vale a pena. .

Em segundo lugar, a degradação parece ser seguida pelo desmatamento nas proximidades em pequenas propriedades privadas e assentamentos rurais. Nessas categorias, mesmo a conversão local de degradação para desmatamento é relativamente alta. Esse padrão provavelmente está relacionado ao alto custo de derrubar a vegetação em uma floresta tropical. Para pequenos proprietários e assentados, que normalmente têm acesso limitado a financiamento, a degradação pode ser uma maneira de remover a cobertura florestal aos poucos e a um custo menor.

Terceiro, propriedades privadas de médio e grande porte, áreas públicas não designadas e áreas não identificadas parecem estar em algum lugar entre os dois padrões anteriores. A conversão local da degradação em desmatamento é baixa, mas parece haver uma porção moderada de áreas degradadas que são seguidas por desmatamento nas proximidades. Essas categorias são menos homogêneas do que as anteriores, portanto, esse padrão provavelmente abrange uma variedade de perfis de degradação e desmatamento.

Finalmente, a evidência sugere que a parcela da degradação seguida pelo desmatamento local ou próximo cresceu nos anos finais da amostra em todas as categorias de posse da terra. Isso pode apontar para a degradação como um precursor cada vez mais relevante para – e, portanto, um importante indicador antecedente do – desmatamento.

Próximas Etapas para Pesquisa e Política Pública  

A degradação florestal parece estar intimamente relacionada ao desmatamento na Amazônia brasileira e, para determinadas categorias de posse da terra, parece ser um precursor do desmatamento. A degradação pode, portanto, ser usada como um indicador de dano ambiental iminente e ajudar a direcionar os esforços da política de conservação. Por outro lado, para os casos em que a degradação não se transforma em desmatamento, é importante entender por que a degradação dos ativos ambientais está acontecendo se a terra não está sendo posteriormente utilizada para a produção.

Nesse cenário, as políticas públicas devem adaptar as abordagens para abordar as várias práticas de conversão florestal encontradas nas diferentes categorias de posse da terra. A pesquisa, por sua vez, deve apoiar o desenho e a implementação de políticas públicas, avançando no entendimento de como as estruturas de governança baseadas na posse influenciam os padrões de degradação e subseqüente desmatamento. Este estudo oferece uma primeira visão de como os formuladores de políticas podem compreender a degradação e usar esse conhecimento para aprimorar sua capacidade de combater a perda florestal em suas várias formas.

Dados

A análise explora um conjunto de dados rico e espacialmente explícito (raster) criado a partir de uma variedade de fontes disponíveis publicamente. As variáveis-chave e suas fontes são: áreas degradadas do DEGRAD / INPE; áreas desmatadas do PRODES / INPE; e categorias fundiárias do Atlas Agropecuário / IMAFLORA e Cadastro Nacional de Florestas Públicas / Serviço Florestal Brasileiro.

Nota Metodológica

A análise visa caracterizar empiricamente a degradação florestal na Amazônia brasileira e investigar sua relação com o desmatamento por corte raso entre 2007 e 2018. A amostra espacial inclui áreas de floresta tropical no bioma Amazônia brasileira que foram degradadas e / ou desmatadas durante o período da amostra. Um banco de dados raster foi compilado com resolução de 30 metros para incluir dados georreferenciados sobre degradação e desmatamento ao longo do tempo, bem como sobre categorias de posse de terra para todo o bioma Amazônia. O estudo relaciona eventos de degradação e desmatamento ocorridos no mesmo local ou nas proximidades e estratifica os resultados por categoria de posse da terra. Devido ao grande número de observações no banco de dados (quase 2 bilhões), a amostragem aleatória foi usada para construir o conjunto de dados para análise (contendo 2.

VEJA A VERSÃO EM PDF AQUI

[1] Para um resumo das avaliações das políticas de conservação, consulte: Gandour, Clarissa. Por que proteger a Amazônia é importante? Climate Policy Initiative, 2019. bit.ly/3v0ow7N

[2] Hansen, Matthew C. et al. “Desmatamento de floresta tropical úmida de 2000 a 2005 quantificado por meio de dados multitemporais e multirresolução de sensoriamento remoto”. Proceedings of the National Academy of Sciences 105, nº 27 (2008): 9439–9444.

[3] Rappaport, Danielle I. et al. “Quantificando mudanças de longo prazo nos estoques de carbono e estrutura florestal da degradação da floresta amazônica”. Cartas de Pesquisa Ambiental 13, nº 6 (2018): 065013.

[4] Matricardi, Eraldo AT et al. “A degradação florestal de longo prazo supera o desmatamento na Amazônia brasileira”. Science 369, nº 6509 (2020): 1378-1382.

[5] Longo, Marcos et al. “Variabilidade da biomassa acima do solo em florestas intactas e degradadas na Amazônia brasileira”. Global Biogeochemical Cycles 30, nº 11 (2016): 1639-1660.

[6] O Arco do Desmatamento se refere a uma ampla região do Bioma Amazônia que se estende do oeste do Maranhão e sul do Pará em direção ao oeste, passando por Mato Grosso, Rondônia e Acre.

fecho

Este texto foi escrito originalmente em inglês e publicado pela Climate Policy Initiative [Aqui! ].