Terras indígenas na Amazônia brasileira ajudam a prevenir doenças causadas por queimadas, diz estudo

Novo estudo de dez anos, revisado por pares, sugere que as florestas administradas por Indígenas na Amazônia Brasileira absorvem milhares de poluentes de gases venenosos provenientes de incêndios florestais, evitando 15 milhões de dispendiosos casos de doenças todos os anos

Tropical Rainforest Landscape, Amazon

Londres (6 de abril de 2023) – Uma nova pesquisa divulgada na Communications, Earth & Environment, uma publicação do Grupo Nature, sugere que a floresta tropical da Amazônia e seus territórios Indígenas podem absorver nada menos que 26.000 toneladas de poluentes nocivos liberados pelas queimadas todos os anos, evitando assim, milhares de casos de doenças cardiovasculares e respiratórias letais e reduzindo de forma significativa os custos com a saúde em algumas das cidades mais desmatadas da região.

Com base em uma análise de dados de dez anos, os autores do novo estudo constataram que cada hectare de floresta queimada custa às cidades pelo menos 2 milhões de dólares no tratamento de doenças relacionadas, enquanto demonstram que as florestas Indígenas – ao absorverem os poluentes dos incêndios – evitam cerca de 15 milhões de casos de doenças respiratórias e cardiovasculares por ano, o que, de outra forma, custaria 2 bilhões de dólares ao sistema de saúde.

A pesquisa também conclui que terras indígenas densamente florestadas estão protegendo populações urbanas e rurais, situadas muitas vezes do outro lado da Amazônia, no “arco de desmatamento”, na região sudeste da floresta, que perdeu a maior parte da sua cobertura florestal para a agroindústria e outras atividades, legais e ilegais.

Em todo o mundo, as florestas são conhecidas por absorverem poluentes de incêndios pelos poros localizados na superfície das folhas, mas esta é a primeira vez que calculamos a capacidade das florestas tropicais para fazer isso “, comentou a Dra. Paula Prist, cientista pesquisadora sênior da EcoHealth Alliance e principal autora do estudo. “Nossos resultados indicam que a floresta Amazônica pode absorver 26.000 toneladas de partículas todos os anos e os territórios Indígenas são responsáveis por 27% dessa absorção, embora ocupem apenas 22% da floresta.”

Divulgadas apenas alguns dias antes de o Presidente Lula completar seus primeiros 100 dias de mandato, as constatações podem representar mais um fator de urgência para a promessa do governante brasileiro de reconhecer e fazer cumprir os direitos dos povos Indígenas à terra, o que já se comprovou desempenhar um papel descomunal na redução do desmatamento e da perda da biodiversidade na Amazônia.

“A ciência evidenciou que as florestas administradas por indígenas sofrem menos com o desmatamento responsável pela mudança climática e risco de pandemia, mas esta é a primeira iniciativa de quantificar como elas beneficiam a saúde humana e da economia, indicando que os benefícios superam em muito os desafios desses territórios”, disse a Dra. Florencia Sangermano, coautora do novo estudo e especialista no uso de análise geoespacial e sensoriamento remoto por satélite, para avaliar as mudanças no sistema terrestre e dimensionar seus efeitos nos ecossistemas e na biodiversidade.

A equipe de pesquisadores, da Clark University, EcoHealth Alliance, George Mason University, a Universidade Nacional Autônoma do México e a Universidade de São Paulo, concentrou sua análise na Amazônia Legal Brasileira, uma área que se estende por mais da metade do território do país, incluindo 722 cidades de médio e pequeno porte. Durante o período das queimadas, do final de julho até novembro, a região torna-se “um dos lugares mais poluídos do planeta”, ressaltaram a Dra. Prist e seus  coautores.

Os incêndios florestais nos países de floresta tropical são responsáveis por 90% das emissões globais de partículas liberadas pelas queimadas, incluindo aqueles situados na Bacia do rio Amazonas. E as florestas de folhas largas da Amazônia têm mais probabilidade do que as florestas de outros biomas de liberar aerossóis carbonáceos negros e orgânicos, os principais componentes das partículas finas causadoras de aumento da taxa de incidência das doenças respiratórias e cardiovasculares da região.

Entre 19 de maio e 31 de outubro de 2021, os incêndios na Amazônia consumiram 519.000 hectares de floresta, tendo o Brasil perdido a maior parte da sua cobertura florestal para essas queimadas, segundo o relatório. “O número de incêndios vem crescendo nos últimos anos”, acrescentou Prist. “Em 2020, as taxas de desmatamento alcançaram os níveis mais elevados da década na Amazônia Brasileira.”

Outros pesquisadores demonstraram que a administração Indígena da terra está impedindo que grandes bolsões de floresta sejam queimados, concluindo que as florestas da Amazônia estão evitando o dano causado pela fumaça nas áreas próximas e protegendo as comunidades nas terras vizinhas. O novo estudo vai mais além. Observando a capacidade dos poluentes de percorrer longas distâncias e a capacidade da floresta de absorvê-los, os autores concluíram que os territórios Indígenas estão proporcionando benefícios de saúde e econômicos a populações que podem estar a uma distância de até 500 quilômetros de onde os incêndios ocorrem.

“Nossos resultados sugerem que é imprescindível agir agora – antes do período das queimadas – para proteger os povos Indígenas e suas florestas como uma questão de saúde pública”, explicou a Dra. Prist. “O não reconhecimento ou cumprimento dos direitos dos povos Indígenas à terra na Amazônia pode ocasionar o desmatamento de suas terras e um aumento no número de notificações de doenças, além do acentuado aumento dos custos de tratamentos de saúde, particularmente nas áreas já desmatadas.”

Existem atualmente 383 territórios Indígenas reconhecidos na Amazônia Legal  Brasileira, cobrindo mais de 1.160.000 quilômetros quadrados. O novo estudo concluiu que somente cinco territórios, principalmente no oeste da região densamente florestado da Amazônia Brasileira, representam oito por cento da capacidade da floresta de absorver partículas dos incêndios florestais.

Com base em uma década de relatórios de doenças cardiovasculares e respiratórias em toda a Amazônia, bem como dados sobre poluentes e cobertura florestal, os cientistas identificaram dois milhões de casos de doenças respiratórias e cardiovasculares para uma estimativa de 1,7 tonelada de partículas liberadas todos os anos por incêndios durante a estação seca, que geralmente começa no final de julho –o que sugere que devastar a floresta pode ocasionar um número muito maior de poluentes e taxas mais elevadas de doenças. Na falta de dados meteorológicos precisos, os cientistas basearam-se apenas em dados de satélite para quantificar as emissões dos incêndios, que são frequentemente perpetrados para desmatar ilegalmente a terra para cultivo ou pasto. Os pesquisadores não mediram as verdadeiras taxas de remoção da floresta, em vez disso, eles calcularam a capacidade da Amazônia de absorver as partículas emitidas pelos incêndios durante a estação da seca, fazendo previsões com base em estudos realizados em regiões temperadas.

“Apesar das dificuldades, conseguimos avaliar a contribuição da Floresta Amazônica e dos territórios indígenas para a manutenção da saúde humana e os benefícios econômicos que sua preservação pode propiciar”, disse Sangermano, Professora Assistente de Geografia na Clark University; “Nossos números provavelmente subestimam os serviços de ecossistemas fornecidos pela floresta Amazônica e seus territórios Indígenas porque não existem cálculos para as taxas de absorção de poluentes das árvores tropicais.”

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