Agricultura familiar é o negócio

afApesar de possui dez assentamentos e mais de 1.000 famílias produzindo alimentos, o município de Campos dos Goytacazes não possui políticas estruturadas para a apoiar o desenvolvimento da agricultura familiar

Nesta campanha eleitoral tenho ouvido vários candidatos, a começar pelo primeiro colocado das pesquisas, mencionarem o valor do agronegócio para o município de Campos dos Goytacazes. Apesar de não ficar explícito sobre qual seria o entendimento do que esse “agronegócio” se trata, assumo que essa palavra é associada unicamente ao moribundo setor sucro-alcooleiro que já viveu anos dourados, mas que hoje não possui mais qualquer possibilidade de oferecer uma saída para o grave problema da geração de riqueza no município.

As razões para a decadência irreversível do setor sucro-alcooleiro são muitas, mas a principal é que a fronteira da produção do açúcar e do álcool no Brasil se moveu para fora das suas áreas tradicionais no Rio de Janeiro e nos estados nordestinos, se movendo inicialmente para o estado de São Paulo, para depois passar por Minas Gerais e chegar ao centro oeste,  fincando raízes com usinas ultra modernas e capital multinacional em Goiás, Mato Grosso do Sul e Mato Grosso. Tanto isto  é verdade que das 414 usinas em funcionamento no Brasil, 171 estão localizadas em São Paulo, 42 em Minas Gerais e 79 no centro oeste (em um total de 292, ou estrondosos 70%). 

Então qualquer sugestão de que dinheiro público será novamente jogado em um setor cuja capacidade motriz já se exauriu, como ocorreu no período do Proálcool, não faz o menor sentido para a busca de um arranjo produtivo que possibilite um ciclo virtuoso na economia municipal que a libere da chamada royalties dependência.

Para mim faria muito mais sentido se a Prefeitura de Campos finalmente tivesse uma política de dinamização da produção agrícola, com iniciativas para agregação de valor e uso dos alimentos ali gerados em escala local, que acontece nos 10 assentamentos de reforma agrária existentes no município, e que contam com mais de 1.000 famílias vivendo, produzindo e comercializando um ampla gama de produtos agrícolas sem qualquer apoio das últimas administrações municipais.

A relação com os assentamentos tem sido tão precária que sequer incluir o município no programa federal conhecido como PAA (Programa de Aquisição de Alimentos) as últimas gestões se deram ao trabalho de fazer.  Eu aprendi isso em 2014 ao orientar uma dissertação de mestrado no Programa de Políticas Sociais da Universidade Estadual do Norte Fluminense, defendida pela hoje mestre Cynara Martins Santana, onde verificamos que enquanto Cardoso Moreira havia adotado o PAA, Campos dos Goytacazes não. Isso gerou inclusive uma situação esdrúxula onde os alimentos comprados por instituições campistas via o PAA eram adquiridos no município vizinho.

O interessante é que se apenas um décimo da dívida acumulada junto ao chamado Fundo de Desenvolvimento de Campos (FUNDECAM) (uma dívida que giraria em torno de  R$ 400 milhões) tivesse sido investido na criação de agroindustrias nos assentamentos existentes no município, o retorno econômico teria sido significativo, dotando Campos dos Goytacazes de um base sólida para a produção de alimentos saudáveis, em vez de ter servido para abastecer as contas bancárias de quem depois sequer se deu ao trabalho de pagar o tomado dos cofres públicos municipais.

Em um momento de grande carestia e de diminuição na área plantada de itens básicos da dieta dos brasileiros por causa da opção preferencial do latifúndio agro-exportador por produzir grãos que servirão basicamente para alimentar rebanhos animais em outras partes do mundo, uma política municipal em prol do beneficiamento da produção já existente nos assentamentos serviria para também impedir para aplacar a fome crescente que se espalha pela planície dos goitacazes.

Por isso tudo é que eu digo que esqueçam a monocultura da cana, pois a agricultura familiar é o único negócio com chance de dar certo. Por isso, sugiro ainda às candidatas e aos candidatos a prefeito que, em vez de ficarem fazendo carreatas que produzem barulho e poluição, se deem ao trabalho de visitar os assentamentos de reforma agrária para dialogar com aqueles que seguram parte das respostas para um futuro melhor para todos nós. Uma dica: comecem pelo Assentamento Zumbi dos Palmares, o maior do estado do Rio de Janeiro em que mais de 500 famílias produzem todo tipo de alimento que acaba sendo exportado para pontos distantes como Porto Alegre, Belo Horizonte e Brasília.

 

Governo Rafael Diniz esquece assentamentos de reforma agrária e faz aquisições milionárias no Espírito Santo

Resultado de imagem para reforma agrária campos dos goytacazes

Lembro bem que em uma das muitas propagandas feitas pelo então candidato Rafael Diniz estava o fortalecimento das políticas municipais voltadas para a agricultura familiar.  Nada mais coerente e justo já que Campos dos Goytacazes é provavelmente o município fluminense com o maio número de assentamentos de reforma agrária no estado do Rio de Janeiro.

Entretanto,  passados quase 12 meses da administração do jovem prefeito Rafael Diniz, a situação em nada mudou e os assentamentos de reforma agrária que produzem alimentos que acabam sendo exportados para várias capitais brasileiras (por exemplo: Belo Horizonte, Porto Alegre, São Paulo e Vitória) continuam totalmente abandonados pela Prefeitura Municipal de Campos dos Goytacazes.

Mas a coisa fica ainda pior quando se verifica o Diário Oficial do Município de Campos dos Goytacazes (DOMCG) publicado no dia de hoje e se verifica que com base em recursos do Programa de Alimentação Escolar (PNAE), a Secretaria Municipal de Educação, Cultura e Lazer celebrou contratos com duas cooperativas localizadas no Espírito Santo que chegam a quase 2 milhões de reais (ver abaixo).

Ainda que não esteja patente que tais compras fora do município passam inclusive ao largo da determinação da Lei 11.947, de 16 de junho de 2009 que regulamenta o PNAE , a qual determina que pelo menos 30% das aquisições feitas com  recursos oriundos do programa sejam com produtos oriundos da agricultura familiar, me parece peculiar que existindo diversos assentamentos de reforma agrária no município, a Secretaria Municipal de Educação, Cultura e Lazer tenha preferido fazer suas compras  em terras capixabas.

Outros detalhes curiosos desses dois contratos é que apesar de terem sido publicados na edição de hoje do DOMCG, os mesmos foram assinados no dia 17 de Outubro e com uma validade de 6 meses.  Além disso, como estaremos entrando em um período de férias escolares, fica a pergunta de porque se assinou um contrato com tal prazo de validade.  No mínimo, haverá que se fiscalizar muito bem quais produtos serão entregues ao longo do período de vigência destes contratos e onde ficarão estocados. É que se corre o risco de gastar quase 2 milhões de reais por produtos perderão a validade mesmo antes do início do calendário escolar de 2018!

E aí volta aquela máxima da campanha eleitoral do jovem prefeito Rafael Diniz que  colocava que “o problema de Campos não é falta de dinheiro, é falta de gestão”. Pelo jeito estamos diante de mais um caso de cachorro mordendo o próprio rabo.  E se for só isso, está de bom tamanho.

Mas como estamos quase na véspera do Natal, me resta esperar que o espírito das boas novas se abata sobre o jovem prefeito Rafael Diniz e ele se recorde das promessas de fortalecimento das políticas voltadas para a agricultura familiar.  Os assentados da reforma agrária certamente agradecerão.