Audiência Pública na Câmara de Vereadores para prestação de contas da Água do Paraíba: um breve relato de participação

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No encerramento da minha fala mostrei uma garrafa do agrotóxico 2,4-D (também conhecido como agente laranja) que é vendido legalmente no Brasil, apesar de todas as alegações existentes acerca de seus efeitos sobre a saúde humana, e é um dos herbicidas que precisam ser monitorados continuamente pelas concessionárias de água

Nesta 5a. feira (31/03) estive a convite para participar da audiência pública para prestação de contas da concessionária Águas do Paraíba realizada pela Câmara de Vereadores de Campos dos Goytacazes. Uma primeira observação é que a audiência, lamentavelmente, teve baixa participação da população, que, afinal, é a principal interessada em que tenhamos uma melhoria na qualidade dos serviços e uma política de preços que reflita melhor a realidade sócio-econômica existente no município.

Uma segunda observação é que os representantes da concessionária tiveram um largo espaço para apresentar as virtudes da empresa (o que é natural), mas sem que houvesse uma necessária transparência sobre as evidentes fragilidades existentes nos serviços prestados pela Águas do Paraíba. Um exemplo disso foi dado por um companheiro de audiência que, enquanto ouvia a apresentação auto congratulatória da empresa, recebeu uma ligação de uma cidadã de Mata da Cruz que informava indignada que a única coisa fornecida pela concessionária naquela localidade campista era a conta da água, pois água mesmo nunca tinha aparecido por lá.

A minha participação que ocorreu a partir de convite formal do presidente da Câmara de Vereadores, vereador Fábio Ribeiro, se concentrou em apresentar o problema representado pela presença de resíduos de agrotóxicos na água de torneira, inclusive a fornecida em nossa cidade, e apresentar o chamado “Mapa da Água” e seus dados sobre a cidade de Campos dos Goytacazes.

A minha intervenção recebeu alguma atenção dos vereadores presentes, especialmente os vereadores Abdu Neme e Rogério Matoso que se mostraram interessados em conhecer melhor os trabalhos feitos na Universidade do Norte Fluminense (Uenf) sobre a qualidade da água em nosso município. A eles recomendei que fizesse contato com o reitor Raúl Palácio para que seja viabilizada uma visita dos vereadores ao campus Leonel Brizola, o que eles ficaram de agendar.

Por outro lado, também recebi menções dos representantes da Águas do Paraíba que, por um lado, reconheceram que a presença de resíduos de agrotóxicos na água é um problema sério e, por outro, informaram o início de tratativas com pesquisadores da Uenf para que haja um monitoramento mais refinado sobre a presença de resíduos de agrotóxicos em água utilizada para consumo humano.  De minha parte, considero esse posicionamento positivo, mas que ainda precisará ser concretizado para que possamos avaliar os seus desdobramentos práticos.

Finalmente, uma proposta que apresentei na audiência foi a criação de uma “Observatório social da água” em Campos dos Goytacazes, pois a questão da contaminação do micro-poluentes emergentes precisa ser tratada de forma integrada pelas instãncia de governo, pela concessionária e pela população. 

A Águas do Paraíba nunca perde, só ganha


Volto e meia abordo aqui a concessionária Águas do Paraíba que detém o monopólio na distribuição de água e tratamento de esgotos na cidade de Campos dos Goytacazes. Para mim, independente das boas pessoas que lá trabalham, o caso da Águas do Paraíba é um completo escândalo, do qual sou lembrado toda vez que recebo uma de suas contas já que sou cliente compulsório da empresa, graças ao ex-prefeito e hoje novamente poderoso na administração do jovem prefeito Rafael Diniz (PPS), Sérgio Mendes.

Para quem ainda não sabe, a Águas do Paraiba é uma das 14 empresas controladas pelo Grupo Águas do Brasil e é propriedade de quatro grandes empresas (Developer S.A. – Grupo Carioca Engenharia, Queiroz Galvão Participações – Concessões S.A., Trana Participações e Investimentos S.A. e Construtora Cowan S.A.), tendo negócios espalhados desde o sudeste até a região norte.

A Águas do Paraíba muito provavelmente é uma das joias da coroa do Grupo do Águas do Brasil por um simples motivo: os termos do seu contrato com o município de Campos dos Goytacazes é do tipo “win-win”, qual seja, vencer ou vencer, não havendo como perder. E isso vem desde o tempo em que Sérgio Mendes fez um ótimo negócio para a Águas do Brasil e um péssimo para a população de Campos dos Goytacazes, mas outros prefeitos, incluindo Arnaldo Vianna e agora Rafael Diniz, só ampliaram a margem de vitórias da empresa.

E apesar de tempos em tempos termos ameaças de comissões parlamentares de inquérito na Cãmara de Vereadores de Campos dos Goytacazes para apurar o sistema de preços e a real qualidade dos serviços de água e esgoto que são oferecidos, as coisas rapidamente passam do estágio da ameaça para o do pronto esquecimento. Enquanto isso, a Águas do Paraíba continua fazendo a alegria das suas reais proprietários e dos seus controladores acionários.

Mas deixando o discurso de lado, vamos a um exemplo prático de como opera o sistema “win-win” da Águas do Paraíba. E para fazer isso, uso a minha própria conta de água que ontem aportou na caixa de correios aqui de casa.

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Uma rápida olhada na conta acima mostrará que das 12 últimas contas foi cobraso com um consumo faturado de 10 m3 de água, enquanto em 3 meses tive o azar de sofrer com vazamentos que elevaram o valor cobrado a níveis estratosféricos.

Mas quem olhar para o consumo medido em abril de 2018, notará que eu efetivamente apenas consumi 6 m3, mas deverei pagar os 10 m3 faturados. Além disso, a cobrança do serviço de coleta e tratamento de esgoto também é cobrado no nível dos 10 m3 tarifados, e não dos 6m3 efetivamente consumidos. Mais vitória para a Águas do Paraíba só se eu também tivesse que pagar pelo ar que chega pela tubulação. Bom, pensando bem, há muita gente que desconfia que esse tipo de cobrança já é feita há muito tempo.

O que mais me indigna nessa história de mecenato pró-corporações privadas é que nem há como se questionar a qualidade dos serviços prestados pela Águas do Paraíba. É que tanto a Agência Nacional de Águas como o Comitê de Bacia não possuem ferramentas efetivas para coibir eventuais desvios na qualidade dos serviços prestados. E aí ao cidadão, transformado em consumidor do monopólio da água e do esgoto, resta reclamar com o papo.

Finalmente, há algum tempo já se sabe que os métodos tradicionais de descontaminação da água fornecida pela maioria das concessionárias já não conseguem eliminar uma série de contaminantes (os chamados micro-poluentes emergentes) e, por isso, estamos sendo contaminados por agrotóxicos, hormônios, cafeína, cocaína, micro-plásticos e por ai vai [1 e 2]  Em relação a esses micro-poluentes, a Águas do Paraíba se faz de desentendida, enquanto continua a cobrar suas contas salgadas de uma população cativa. 

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Por essas e outras é que os lucros do Grupo Águas do Brasil não param de crescer, gerando uma “win win situation”. Já para os consumidores cativos fica a “lose-lose situation“.  Simples assim.


[1] http://repositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/249643/1/Raimundo_CassianaCarolinaMontagner_D.pdf

[2] http://inctaa.com.br/sites/default/files/inctaa-ebook-cafeina.pdf