As reinações de Eduardo Paes e a pajelança com Silas Malafaia: tudo está em ordem, apesar de parecer fora da ordem

Eduardo Paes e Silas MalafaiaEduardo Paes e Silas Malafaia | Reproduções

Por Douglas Barreto da Mata

Um político do calibre de Eduardo Paes, prefeito da capital do estado do Rio de Janeiro, não pode ser acusado nem de descuido, nem de ingenuidade ou burrice.  Ele sabe que política é cálculo, mas esse cálculo não é matemático, portanto, os resultados nem sempre correspondem ao desejo de quem arrisca. Apesar de ser um político de espectro conservador, desde o seu surgimento, como cria de César Maia, até os dias atuais, onde pratica o bê-á-bá da gestão neoliberalíssima do estado, com privilégios aos ricos, e deveres aos pobres, o fato é que a aproximação com Lula permitiu ao prefeito dar um verniz mais progressista a sua carioquice.

Olhando bem de perto, Eduardo Paes foi bem sagaz em aproveitar esse paradoxo carioca, ou seja, um povo simpático no bar e na praia (ou em outras esferas públicas), mas com inclinações fascistas no aspecto político. Claro que isso é uma generalização, até porque não dispomos de espaço para analisar cada manifestação política do carioca por segmento, mas em resumo o Rio é de direita, desde a Zona Oeste, passando pelo Centro, Zona Norte e Zona Sul.

Então por que Eduardo Paes resolveu apostar em um gesto de carinho com o Pastor Malafaia, logo agora que ele está nas cordas?  Antes de tudo e mais nada, não vai aqui nenhuma crítica contra as preferências religiosas do Pastor, e a forma dele exercer seu ministério, nada disso.  A Igreja Católica esconde até hoje os casos de pedofilia praticado pelos seus clérigos dentro de igrejas, e das suas instituições de abrigo de crianças, e ninguém fala nada.

A história de poder papal, desde a criação desse cargo é povoada de orgias, mortes, guerras e conspirações.  Está a família Bórgia para quem quiser conferir.  As Cruzadas da Igreja Católica fazem Netanyahu parecer Ghandi.  Então, não trato essa questão com preconceito. 

Olha, eu acho que há várias questões inseridas nesse cenário. A primeira, a existência de uma relação pessoal entre Paes e Malafaia.  Ou seja, sim, ele está demonstrando lealdade em um momento difícil, e isso em política tem valor enorme.  Porém, esse gesto não é o principal motivador.  As outras circunstâncias têm a ver com Paes, mas com o seu padrinho, Lula.

Lula é o único brasileiro, e talvez um dos poucos líderes ocidentais que se especializou em candidaturas presidenciais. Foram várias, 1989, 1994, 1998, e as bem sucedidas, 2002, 2006 e 2022.  É favorito em 2026. Sempre teve mais de 30% do eleitorado. Em 2018, preso, colocou um ilustre desconhecido no segundo turno, e ele estava preso e incomunicável! Então, Lula conhece o caminho, e sabe que necessita de uma reaproximação com os evangélicos mais radicais, e colocou Paes em campo para fazer o trabalho.

Quando mandou os 12 deputados do PT darem seus votos na PEC da Blindagem, para desespero de toda a esquerda e de boa parte do eleitorado, Lula estava acenando para o setor mais difícil do centrão, como se fizesse um gesto de distensão, e imagina que pode controlar o resultado no Senado, onde já colocou 850 milhões em emendas sob controle de David Alcolumbre, presidente da casa.

Na outra ponta, Flávio Dino aperta o cerco contra as emendas, e dá a Lula um poder de negociação ainda maior, o bom e velho, cria dificuldade e vende facilidade. É uma tacada incerta?  Sim é, mas para quem, como Lula, que estava no limbo até bem pouco tempo, sem perspectiva de elaborar uma estratégia de campanha, neste fim de governo, poderíamos dizer que ele ganhou vários bilhetes premiados, desde a lambança de Eduardo Bolsonaro para salvar o pai, o apoio de Trump a essa demanda, passando por aquela passeata com a bandeira dos EUA em plena Avenida Paulista.

Mas e Paes, o que ele ganha com isso tudo? Muita coisa.  Eduardo Paes, no Rio, pode trazer para si um campo da direita que está solto, ainda mais quando o Pastor Malafaia deixou claro que não vai com Rodrigo Bacellar, caso Washington Reis não esteja na disputa, por impedimento ou por vontade dele mesmo. Com isso, ele cumpre o papel que Lula lhe designou, mas avança para uma parte do eleitorado que não lhe é muito simpático, já que o prefeito carioca gosta de se identificar com essa versão de religiosidade plural que boa parte do público evangélico odeia.

Nessa altura do campeonato, quando há anos que todos só falam da sucessão estadual, e sendo Paes o nome mais exposto nesse tempo, 70% dos eleitores não sabem em quem votar, o que acende a luz amarela no staff do alcaide carioca.  Já há nomes tocando os 10%, e pelo menos um já ultrapassou, acho que foi o Reis. Eduardo Paes segue sem uma base no interior, e bloqueado na Baixada Fluminense, isto é, os seus 50% de preferência aparecem onde ele já sabe que seria favorito, na capital. Paes não tem paz.

Quando a pandemia se encontra com o Cristofascismo

No domingo em que o Brasil já ultrapassou 2 milhões de infectados e 78 mil mortos pela COVID-19,  não posso deixar de esquecer dos muitos conhecidos que possuem afiliação a igrejas protestantes que se sentem claramente incomodados e até perplexos com o papel que seus líderes vem jogando na sustentação do governo Bolsonaro. Um sentimento que é expresso em um gradual afastamento da defesa de um presidente que, por força das orientações das principais lideranças evangélicas brasileiras, eles ajudaram a eleger na expectativa de que realmente haveria uma aproximação com os valores éticos e morais que eles defendem.

cristofascismo

Em meio a essa perplexidade, e até com a expectativa de que esses milhões de brasileiros ligados a diferentes denominações, possam entender o jogo político que envolve a aproximação do presidente Jair Bolsonaro com algumas das principais lideranças protestantes do Brasil é que decidi compartilhar com os leitores deste  blog o E-book intitulado “Pandemia Cristofascista” escrito pelo professor do Programa de Pós-Graduação em Políticas Sociais da Universidade Estadual do Norte (Uenf), Fábio Py.

Obviamente o conteúdo da obra traz elementos polêmicos, mas também esclarecedores, sobre as relações estabelecidas sobre o que Py acredita ser uma relação direta entre as grandes estruturas evangélicas existentes no Brasil com o desenvolvimento do que veio a ser popularmente denominado de “Bolsonarismo”.  Para isso, ele realiza um trabalho bastante eficiente no sentido de desvelar os mecanismos que possibilitam não apenas a aproximação, mas também o necessário suporte político, inclusive no parlamento, mas não apenas lá.

bolso lideresO presidente Jair Bolsonaro em encontro com líderes religiosos, incluindo Silas Malafaia e R.R. Soares

A boa notícia é que, segundo Py, sinais de desgaste já começam a aparecer e, desde o início da pandemia da COVID-19, alguns grupos religiosos estão reavaliando o apoio incondicional a Bolsonaro.  Nesse sentido, Py afirma que “algumas estruturas tradicionais, como os protestantes tradicionais, já estão fazendo uma crítica do alinhamento com o governo. Os Presbiterianos e os Metodistas começaram a fazer uma crítica das ações do presidente durante a pandemia, principalmente por não seguir as recomendações da Organização Mundial da Saúde – OMS”.

Quem desejar baixar gratuitamente, o E-book “Pandemia Cristofascista”, basta clicar [Aqui!].

Ao atacar Marcos Pontes, Silas Malafaia dá testemunho de porque ciência e religião devem ficar sob os cuidados de quem entende

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A imagem acima mostra a Xilogravura de Flammarion, que é assim chamada porque a sua primeira aparição foi documentada em 1888 no livro L’atmosfera: météorologie populaire (“A Atmosfera: Meteorologia Popular”), de autoria de Camille Flammarion. Ela mostra um homem medieval com seu bastão, vestido como um peregrino, que olha para o céu como se estivesse encoberto por uma cortina, ele olha como se quisesse conhecer o outro lado da Terra, o que está oculto, o que há além do próprio planeta Terra.

Uma das poucas declarações lúcidas pronunciadas por um membro do governo Bolsonaro foi dada pelo ministro da Ciência e Tecnologia, Marcos Pontes, que rebateu as declarações da ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves, de que “que a igreja evangélica perdeu espaço na História ao “deixar” a Teoria da Evolução entrar nas escolas sem ser questionada.” [1]. Fontes, enquanto o responsável pelas questões relacionadas à ciência e tecnologia do governo Bolsonaro, rebateu de forma educada dizendo algo que deveria ser senso comum entre qualquer cidadão do Século XXI ao afirmar que “… do ponto de vista da ciência, são muitas décadas de estudo para formar a Teoria da Evolução desde o início. Ou seja, não se deve misturar ciência com religião.”

Essa declaração do ministro da Ciência e Tecnologia que nada tem de extraordinária causou um posicionamento do Pastor Silas Malafaia, da Assembleia de Deus Vitória em Cristo   e apoiador de primeira hora da candidatura de Jair Bolsonaro, que usou sua página oficial na rede social Twitter para tentar ensinar a Marcos Fontes a diferença entre “lei” e “teoria” para, em seguida, questionar a validade da Teoria da Evolução de Charles Darwin (ver imagem abaixo) [2].

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Uma nota inicial é que por cerca de 17 anos fui o encarregado de ministrar a disciplina “Fundamentos da Metodologia da Pesquisa” no Programa de Pós-Graduação em Políticas Sociais da Universidade Estadual do Norte Fluminense.  E a enunciação das principais diferenças entre “leis”, “teorias”, “hipóteses”, “conceitos” e variáveis” era uma dos primeiros conteúdos que apresentava aos participantes da referida disciplina. A razão para isso era e é bem simples: a maioria dos leigos em ciência não sabem diferenciar uma coisa da outra, o que contribui para a criação de graves distorções na produção de conhecimento científico. É que quem não sabe o básico do básico em termos de formação do conhecimento científico, não terá como produzir ciência.

Por isso ao ler o tweet do Pastor Silas Malafaia me dividi entre um momento de pasmo e outro de dúvida. O pasmo ficou por conta da ação de um pastor tentando ensinar ciência ao ministro da Ciência e Tecnologia. Já a dúvida ficou por conta do quão certo ou errado o Pastor Silas Malafaia em questionar a “verdade” da Teoria da Evolução ao colocá-la num plano inferior ao ocupado pelas leis da ciência.  E, pior, se o Pastor Silas Malafaia estivesse certo, eu teria que procurar todos os participantes das 17 edições que participaram da disciplina “Fundamentos da Metodologia da Pesquisa” que ofereci na Uenf.

Felizmente hoje existem as chamadas ferramentas de busca na internet, e fiz o que toda pessoa deveria fazer antes de escrever sobre algo que não entende, no caso do Pastor Silas Malafaia, ciência.  

Uma busca rápida com os termos “leis”, “teoria” e “ciência” no Google ofereceu “apenas” 26 milhões de links para serem acessados. Se o Pastor Silas Malafaia tivesse tido a curiosidade de acessar pelo menos um desses 26 milhões de links, ele provavelmente não teria tentando desacreditar a Teoria da Evolução da forma tão tosca quanto tentou.

É que, colocando em miúdos, teorias e leis não estão em condições hierárquicas disparatadas como Malafaia tentou dar a entender.  É que leis e teorias científicas apenas tratam de elementos distintos de construção do conhecimento dito científico, sendo o principal deles o fato de que “enquanto as teorias científicas explicam fenômenos da natureza, as leis são descrições generalistas desses fenômenos.” [3].  

E mais importante: teorias científicas são construídas inicialmente como um modelo ideal da realidade, mas só “sobrevivem” se resistirem a seguidos testes relativos à sua validade e replicabilidade.  Além disso, dado que a ciência assume a possibilidade de aperfeiçoamento mediante à eliminação de erros, teorias podem ser aperfeiçoadas ao longo do tempo ou, simplesmente, serem abandonadas por serem refutadas por outras teorias com maior capacidade de explicação sobre um dado fenômeno.

E quando se fala da Teoria da Evolução, pode-se até não gostar da explicação que ela oferece sobre o processo que origina e afeta a dinâmica evolutiva das espécies que vivem na Terra. Entretanto, a Teoria da Evolução já sobreviveu a basicamente todos os testes concernentes à sua validade e sua aplicação universal. Isso não quer dizer que outra teoria não possa competir por uma explicação melhor. Entretanto, não há como disputar boa parte dos seus postulados teóricos, pois os mesmos já foram extensamente demonstrados empiricamente.  E aí é que mora o maior perigo para leigos que tentem adentrar o domínio da ciência. É que a boa ciência deve resistir tanto à testes teóricos como empíricos, não havendo espaço para o sobrenatural nesse tipo de verficação.

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Charles Darwin (1809-1882), naturalista britânico que convenceu a comunidade científica da ocorrência da evolução e propor uma teoria para explicar como ela se dá por meio da seleção natural e sexual.

Assim, o que parece ficar demonstrado neste ataque de Silas Malafaia a  Marcos Pontes é que parece ser mais prudente que o pastor se atenha à religião e o ministro à questão da ciência. Se ambos fizerem isso, é possível que o produto final seja melhor para ambos. E, principalmente, ninguém passará vergonha por falar do que não entende.

Por fim, aos que se interessarem em conhecer mais sobre o processo de formação e evolução da ciência moderna, sugiro a leitura do livro “A Ciência e a Filosofia dos Modernos” do filósofo italiano Paolo Rossi (atenção para o fato de que não é o mesmo Paolo Rossi, o centroavante que destroçou as esperanças brasileiras no Estádio de Sarriá na Copa do Mundo de 1982!) [4]. Considero esse livro excelente para que se entenda os fundamentos da ciência moderna e sempre recorro a ele quando tenha dúvidas sobre o assunto.

Alô TRE! Propaganda eleitoral no campus da UENF pode ou não?

Na semana passada o veículo transportando o deputado federal Chico Alencar, candidato ao senado pelo PSOL, foi impedido de entrar no campus Leonel Brizola sob a alegação de que está proibida a entrada de veículos om propaganda eleitoral dentro de instituições públicas. Além disso, ouvi pelo menos um relato de professor da própria universidade que foi proibido de entrar com seu veículo no pátio do campus de Macaé por estar portando propaganda eleitoral. 

Pois bem, hoje (11/09) um veículo com placa de Bom Jesus do Norte (ES), não só pode entrar no campus da Universidade Estadual do Norte Fluminense, mas como pode permanecer estacionado, enquanto portava uma propaganda do candidato a deputado federal pelo DEM do Rio de Janeiro (ver imagem abaixo).

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A questão que se coloca para os sempre atentos juízes e fiscais do TRE/RJ:  propaganda eleitoral no campus da UENF pode ou não? Ou a restrição é apenas para candidatos de esquerda e a coisa pode correr livre, leve e solta para quem é apoiado, por exemplo, pelo Pastor Silas Malafaia?

Mas como as discrepâncias estão ocorrendo no campus da UENF, a reitoria da instituição também poderia se manifestar sobre essa situação.

Operação Timóteo: Silas Malafaia é conectado a esquema de corrupção envolvendo royalties minerais

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O pastor Silas Malafaia é um daqueles exemplos de como o uso político da religião pode ser benéfico já que ele se tornou uma pessoa de influência graças à sua habilidade de carregar nas tintas contra seus adversários a partir de uma leitura bastante moralista do livro sagrado dos cristãos.

Agora, mais uma vez, Silas Malafaia é flagrado em um caso envolvendo a apropriação indébita de recursos públicos para fins privados como mostram hoje os principais veículos da mídia corporativa. O caso envolve desvios de recursos obtidos com o pagamento de dívidas de royalties cobrados pela exploração mineral (Aqui! e Aqui!).

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Segundo informou a Agência Reutera, com base em informações fornecidas pela Polícia Federal,  Silas Malafaia é suspeito de ter usado contas correntes de uma instituição religiosa com a intenção de ocultar a origem ilícita dos valores.

Hábil usuário das redes sociais que é Silas Malafaia já está negando que tenha participado de qualquer ato de corrupção, pois apenas teria recebido uma “doação” de um dos envolvidos no esquema que está sendo agora desbaratado pela justiça. Resta saber se a famosa oratória de Malafaia vai ser suficiente para que ele se livre de problemas com a justiça.

É interessante lembrar que o ex-deputado Eduardo Cunha também foi acusado de ter usado  a igreja evangélica que frequentava , a Assembleia de Deus de Madureira, no Rio de Janeiro, para fazer a mesma coisa de que Silas Malafaia é agora acusado, mostrando que pode haver mais do que coincidência nesses casos (Aqui!).