Foto: Verbena Editora / Divulgação
*Por Moisés Mendes
O juiz Sergio Moro não reage com naturalidade quando se sente contrariado. Em outubro do ano passado, o juiz de Curitiba incomodou-se com um artigo que o criticava, publicado na Folha de São Paulo, e fez o que muita gente faz.
Escreveu para o jornal e reclamou. Mas fez também o que uma minoria insegura faz. Sugeriu que o autor do artigo fosse censurado pela Folha, por considerar que o texto era panfletário e tinha conteúdo partidário, entre outros defeitos.
O autor do texto acusara Moro de “intolerância moralista”. O artigo dizia: “A história tem muitos exemplos de justiceiros messiânicos como o juiz Sergio Moro e seus sequazes da Promotoria Pública”.
O juiz devolveu, na carta ao jornal: “Embora críticas a qualquer autoridade pública sejam bem-vindas e ainda que seja importante manter um ambiente pluralista, a publicação de opiniões panfletárias-partidárias e que veiculam somente preconceito e rancor, sem qualquer base factual, deveria ser evitada, ainda mais por jornais com a tradição e a história da Folha”. Evitada como?
O juiz não sabia (o que é grave para quem contesta quem o critica) que o autor do artigo ajudou e continua ajudando a Folha a fazer história. O ‘panfletário’ é integrante do conselho editorial do jornal e um de seus principais articulistas há quatro décadas.
Pois agora a ignorância do juiz Moro poderá ser sanada, porque seu alvo faz história pelo país e merece um livro que conte sua trajetória. Chega amanhã às livrarias Um Aprendiz de Quixote: Memórias de Arruá (Verbena Editora), com as memórias do físico, engenheiro e pensador Rogério Cerqueira Leite.
Cerqueira Leite, o ‘rancoroso’ que acionou o mecanismo autoritário do juiz de Curitiba, é um dos grandes brasileiros do século 20. É cientista respeitado, contribuiu para a resistência à ditadura, defende a democracia em sua plenitude, faz e reflete sobre ciência, universidade, ambiente e as questões essenciais do humanismo. Desde o começo das manobras da direita, fez campanha contra o golpe de agosto.
Moro deveria conhecê-lo, antes de atacá-lo por suas discordâncias em relação à seletividade da Lava-Jato. Não se trata de desinformação, mas de ignorância mesmo. Um juiz não pode dizer que desconhece Rogério Cerqueira Leite.
A Folha trouxe na segunda-feira um breve resumo dos feitos do cientista, destacando um ponto: ele é um dos raros oráculos brasileiros que junta ciência e humanidades, sempre fazendo uma abordagem sociológica e literária dos temas que o inspiram.
Cerqueira Leite criou, nos anos 80, uma das loucuras nacionais, o Laboratório de Luz Síncrotron, em Campinas, que atua em várias frentes da pesquisa científica e é considerado o similar brasileiro dos aceleradores de partículas da Europa.
Mas ele não é apenas um professor pardal metido em discussões sobre energia nuclear, combustíveis fosseis (que abomina) e fontes alternativas de energia, como professor da Universidade de Campinas.
É um provocador, um polemizador, um intelectual ativo no debate das grandes controvérsias. Como fez agora ao provocar Sergio Moro e obter como reposta uma sugestão de que deveria ser eliminado do quadro de colaboradores da Folha.
No artigo que contrariou o juiz, Cerqueira fez referência aos embates de ideias de tempos medievais e alertou Moro para o que aconteceu com Girolamo Savonarola, o padre que desafiou a Igreja e foi queimado vivo em Roma.
O cientista escreveu que, depois da caçada a Lula, o juiz poderia ser abandonado pelos que sustentam sua atuação na Lava-Jato: “Cuidado, Moro, o destino dos moralistas fanáticos é a fogueira. Só vai vosmecê sobreviver enquanto Lula e o PT estiverem vivos e atuantes”.
O juiz levou tão a sério a ameaça da fogueira que, na resposta à Folha, lamentou o fato de o cientista “chegar a sugerir atos de violência contra o ora magistrado”.
Cerqueira teve de escrever de novo à Folha, em carta à seção do leitor, para esclarecer e ironizar, num texto curto e brilhante. Eis um trecho: “O fogo a que me refiro é o fogo da história. Intelectos condicionados por princípios de intolerância não percebem a diferença entre metáforas e ações concretas”.
É como se estivesse falando com uma criança. Mas Sergio Moro, o concreto, deve encontrar tempo para ler o livro deste senhor de 85 anos. Quem sabe se arrependa do dia em que teve a ideia de que seria possível censurar o pensamento de um dos últimos sábios brasileiros.
Peço desculpas por tirar o prazer da surpresa, mas a própria Folha esclarece, ao destacar que Cerqueira Leite tem vocação para a encrenca, que o arruá do subtítulo do livro quer dizer arisco, bravio, indócil e brigão. Com quem um juiz previsível, cartesiano, esquemático e simplório foi se meter.
*Moisés Mendes | Jornalista, autor do livro Todos querem ser Mujica – Crônica da Crise (Diadorim Editora, 154 páginas).
FONTE: http://www.extraclasse.org.br/exclusivoweb/2017/03/o-sabio-que-sergio-moro-pretendia-censurar/
Que “o pau que bate em Chico não bate em Francisco” é uma verdade constrangedora para a Operação Lava Jato. Mas, em minha opinião, em se tratando de Brasil já é alguma coisa os resultado obtidos pela Lava Jato. Nunca se fez nada para tentar moralizar o país, talvez o “Aprendiz de Quixote” esteja insatisfeito com a esperança de um novo Brasil, que o começo das investigações “nunca antes feitas na história deste país” plantou nos corações de alguns brasileiro (me incluo entre estes). Moro pode ser o moralista fanático que queimará na fogueira ou o intolerante moralista e o autoritário… mas teve a coragem de tocar a lava jato. Torço para que o Lula e o PT do “Aprendiz de Quixote” queimem também na fogueira da história juntamente com o PMDB o PSDB, PP e demais facções criminosas tratadas como partidos políticos pela mídia (Folha, Globo, Estadão e demais porcarias…). Talvez “O Aprendiz de Quixote” acredite que o “seu” Lula tenha criado a maioria das universidades do Brasil, que “seu” Lula tenha ascendido grande parte dos pobres para a classe média, que “seu” PT tinha como objetivo a “pátria educadora” .
Marco Antônio, quem vai sobrar da sua fogueira? O Bolsonaro?
Não votaria em Bolsonaro, até porque se o senhor reparar ele nunca se manifesta sobre as questões importantes para o país. Sem falar que ele é da base (aliado) do Temer. Dois questionamentos Professor Marcos… Existe esquerda no Brasil? Podemos chamar um governo (ou dois) que nunca foi(ram) capaz(es) de propor a taxação progressiva de rendas e riquezas, a transferência paulatina da detenção dos meios de produção para as mãos dos trabalhadores ou a limitação dos ganhos do sistema financeiro de esquerdista(s)?
Ah, ok. Marco Antônio, um dos problemas que eu vejo em relação ao PT é considerá-lo de esquerda no sentido revolucionário, pois o partido abandonou essa perspectiva faz tempo, se algum dia já teve. Assim, suas questões me parece estar auto-explicadas a partir desse abandono.
E quem sobraria de sua fogueira Professor Marcos? O Luciano Huck?
Da minha fogueira, muito menos o Huck. Sobrariam figuras que nunca traíram os trabalhadores brasileiros. São poucos, mas existem.
Peço que o senhor me de de beber de sua fonte, pois não conheço (perdoe minha ignorância) nenhuma das figuras que o senhor menciona.
Olhe,apesar de ter críticas a eles, respeito muito o pessoal do PCB, do PSTU e do PSOL, mas também de movimentos sociais como MTST e do MST. É desses segmentos que estou falando.
Vou pesquisar. Obrigado por compartilhar Professor Marcos.
Uma boa polêmica. Mas por fim, endosso as palavras do Pedlowski e já que o Marco Antônio mostrou-se aberto ao debate e à pesquisa, também sugiro, muito amigavelmente, que pesquise sobre a carreira intelectual e os escritos jornalísticos do físico em questão. Penso que Cerqueira Leite, assim como Bautista Vidal, sempre foram independentes em relação ao PT. Se fosse para caracterizá-los, com o grave risco da rotulagem, eu diria que são democratas nacionalistas.
Para finalizar, o Marco Antônio foi a um ponto chave na vida política do batizado no Rio Jordão, Jaja Bobo, cuja cruzada de vida raivosa lembra exatamente tais passagens históricas.