Em sua resposta a Marcelo Tas, seja por medo ou desinformação, Marcelo Adnet acabou incorporando chavões de direita ao falar de Cuba e China
Assisti a parte da entrevista do genial Marcelo Adnet no “Roda Viva” levado ao ar no dia ontem pela Rede Cultura de São Paulo, e confesso que não me surpreendi com parte das suas respostas que considerei superficiais e desinformadas (ou, no mínimo mal informadas). A passagem que mostro abaixo, envolvendo uma resposta ao lamentável Marcelo Tas (já identificado como colaborador/informante da CIA) mostra bem isso.
Nunca estive em Cuba, mas estive na China por duas vezes. E posso afiançar que existem sim humoristas por lá, bem como artistas de todas as áreas que exercem o poder de criticar o sistema político, ainda que não sejam contra as vitórias inegáveis da sociedade chinesa após a revolução socialista de 1949. A questão é que esses não são divulgados por aqui, pois não interessa mostrar que existe qualquer tipo de liberdade de expressão nesses países.
Mas voltando a Cuba há que se dizer que o senso de humor ácido dos cubanos é famoso. Eu mesmo já presenciei uma situação em que um cônsul de Cuba foi achincalhado por seus compatriotas, usando expressões bem humoradas, por ter se atrasado a chegar para resolver seus problemas de visto. E quem já foi a Cuba me contou que o povo cubano é, como já foram um dia os brasileiros, extremamente ácido e não poupa o regime de críticas.
Assim, a ideia de que os cubanos são um povo trancafiado e calado, que Marcelo Adnet acabou incorporando em sua resposta, é um desserviço completo que ele realizou a uma discussão mais ampla sobre o tipo de sistema que vivemos no Brasil que, cada vez menos, pode ser chamado de democrático.
Um adendo que deveria merecer mais atenção do Marcelo Adnet é sobre a fulgurante música cubana que continua produzindo autores e intérpretes de inigualável talento. É só entrar em páginas do Facebook e congêneres para ver e ouvir música cubana feita atualmente com muita qualidade e, principalmente, irreverência. Se é assim com a música, por que inexistiria coisa semelhante no humor cubano? Essa noção de um povo cubano triste é aprendida, muito provavelmente, nos passeios por Miami e Orlando onde vivem os cubanos “alegres”.
Por isso, por mais que eu ache as performances de Marcelo Adnet geniais, só posso dizer que se ele quiser responder a provocações rasteiras como as oferecidas por Marcelo Tas no que se refere a países como Cuba e China, seria melhor que estudasse um pouco mais a realidade desses países. É que respondendo da forma que respondeu, ele não se mostrou medroso, como compactuou para manter uma visão estereotipada de países e sociedades que ele sequer conhece. Melhor então só ficar fazendo piadas com o Brasil.
Finalmente, essa entrevista mostra que a esquerda parlamentar comete um grave equívoco quando deixa personalidades como Marcelo Adnet e Felipe Neto ocupem posições de protagonistas no enfrentamento com as políticas ultraneoliberais do governo Bolsonaro. É que, a despeito de suas posições e manifestações aparentemente sinceras em prol de elementos democráticos em uma conjuntura particularmente adversa, os dois não possuem a capacidade (ou aparentemente sequer o desejo) de serem de esquerda, o que os inabilita como promotores das mudanças substantivas que o Brasil precisa urgentemente.
O Marcelo é rasteiro, se preparou para aquele momento . O Adnet estava com a cara pro vento.