Entidade alerta que a crise climática impacta direitos humanos, aprofunda desigualdades, e faz recomendações para os países e empresas
A crise do clima ameaça os direitos humanos em proporções nunca antes vistas. É esse o alerta que a Anistia Internacional faz com o lançamento do relatório “Parem de queimar nossos direitos” . O futuro de toda a humanidade está em grande risco, e o presente de milhões de pessoas já está ameaçado, com o aprofundamento de inúmeras desigualdades. A Anistia Internacional avalia que os esforços dos Estados para enfrentar as mudanças climáticas continuam muito abaixo do que é preciso para que a situação possa ser revertida. A maioria dos países industrializados continua sem controlar as emissões poluentes de modo satisfatório.
“As mudanças climáticas são uma crise de direitos humanos. De acordo com a normativa internacional dos direitos humanos, os Estados têm obrigações legais de enfrentar a crise do clima. Exigimos que o governo do Presidente Jair Bolsonaro e o Congresso Nacional ajam para atenuar os efeitos das mudanças climáticas sobre a população brasileira e implementem políticas públicas de conservação da natureza e proteção dos direitos humanos baseadas nas evidências científicas. As autoridades públicas no Brasil têm contribuído para que haja um desmonte da agenda ambiental, mas não há mais espaço para o negacionismo. A vida de brasileiros e brasileiras deve vir em primeiro lugar”, explica Jurema Werneck, diretora executiva da Anistia Internacional Brasil.
Pensar em respostas para a crise climática implica em dar centralidade aos direitos humanos – principalmente dos grupos mais impactados. O relatório destaca que as mulheres são mais afetadas, principalmente as que estão subjugadas a trabalhos que dependem mais dos recursos naturais, como indígenas, quilombolas, ribeirinhas e outras pertencentes às comunidades tradicionais. Esses povos estão intrinsecamente ligados ao ambiente natural, que os provê com sustento, moradia e remédios. As áreas onde vivem são frequentemente propensas a desastres climáticos e a expropriações e remoções forçadas, violam seus direitos humanos básicos.
“Neste relatório, a Anistia Internacional cobra dos governos e das empresas um compromisso com a superação da crise climática que ameaça o nosso futuro enquanto espécie – e que já ameaça o presente de muitos. Não existem atalhos para salvar a humanidade. É urgente que as pessoas que estão no poder cumpram com os compromissos assumidos e atuem para reverter essa crise climática, antes que seja tarde demais.”, avalia Jurema.
O relatório aponta que o nível de 1,1°C de aquecimento global acima dos níveis pré-industriais já causa impactos devastadores – com ondas de calor, incêndios florestais, tempestades tropicais e secas – que ameaçam direitos à água, aos alimentos, à moradia, à saúde, ao saneamento, ao trabalho, entre muitos outros. A Organização Mundial de Saúde já prevê que as mudanças climáticas devem provocar 250 mil mortes a mais, por ano, nos anos entre 2030 e 2050 – causadas por malária, desnutrição, diarreia e pelo estresse térmico. O Programa Mundial de Alimentação calcula um aumento de 20% na fome e na desnutrição até 2050.
Há um longo percurso para reduzir esse impacto. Manter o aquecimento global no limite de 1,5°C ainda é possível, muito embora a janela para essa possibilidade já esteja se fechando. Isto exige que as emissões de gás de efeito estufa sejam reduzidas, globalmente e até 2030, em 45% – em comparação com os níveis de 2010. Até 2050, a redução deve ser até o nível zero. No entanto, a poluição continua a crescer e atingiu um nível recorde em 2019. Segundo o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas, essa meta pouparia 420 milhões de pessoas de serem expostas ao calor extremo.
E mesmo ao pensar em meios alternativos, governos e empresa devem considerar as populações que serão impactadas por projetos de outros tipos de energia, que não os combustíveis fósseis. Os povos indígenas, quilombolas e as comunidades tradicionais precisam ter seu direito à consulta e ao consentimento livre, prévio e acesso à informação garantidos, quando da instalação de projetos que afetem seus territórios, como por exemplo, projetos de energia renovável, fazendas de cultivo de biocombustíveis e projetos de conservação que costumam ser empreendidos com violação aos direitos dos povos indígenas e das comunidades que vivem nesses locais.