A recente viagem do presidente eleito Luís Inácio Lula da Silva ao Egito, onde irá participar da COP-27, a bordo de um jatinho de propriedade de um grande empresário foi motivo para uma incontável quantidade de artigos e notas nos principais veículos da mídia brasileira. Pelo que entendi da reação da mídia corporativa, o uso de um jatinho privado seria uma espécie de prova de que Lula se desviou precocemente das boas práticas e se valeu de um amigo rico para evitar o uso de um avião de carreira.
Contraditoriamente a essa cobertura que aparentemente procura “chifre em cabeça de cavalo” (afinal há que se lembrar que Lula neste momento ainda não ocupa cargo público!), a cobertura dada pela mídia internacional vai no sentido de explicitar a situação de quase júbilo que a volta de Lula à presidência da república gerou em governantes, membros da sociedade civil e, inclusive, de membros da imprensa que fazem a cobertura de grandes eventos multilaterais. No caso da chegada de Lula à COP-27, importou pouco o veículo que o levou, e muito mais a volta do Brasil aos esforços multilaterais de mitigação dos efeitos das mudanças climáticas globais.
Essa discrepância de tratamento não apenas revela um padrão provinciano e paroquial da mídia brasileira ao retorno de Lula ao cargo de presidente, mas também a opção de o tratar por padrões de comportamento que jamais foram aplicados a Jair Bolsonaro. Como todos notaram, em quase quatro anos de governo e múltiplas peripécias com o dinheiro público em férias extravagantes, o presidente cessante fez praticamente o que bem lhe deu na telha, sem que houvesse o mesmo mínimo de cobrança que agora é precocemente aplicado a Lula.
E não se enganem a ponto de pensar que este é um momento passageiro, pois podemos esperar uma cobertura muito ajustada do mandato de Lula. É que os donos da mídia corporativa brasileira deram toda a liberdade para Jair Bolsonaro agir porque estavam lucrando com as políticas econômicas de Paulo Guedes. Em certo sentido, o tratamento com trejeitos de uma caçada que agora é dispensada a Lula antes de qualquer coisa revela uma opção de relacionamento com um governo que dificilmente será de esquerda, mas, tampouco, será tão de direita quanto o de Jair Bolsonaro.