Floresta Amazônica ‘entrará em colapso se Bolsonaro permanecer presidente’

Acadêmicos e ativistas brasileiros emitem alerta em meio a novo ataque às proteções ambientais

bolsonaro guardian

Os críticos temem que a Amazônia esteja sendo empurrada a um ponto sem volta com Jair Bolsonaro. Fotografia: Joédson Alves / EPA

Por Jonathan Watts para o “The Guardian”

O colapso da floresta amazônica é inevitável se Jair Bolsonaro permanecer presidente do Brasil, alertaram acadêmicos e ativistas ambientais em meio a um novo ataque do governo às proteções para a floresta.

Apesar das evidências de que o fogo, a seca e o desmatamento estão empurrando a Amazônia para um ponto sem volta, eles dizem que o líder de extrema direita está mais interessado em aplacar o poderoso lobby do agronegócio e explorar os mercados globais que recompensam o comportamento destrutivo.

O ataque às salvaguardas florestais acelerou. Na quarta-feira, a Câmara dos Deputados deveria votar uma legislação que recompensaria os grileiros legalizando a posse de propriedades que haviam sido ilegalmente invadidas e desmatadas antes de 2014.

No dia anterior, o governo transferiu a responsabilidade pelo monitoramento por satélite de incêndios florestais do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, uma organização cientificamente robusta que realizou a tarefa por décadas. O controle foi entregue ao Instituto Nacional de Meteorologia, que está sob a influência do Ministério da Agricultura e do setor agropecuário.

Nos últimos meses, o Congresso também diluiu os padrões para avaliações de impacto ambiental e uma comissão aprovou um projeto de lei – PL 490 – que foi descrito como o maior atentado aos direitos indígenas desde o lançamento da Constituição brasileira em 1988.

Todas essas medidas perfuram a estrutura de proteção da Amazônia e vão contra os pareceres científicos e os problemas no terreno. O Brasil está passando por uma seca crescente, que fez com que o fluxo de água em algumas usinas hidrelétricas caísse para mínimos de 91 anos. Esta é uma causa e um efeito do desmatamento.

Desde que Bolsonaro assumiu o poder em 2019, o desmatamento e os incêndios na Amazônia atingiram seus níveis mais altos em mais de uma década. Os últimos três meses mantiveram essa tendência, embora um pouco atrás dos picos do ano passado. Dadas as condições de seca em muitas partes da Amazônia, há temores de que o pico usual da temporada de incêndios em julho e agosto possa ser pior que o normal.

Os cientistas suspeitam que a floresta tropical pode estar entrando em uma série de ciclos viciosos. Em nível local, o desmatamento e as queimadas levaram a secas prolongadas e temperaturas mais altas, o que, por sua vez, enfraquece a resiliência do ecossistema e leva a mais incêndios.

Em nível regional, isso pode intensificar a seca porque a respiração da floresta tropical normalmente atua como uma bomba para impulsionar os sistemas de clima úmido em uma ampla área do Brasil, América do Sul e Atlântico. Quando a floresta enfraquece, essa bomba é menos eficaz.

Também há repercussões globais porque o desmatamento está transformando a região amazônica de amiga do clima em inimiga do clima. Um estudo publicado na Nature revela que a queima da floresta agora produz cerca de três vezes mais CO2 do que a vegetação remanescente é capaz de absorver. Isso acelera o aquecimento global.

As forças do mercado global são parcialmente responsáveis. O desmatamento tende a aumentar quando os preços da soja, da carne bovina e do ouro estão altos. Nenhum governo de qualquer tipo conseguiu parar completamente o desmatamento nas últimas quatro décadas. Mas as políticas governamentais fazem a diferença.

O desmatamento na Amazônia reduziu 80% entre 2004 e 2012 sob a administração do Partido dos Trabalhadores de Luiz Inácio Lula da Silva. Bolsonaro desmantelou ou desacreditou continuamente os mecanismos que conseguiram isso – monitoramento por satélite, pessoal no local e legislação para punir os infratores e demarcar terras indígenas e áreas de conservação.

“A principal coisa que este governo fez foi minar a capacidade do estado de enfrentar o desmatamento ilegal”, disse Marcio Astrini, secretário-executivo do Observatório Brasileiro do Clima, uma rede de 50 organizações da sociedade civil.

Já no Congresso, Bolsonaro e o lobby do agronegócio “ruralista” colocaram mais apoiadores em posições-chave: Arthur Lira como líder do Congresso, Carla Zambelli como presidente da Comissão de Meio Ambiente da Câmara e Bia Kicis como presidente da Comissão de Justiça. Esses políticos permitiram que a agenda dos ruralistas avançasse de forma mais agressiva.

“O governo brasileiro está fazendo exatamente o contrário do que precisa ser feito. Está estimulando ativamente o desmatamento por meio de suas políticas ”, disse Erika Berenguer, especialista em mudanças no uso da terra na Amazônia nas Universidades de Lancaster e Oxford. “Até recentemente, isso acontecia por meio de decretos e mudanças na política ministerial que cortavam orçamentos para o combate ao desmatamento. Agora, eles assumiram papéis mais importantes no Congresso, por isso estamos vendo projetos de lei ainda mais perigosos sendo aprovados ”.

Esta é uma preocupação global. O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, e o presidente da França, Emmanuel Macron, alertaram sobre os perigos representados pelo declínio da floresta tropical. Supermercados e organizações financeiras no Reino Unido, Noruega, Alemanha, França e Austrália ameaçaram boicotar os produtos brasileiros, a menos que as cadeias de abastecimento possam ser garantidas sem desmatamento.

Na quarta-feira, 40 empresas, incluindo Islândia, Waitrose, Lidl, Tesco e Sainsbury’s emitiram uma carta aberta alertando que futuras erosões da legislação ambiental e dos direitos indígenas as forçariam a reconsiderar o uso de commodities agrícolas brasileiras. “Gostaríamos de reiterar que consideramos a Amazônia uma parte vital do sistema terrestre, essencial para a segurança do nosso planeta, além de ser uma parte crítica de um futuro próspero para os brasileiros e toda a sociedade”, disseram. Grupos verdes disseram que agora esperam que essas empresas coloquem suas ameaças em prática.

Entre muitos consumidores, o Brasil é visto como uma marca tóxica e a Bolsonaro parece cada vez mais isolada no cenário mundial. Mas essa pressão internacional teve pouco impacto. No mês passado, Bolsonaro demitiu seu ministro do meio ambiente, Ricardo Salles, após uma denúncia da embaixada dos Estados Unidos sobre seu suposto envolvimento no contrabando ilegal de madeira. Mas Salles já havia destruído os órgãos de fiscalização e fiscalização florestal, e o verdadeiro poder por trás dele – a ministra da Agricultura, Tereza Cristina Dias – permanece no local.

Isso ocorre em parte porque os preços das commodities permanecem altos e a demanda é forte, especialmente na China, onde o governo coloca a aquisição de recursos acima da ética ambiental e a pressão da mídia é limitada por censura estrita. A China é o maior mercado do Brasil por uma grande margem.

Mas o principal motivo é a ideologia nacionalista do presidente. Segundo Astrini, Bolsonaro está tão exclusivamente focado na política doméstica que é indiferente à reputação internacional ou aos mercados globais. “Ele é o primeiro presidente brasileiro que tem uma agenda aberta de destruir proteções ambientais para ganhos políticos. Ele não se preocupa com o país, apenas com a reeleição. É tudo uma questão de base eleitoral ”, diz Astrini.

Em uma nota mais positiva, ele vê o Bolsonaro como um catalisador para a mudança. Desde que ele assumiu o poder, a floresta amazônica mudou para o centro do debate político. Vários candidatos nas eleições presidenciais do próximo ano agora têm compromissos de desmatamento zero em seus manifestos.

“Até Lula está dizendo que o desmatamento na Amazônia não pode mais ser sustentado por nenhum governo brasileiro. Ele nunca disse isso antes ”, disse Astrini. “Agora está claro que uma solução para a Amazônia só será possível se mudarmos de governo. Não há esperança se Bolsonaro for reeleito presidente. É a Amazônia ou o Bolsonaro. Não há espaço para ambos. ”

fecho

Este texto foi escrito originalmente em inglês e publicado pelo jornal “The Guardian” [Aqui!].

Estoque pesqueiro de lagosta está abaixo dos 18% de sua capacidade máxima

Setor pesqueiro e Oceana recomendam adoção de limites de captura para proteção da espécie e garantir futuro da pescaria

lagosta

Estudo inédito publicado pela Oceana revela a grave situação de um dos recursos pesqueiros mais importantes das regiões Norte e Nordeste do Brasil: a lagosta-vermelha (Panulirus argus), que movimenta anualmente mais de 50 milhões de dólares em exportações. De acordo com o relatório, o estoque da espécie está abaixo dos 18% de sua capacidade máxima, podendo comprometer o futuro da pescaria se não houver uma mudança no atual padrão de pesca.

“Se continuarmos nesse ritmo, a pescaria da lagosta não demorará muito para entrar em colapso”, alertou o diretor-geral da Oceana, o oceanólogo Ademilson Zamboni. De acordo com o levantamento, a pesca hoje depende de indivíduos jovens, já que a pressão pesqueira é tão grande e as lagostas não conseguem crescer. “Para recuperar a estrutura etária da população, é fundamental o estabelecimento de limites de captura, o que pode resultar, inclusive, em melhores rendimentos da pescaria”, explicou o oceanólogo.

O resultado da pesquisa foi apresentado pelo diretor científico da Oceana, Martin Dias, nessa segunda-feira (24/8), em webinar com a participação dos pesquisadores Paul Kinas, José Augusto Aragão e Rodrigo Sant’Ana, responsáveis pelo desenvolvimento do estudo. O debate contou com a presença do diretor do Departamento de Registro e Monitoramento da Aquicultura e Pesca da Secretaria de Aquicultura e Pesca do Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento (SAP/MAPA), Carlos Eduardo Villaça.

“O estudo da Oceana só vem corroborar a necessidade de medidas urgentes na gestão da pesca da lagosta”, disse o diretor da SAP. “O estabelecimento de limites de captura é uma tendência em todo o mundo na gestão de várias espécies. Aqui no Brasil temos a experiência bem-sucedida na pesca da tainha e certamente na pesca lagosta não será diferente”, comentou Villaça.

Lagosta-Vermelha

Embora ocorra desde o Espírito Santo até o Amapá, há uma concentração da pesca da lagosta no Ceará, onde estão 62% das três mil embarcações registradas para a pescaria. A indústria do pescado gera mais de 250 mil postos de trabalho no estado, entre diretos e indiretos, segundo o Sindicato das Indústrias de Frio e Pesca do Ceará (Sindfrios), sendo um importante vetor da economia. 

Mais de 90% da produção brasileira de lagosta é destinada à exportação, tendo como principais destinos os Estados Unidos, China e Austrália, cenário comercial atualmente comprometido devido à pandemia pelo novo coronavírus.

A lagosta-vermelha apresenta um ciclo vital complexo, com desova parcelada, mais intensa ao final do verão e outono. Aos dois anos, ocorre a migração dos juvenis para regiões mais profundas do mar, com início da atividade reprodutiva por volta dos três a quatro anos. As fêmeas apresentam tamanho médio de primeira maturação estimada em 20,5 centímetros de comprimento total, fecundidade elevada e longevidade de cerca de 18 anos.

Os estudos de avaliação de estoque são elaborados a partir de modelos matemáticos e outras informações científicas disponíveis. Um dos estudos realizados pela Oceana calcula o tamanho da população, como ela cresce e morre naturalmente e, especialmente, como essa população responde ao impacto causado pela pesca. Também é calculado o quanto é possível pescar sem comprometer a capacidade biológica da população a longo prazo.

Na avaliação de estoque da lagosta-vermelha foram consideradas importantes variáveis para a gestão, entre as quais a mortalidade por pesca e os níveis de biomassa mais recentes. “A condição do estoque de lagosta-vermelha é de sobrepescado, que se refere à biomassa relativamente menor que o necessário para manutenção do estoque”, destacou o diretor científico da Oceana, Martin Dias. “Já a atividade está em sobrepesca, que é a taxa de remoção por pesca segue sendo maior do que o estoque pode suportar”, explicou o diretor.

Em relação ao período de defeso, que terá início em 1º de dezembro e terminará em 31 de maio de 2021, a Oceana avalia que a manutenção dos seis meses é fundamental para a conservação da espécie. “A redução desse período só deve ser considerada quando medidas alternativas forem identificadas e efetivamente implementadas, e mesmo assim o mais provável frente ao cenário crítico é que os limites de captura sejam uma medida que complemente o defeso”, alertou Martin Dias.

Limites de Captura

A elaboração da avaliação de estoque da lagosta-vermelha faz parte da campanha iniciada em 2019 pela Oceana com o objetivo de modernizar a gestão dessa pescaria, protegendo a espécie e garantindo o futuro da atividade. O modelo seguido já foi aplicado com sucesso na pesca da tainha – em 2018, a Oceana divulgou a avaliação de estoque atualizada da tainha e, a partir dela, propôs um limite de captura para a safra daquele ano, que foi discutida e adotada pelo governo federal.

A medida consiste em determinar a quantidade máxima para captura de uma espécie a partir de avaliações de estoque, que levam em conta, sobretudo, a produtividade dos recursos pesqueiros. Com isso, busca-se o equilíbrio entre o que a pesca retira do ambiente e a capacidade natural de regeneração dos estoques. O sistema tem se mostrado eficiente em todo o mundo.Apoiada pela Oceana, a proposta foi debatida e defendida pelo setor industrial na última reunião do extinto Comitê Permanente de Gestão da Pesca da Lagosta, em junho de 2019.

Mas também era importante ouvir os pescadores artesanais – o que foi feito ao longo de quatro workshops no Nordeste. Após esses debates as lideranças da pesca também recomendaram à Secretaria de Aquicultura e Pesca (SAP) a adoção de limites para a captura da lagosta como forma de garantir o futuro da pescaria no país.

Pesquisadores alertam para o colapso de grandes ecossistemas

Grandes ecossistemas como a Amazônia são particularmente vulneráveis, alertam pesquisadores britânicos. Você pode entrar em colapso em pouco tempo. No entanto, os colegas têm dúvidas sobre os detalhes do estudo.

The Wider Image: Brazil's Amazon guardiansTerras agrícolas brasileiras na região amazônica: possíveis mudanças rápidas nos ecossistemas.  UESLEI MARCELINO / REUTERS

A dimensão da região amazônica é difícil de entender. Sua área é significativamente maior que a da União Européia – e, no entanto, os pesquisadores agora alertam que até ecossistemas desse tamanho podem entrar em colapso dentro de algumas décadas. Na revista Nature Communications , um grupo de especialistas liderado por John Dearing, da Universidade de Southampton, na Grã-Bretanha, até argumenta que grandes ecossistemas em particular são particularmente vulneráveis.

Sabe-se que áreas sob estresse devido a fatores externos podem mudar rapidamente, escrevem os pesquisadores. A composição das espécies nos lagos pode tombar, os recifes de coral podem desaparecer e se tornar desertos, as florestas tropicais ricas em espécies podem se tornar paisagens de savanas. Neste último caso, o desmatamento em excesso seria responsável por uma mudança no padrão das chuvas e, portanto, pelo ressecamento subsequente. Uma floresta tropical sem chuva não vai bem por muito tempo.

É surpreendente como os períodos de tempo que os pesquisadores desejam calcular para a transformação de áreas tão grandes. Segundo suas análises estatísticas, os 5,5 milhões de quilômetros quadrados da Amazônia podem entrar em colapso em cerca de 50 anos e os aproximadamente 20.000 quilômetros quadrados de recifes de coral no Caribe em apenas 15 anos.

Por seu trabalho, os pesquisadores analisaram estudos de um total de 42 ecossistemas e suas mudanças – o colapso dos estoques de peixes da Terra Nova, o desbotamento dos recifes de coral da Jamaica e a desertificação em antigas áreas agrícolas do Níger.

O aspecto especial do maior dos ecossistemas considerados é que eles consistem em diferentes subsistemas, de acordo com a equipe. Antes de tudo, isso aumentou a resiliência do sistema geral quando estressado. Porém, se um certo limite da carga era excedido, a modularidade trazia problemas adicionais e garantia de um colapso mais rápido.

“Temos que agir rapidamente”

“As mensagens aqui são claras. Precisamos nos preparar para as mudanças nos ecossistemas do nosso planeta que estão acontecendo mais rapidamente do que pensávamos”, diz o pesquisador Dearing. Os políticos teriam menos tempo para tomar as decisões corretas. Só porque os ecossistemas existem há milhares de anos não significa que eles não possam desaparecer dentro de décadas.

Alguns pesquisadores que não participaram do estudo apoiam os resultados. “Acho que a combinação de teoria, modelagem e observação é particularmente convincente neste artigo”, disse Georgina Mace, da University College London, no jornal Guardian.  A sua colega brasileira Ima Vieira, do Museu Emílio Goeldi, em Belém, fez comentários semelhantes. O trabalho é “muito importante”. No caso do Brasil, isso significa, entre outras coisas, que grandes multas teriam que ser impostas às empresas com “cadeias sujas de suprimentos” para proteger a Amazônia e que o cumprimento das leis de crimes ambientais existentes deve ser fortalecido. “E nós temos que agir rapidamente”.

No entanto, outros criticaram os detalhes metodológicos do estudo. Erika Berenguer, do “Guardian”, que trabalha nas universidades britânicas de Oxford e Lancaster, reclamou que a equipe baseava sua análise demais em avaliações de lagos e oceanos. Isso limita o significado de áreas de floresta tropical como a Amazônia. “Embora não haja dúvida de que a Amazônia está em grande perigo e de que provavelmente exista um ponto de inflexão, essas afirmações exageradas não ajudam a ciência ou a política”, disse Berenguer.

_____________________________________

Este artigo foi originalmente publicado em alemão no Caderno de Ciência da revista Spiegel [Aqui!].

Mudança de paradigma – o colapso de populações naturais de seres vivos está minando o funcionamento da biosfera

 Resultado de imagem para biosphere and collapse of natural populations

Por Foster Brown*

Paradigmas[1] são ideias básicas que usamos para construir a nossa visão do mundo. Em sua essência, eles servem como simplificações que nós humanos aplicamos para lidar com a vida.   Um paradigma reinante ainda em algumas mentes é que a Natureza é bonita, mas dispensável.  Precisamos fazê-la nossa servente ou eliminá-la se ficar inconveniente. A Amazônia como fronteira para ser conquistada, faz parte deste paradigma.  Aliás, este paradigma tem servido a humanidade para a grande parte da sua história, por bem e por mal. 

A ciência fez a sua parte neste paradigma de dominação via a geração de conhecimento que foi usado para controlar a Natureza. Mas ao mesmo tempo, a ciência revelou que a separação entre humanos e a Natureza é artificial.

A ligação começa com a observação que o oxigênio molecular, que faz um quinto da nossa atmosfera, é basicamente ausente nos outros planetas do nosso sistema solar. O oxigênio é um produto da Natureza ou, usando um termo mais atual, da biosfera[2] – o conjunto de ecossistemas que fazem a vida no nosso planeta.

Ele é tão fundamental que esquecemos do seu papel, que pode ser revelado via a pergunta – quanto tempo se pode viver sem respirar?  O acúmulo de oxigênio e o regulamento da sua concentração e outros gases, como gás carbônico, metano e nitrogênio durante dezenas a centenas de milhões de anos foi um resultado de processos mediados pela biosfera, especialmente pelas plantas, bactérias e animais, principalmente os invertebrados.   

Mas a ciência tem suas limitações e no momento, temos dificuldade de entender exatamente como a biosfera participa nestes ciclos que mantêm condições propicias para a vida no planeta. 

Nem sempre as condições foram tão propicias e no registro geológico podemos encontrar cinco períodos de grandes extinções nos últimos quatro centos e quarenta milhões de anos, começando com o Ordoviciano-Siluriano, depois o  Devoniano  (365 milhões de anos atrás), Permiano-Triássico (250 milhões de anos atrás) , Triássico-Jurássico (210 milhões de anos atrás) e Cretáceo-Terciário (65.5 milhões de anos atrás).[3]    Mas recentemente embarcamos numa sexta extinção.

Esta sexta extinção tem algumas diferenças.  Primeiro, somos nós que estamos causando estas extinções.  Segundo, em comparação com a maioria das outras extinções, a velocidade é extremamente rápida. Terceiro, as ações nos próximos anos e décadas vão influenciar decisivamente a severidade desta sexta extinção.

Mas é importante ressaltar que o jogo é muito mais do que a extinção de uma ou outra espécie, ele envolve a inoperância que a redução e eventual extinção de animais e plantas causam nos ciclos que mantêm a vida.  

Além da destruição de habitats como causa de extinções, as mudanças climáticas estão alterando ambientes rapidamente.  Alguns céticos[4] finalmente convencidos que as mudanças são reais,  agora falam de quem ganha e quem perde com as mudanças, como se fosse um jogo de futebol. Só que num jogo de futebol, 50% ganha e 50% perde e não 99+% perdendo e menos de um por cento ganhando.

Outros acham que evolução vai resolver as extinções com a criação de novas espécies.[5]  Mas estas novas espécies não vão repovoar áreas empobrecidas durante a minha vida nem na vida do meus bis-bis-bis netos. Sim, algumas bactérias vão ganhar, como as que produzem metano na região de tundra que já está aquecendo extremamente rápido e podem gerar uma bomba de metano, acelerando mais ainda o aquecimento global[6].  

Neste contexto, li dois artigos recentemente que aumentaram mais ainda a minha preocupação[7].  Na Alemanha em várias áreas de preservação foram levantadas as concentrações de insetos voadores desde 1986.  O estudo encontrou um decréscimo de mais de 75% na biomassa deles em 27 anos[8]. Seria melhor dizer que foi um colapso nas populações. Para os que só sabe que mosquitos de dengue e zika são insetos, uma queda destes parece legal, mas insetos fazem funcionar muitos processos em ecossistemas, desde polinização de plantas até a reciclagem da vegetação e da bosta de animais e formam a base da cadeia trófica. Podemos achar ou esperar que isto é um fenômeno restrito a Alemanha, mas as indicações são que não.   

Num outro estudo[9] usando animais conhecidos como vertebrados (os peixes, anfíbios, répteis, aves e mamíferos), os autores usaram a frase “aniquilação biológica” no título para descrever a tendência atual. Eles encontraram colapsos de populações, especialmente de mamíferos, causados por uma variedade de pressões humanas e estimaram que já houve uma queda de 50% nos números de indivíduos de vertebrados com uma tendência de acelerar a queda.  

Se as populações, sejam de animais, microrganismos ou plantas, estão em colapso, também estão em colapso os serviços que os ecossistemas fornecem.  Um caso serve como exemplo. Quem bebe água que vem da ETA II em Rio Branco, estaria bebendo o xixi de Xapuri, Brasiléia, Epitaciolândia e Cobija, se não fosse o serviço ambiental oriundo do ecossistema aquático do Rio Acre que purifica as águas de esgoto lançados pelas cidades a montante. Mas a capacidade deste ecossistema não é infinita e tem seus limites.

O Papa Francisco capturou a essência do novo paradigma e repetiu cinco vezes na sua carta Encíclica Laudato Si:  “Tudo está interligado. ” A continuação de colapsos de populações de insetos, vertebrados, até plantas como árvores emergentes nas florestas da Amazônia, vai gerar impactos na sociedade humana.  O futuro da biosfera está entrelaçado com o nosso. Afinal somos todos interligados. 

igreja

Pintura na frente da diocese da Igreja Católica de Iberia, Madre de Dios, Peru. 26nov17.

Referencias discutidas: Hallmann et al. (2017) PLoS ONE 12 (10): e0185809. https:// doi.org/ 10.1371/ journal. pone.0185809

Ceballos et al. (2017) PNAS. E6089–96. https:// doi.org/ 10.1073/ pnas.1704949114.

*Foster Brown é pesquisador do Centro de Pesquisa de Woods Hole, Docente do Curso de Mestrado em Ecologia e Manejo de Recursos Naturais (MEMRN) e do Curso de Mestrado em Ciências Florestais (CiFlor) da UFAC. Cientista do Programa de Grande Escala Biosfera Atmosfera na Amazônia (LBA), do INCT Servamb e do Grupo de Gestão de Riscos de Desastres do Parque Zoobotânico (PZ) da UFAC. Membro do Consórcio Madre de Dios e da Comissão Estadual de Gestão de Riscos Ambientais do Acre (CEGdRA). Coordenador do Projeto MAP- Resiliência


[1] https://www.significados.com.br/paradigma/; https://en.wikipedia.org/wiki/Paradigm

[2] https://en.wikipedia.org/wiki/Biosphere

[3] https://www.amnh.org/exhibitions/dinosaurs-ancient-fossils-new-discoveries/extinction/mass-extinction/; https://supertela.net/curiosidades/astronomia/as-5-grandes-extincoes-em-massa-que-ja-ocorreram-na-terra/

 [4] https://www.bostonglobe.com/opinion/2017/12/06/fewer-deaths-more-greenery-and-other-global-warming-benefits/DgYdJLE1zv4zAZ84BPMOvO/story.html

[5] https://www.washingtonpost.com/outlook/we-dont-need-to-save-endangered-species-extinction-is-part-of-evolution/2017/11/21/57fc5658-cdb4-11e7-a1a3-0d1e45a6de3d_story.html

[6] McCalley, Carmody K., Ben J. Woodcroft, Suzanne B. Hodgkins, Richard A. Wehr, Eun-Hae Kim, Rhiannon Mondav, Patrick M. Crill, et al. “Methane Dynamics Regulated by Microbial Community Response to Permafrost Thaw.” Nature 514 (October 22, 2014): 478.

[7] https://www.nytimes.com/2017/10/29/opinion/insect-armageddon-ecosystem-.html?_r=0.

[8] : Hallmann CA, Sorg M, Jongejans E, Siepel H, Hofland N, Schwan H, et al. (2017) More than 75 percent decline over 27 years in total flying insect biomass in protected areas. PLoS ONE 12 (10): e0185809. https://doi.org/10.1371/journal. pone.0185809

[9] Ceballos, Gerardo, Paul R. Ehrlich, and Rodolfo Dirzo. “Biological Annihilation via the Ongoing Sixth Mass Extinction Signaled by Vertebrate Population Losses and Declines.” Proceedings of the National Academy of Sciences 114, no. 30 (July 25, 2017): E6089–96. https://doi.org/10.1073/pnas.1704949114.

 Artigo publicado no Jornal A Gazeta, Rio Branco, Acre, Brasil.  P. C1-2. 12dez17.   http://agazetadoacre.com/mudanca-de-paradigma-o-colapso-de-populacoes-naturais-de-seres-vivos-esta-minando-o-funcionamento-da-biosfera/

 

Para evitar colapso, (des) governo do RJ volta à Brasília atrás de socorro

colapso-financiero-750x563

Fontes de dentro da estrutura superior do (des) governo Pezão/Donrlles me passaram a informação de que nos últimos dias têm sido intensificadas às visitas a Brasília para que se faça um novo desembolso que evite o colapso financeiro do Rio de Janeiro. A pedida estaria na ordem de mais  R$ 2 bilhões em recursos que seriam utilizados para “fechar o ano”.

A razão para essa volta aos corredores de Brasília é óbvia. Abaladas pelo peso da dívida e pela farra das generosidades fiscais promovidas pelo (des) governo do PMDB, o tesouro fluminense está em processo de liquefação exponencial. Além disso, a condição cambaleante de muitas candidaturas do PMDB fluminense torna fundamental que a virtual falência do Rio de Janeiro seja impedida.

Para complicar a situação, vários outros estados têm pressionado o governo de facto de Michel Temer a fazer entregas semelhantes, pois o que está acontecendo no Rio de Janeiro não é um caso singular.  Assim, se passar mais dinheiro para o (des) governo Pezão/Dornelles, Michel Temer vai ser ainda mais pressionado a fazer o mesmo em outras partes do Brasil.

O interessante é que nem com a proximidade real de uma falência inédita, o (des) governo do Rio de Janeiro parece querer tocar nas causas essenciais da crise que aí está. Se estivéssemos num estado regido por governantes minimamente sérios, a farra das generosidades fiscais já estaria suspensa e uma moratória da dívida pública já teria sido declarada.

Mas como não estamos,  o que se assiste é apenas a repetição da fórmula de de pedir dinheiro insuficiente para apenas chegar no mês seguinte, o que equivale simplesmente a jogar óleo em chapa quente. É que além de não resolver o problema, ainda se aprofunda o tamanho da dívida.

Acredite se quiser: operação que quebrou RioPrevidência foi feita para prépagar dívidas com bancos estatais

vaca-brejo_1

A matéria abaixo explica  os mecanismos e os envolvidos no Rio Oil Finance Trust. Além de rótulo de “exótico” que já foi atribuída à criação desse fundo no estado de Delaware, os jornalistas Talita Moreira e Vinicius Pinheiro, do Valor Econômico, atribuíram três adjetivos mais simpáticos à engenharia financeira por detrás da criação do Rio Oil Finance Trust: engenhosa, inovadora e sofisticada. Há que se explicar, em favor dos dois jornalistas, que a matéria foi escrita em Maio de 2015,  cinco meses antes do Rio Oil Finance Trust entrar em colapso por causa do recolhimento dos royalties do petróleo.

Aos interessados pelo que está acontecendo com o RioPrevidência a leitura dessa matéria é fundamental. É que com ela aprendemos que o Rio Oil Finance Trust foi criado para “prépagar” dívidas que o RioPrevidência tinha com o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal. Isso mesmo prépagar!

Outro detalhe pitoresco é que os agenciadores desse negócio foram o próprio Banco do Brasil, credor do RioPrevidência, e o banco francês BNP Paribas. Essa conjunção de um banco estatal brasileiro e o maior banco francês deve ser mais das engenhosidades a que se referem Talita Moreira e Vinicius Pinheiro.

Para mim, o mais estranho é que, em nome de se prépagar dívidas, o RioPrevidência alçou voo numa iniciativa que agora se mostrou completamente desastrosa para os que contribuem e para os que dependem das pensões e aposentadorias que estas contribuições geram. Em tempo, não consegui encontrar nenhuma evidência na Comissão Valores Mobiliários (CVM) ou Superintendência de Previdência Complementar (Previc) de que essa operação “engenhosa”, “inovadora” e “sofisticada” passou pelo crivo destes dois órgãos de controle. O que torna tudo isso muito “exótico”.

Emissão com lastro em royalties inova

Por Por Talita Moreira e Vinicius Pinheiro

Uma engenhosa estrutura lastreada na antecipação de recebíveis do petróleo garantiu ao Rioprevidência, instituto de previdência dos servidores do Estado do Rio de Janeiro, a captação de US$ 3,1 bilhões no ano passado.

O volume, levantado em duas operações, fez do Rioprevidência o segundo maior emissor de bônus do país no ano passado. O fundo de pensão ficou atrás apenas da Petrobras, historicamente a empresa mais atuante no mercado internacional de renda fixa. 

A operação do Rioprevidência foi a mais sofisticada de 2014, tanto por marcar uma inédita oferta de bônus de um instituto de previdência quanto pelo desenho complexo.  Na primeira oferta de bônus, em junho, o fundo de pensão captou US$ 2 bilhões em bônus com prazo de dez anos e cupom de 6,25% ao ano. Em novembro, voltou à carga e colocou US$ 1,1 bilhão em títulos com vencimento em 2027 e taxa de 6,75% anuais. Foi a última captação de um emissor brasileiro antes que o mercado fechasse para nomes do país no fim do ano passado.

As captações foram feitas com o objetivo de tomar recursos para que o Rioprevidência pudesse prépagar  dívidas com o Banco do Brasil (BB) e a Caixa Econômica Federal. Essas dívidas, transformadas em debêntures que foram encarteiradas pelas duas instituições, somavam R$ 3 bilhões em junho de 2014. A ideia de fazer uma captação no exterior, em vez do mercado local,  foi adotada para evitar um descasamento cambial.

Para colocar a operação em pé, as emissões de bônus foram feitas pela Rio Finance Oil Trust, sociedade de propósito específico com sede no Estado americano de Delaware. O Rioprevidência cedeu a essa empresa os fluxos de recebíveis a que tem direito dos royalties do petróleo.  Com lastro na antecipação dos royalties do petróleo usados para financiar o
déficit da fundação, a Rio Finance emitiu os bônus distribuídos no mercado e também as debêntures que ficaram com os bancos credores. O BB coordenou a operação junto com o BNP Paribas.

A estrutura, embora complexa, foi bem recebida pelos investidores e os papéis chegaram a ser negociados a mais de 100% do valor de face. Com a queda do petróleo e a crise da Petrobras, os títulos recuaram a 83,5% em março, mas no fim de maio já haviam se recuperado.

A avaliação sobre a emissão de títulos vinculados à commodity, contudo, não é unânime. “Foi uma operação que veio num momento ruim e atrapalhou o mercado”, afirma um executivo de banco de investimento que não atuou na operação. 

BB e BNP Paribas, entretanto, defendem o modelo. Segundo Cleber Aguiar,  da diretoria de mercado de capitais e investimentos do Banco do Brasil, a estrutura previa uma blindagem dos títulos em relação à movimentação da commodity. “Nenhum covenant foi acionado, mesmo no pior momento das cotações do petróleo”, diz Aguiar, ao avaliar que o modelo pode ser seguido por outros Estados.

Rodrigo Fittipaldi, diretor de mercado de capitais do BNP Paribas, afirma que a experiência do banco em securitização de ativos e no setor de petróleo no mercado internacional ajudou no desenho da operação e deu conforto aos investidores.

A atuação na oferta da Rioprevidência fez parte da estratégia do BNP de concentrar a participação em grandes operações. O banco francês foi o 7º colocado em volume de emissões de bônus no ano passado e quinto na classificação geral, que inclui empréstimos.

FONTE: http://www.valor.com.br/financas/4070042/emissao-com-lastro-em-royalties-inova

OGX: de “campeã nacional” do neodesenvolvimentismo lulista ao fundo do poço

dilmanoaçu

A matéria abaixo, produzida pelo jornal Valor Econômico traz ainda mais notícias para os acionistas, principalmente os minoritários, da OG(X), a petroleira que causou o colapso do império do ex-bilionário Eike Batista. 

A leitura da matéria não deixa dúvidas sobre o final melancólico para a qual se dirige uma empresa que mereceu todos os carinhos e suporte financeiro por parte dos governos de Lula e Dilma Rousseff. Aliás, se Eike Batista tem alguém para culpar por o destino inglório da OGX, basta se olhar no espelho.

OGX

Finalmente, não custa nada lembrar que da visita que a presidente Dilma Rousseff fez ao Porto do Açu, onde foi feita uma imensa cerimônia com direito a todos os gestos de grandeza. É que se olharmos os cenários otimistas pintados hoje pela atual controladora do porto, veremos que apenas otimismo e promessas de futuro róseo não bastam para fazer do empreendimento algo mais do que uma promessa.

Rádio CBN faz matéria esclarecedora sobre a situação do Porto do Açu

Colapso de Eike Batista afeta obras do Porto do Açu

O empreendimento projetava, quando foi lançado há oito anos, ganhos aos comerciantes e trabalhadores que foram para a região de São João da Barra (RJ).

collage2_586x422 (1)

Ouça reportagem 

FONTE: http://cbn.globoradio.globo.com/rio-de-janeiro/2015/04/18/COLAPSO-DE-EIKE-BATISTA-AFETA-OBRAS-DO-PORTO-DO-ACU.htm#ixzz3XfgKs4qk

Crise ou colapso?

Crise Hídrica? Que crise? Não existe nenhuma crise hídrica!

Por DENER GIOVANINI

Foto: Tiago Queiroz/EstadãoFoto: Tiago Queiroz/Estadão

Ao contrário do que governos, imprensa e até organizações ambientalistas afirmam, não existe nenhuma crise hídrica no Brasil. Classificar o que está acontecendo com os recursos hídricos nos maiores Estados do país como “crise” é reduzir e limitar a real compreensão dos fatos.

Crises são acontecimentos abruptos e momentâneos. Um momento difícil na existência, quando enfrentamos – na maioria das vezes – situações quase sempre alheias a nossa vontade.

Podemos ter uma “crise renal” quando o nosso corpo sofre um ataque bacteriano ou quando as nossas funções nefrológicas falham subitamente. Podemos ter uma “crise no casamento” quando os conjugues descobrem segredos ocultos ou quando se desentendem por alguma razão. Podemos ter uma “crise ministerial” quando algum ministro fala pelos cotovelos ou quando o seu chefe imediato o desautoriza em público. Podemos ter uma “crise financeira” quando perdemos o emprego ou quando enfrentamos uma doença na família. Podemos ter uma “crise política” quando os representantes do povo são pegos com a boca na botija ou quando o governo, não tendo mais como explicar desmandos, resolve censurar os críticos. Crises, como dito, são manifestações que nos pegam de surpresa, no pulo.

Outra característica de uma crise é a sua temporalidade. Crises sempre acabam. Para o mal ou para o bem, em algum momento cessam. Crise que não cessa não é crise. Crise contínua não é crise, é doença crônica. Na relação conjugal, ou acaba a crise ou acaba o casamento.

Nenhuma dessas características acima se aplica ao quadro de escassez de água em São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais ou Espírito Santo. A água não acabou do nada, de repente. E muito menos será uma situação passageira. O quadro que se instalou nesses Estados, particularmente em São Paulo, é irreversível. Pelo menos para o paulistano que nasceu na data de hoje. Ele, por mais longeva vida que tenha, não viverá como viveram seus antepassados.

A falta de água não é uma “crise”, porque ela não é fruto de um acontecimento imprevisível. Não se trata de um capricho de São Pedro que, de uma hora para outra, resolveu castigar a Região Sudeste. Há mais de 10 anos os governos tinham informações técnicas confiáveis que as torneiras iriam secar a médio prazo.

A falta de água não é uma “crise” porque ela não será passageira. Os fatores que levaram ao esvaziamento das represas não cessarão subitamente. Recuperar as Matas Ciliares que protegem os rios do assoreamento, reflorestar grandes áreas para manter a perenidade das nascentes, cessar o desmatamento da Mata Atlântica e da Amazônia, substituir uma prática agrícola predatória e, principalmente, adotar um novo modelo de desenvolvimento, não são medidas fáceis de serem adotadas e muito menos elas se encontram presentes na agenda dos atuais governantes. Quem acreditar nisso estará sendo, no mínimo, ingênuo. No caso dos políticos que tentam se justificar – chamando de crise o que permanente será – é pura leviandade mesmo.

Por maiores que sejam os dilúvios que possam cair sobre as regiões que hoje enfrentam a escassez de água, a situação não irá mudar. E não mudará porque não existem sinais de que mudaremos as nossas práticas cotidianas. Os reservatórios até poderão encher, mas as razões que os levaram a secar continuarão e eles novamente voltarão a ser o que são hoje: terra seca. O nosso “balde natural” furou. E o rombo é muito maior do que a boca da torneira que o enche.

O que acontece hoje em São Paulo e que se espelha em outras regiões do país, também não é um fenômeno natural. Aliás, eventos da natureza são absolutamente previsíveis. Até terremotos e tsunamis são cada vez mais antecipados pela ciência. Erupções Vulcânicas são identificadas meses antes de ocorrerem. Não existem “crises sísmicas” ou “crises vulcânicas”. Assim como não existem “crises hídricas”.

Em se tratando de natureza, tudo é extremamente previsível, direto e muito simples: apesar de ser existencialmente complexo em sua essência, o ciclo da vida no planeta reage imperiosamente contra quem tenta interrompê-lo. A natureza nunca privilegiou os fracos ou os “desajustados”. Para continuar existindo, o ciclo da vida se renova constantemente a fim de eliminar as ameaças.

Se não é uma crise, o que são então aquelas imagens de represas e açudes vazios? Simples a resposta: um colapso. Um “Colapso Hídrico”!

Um colapso significa falência, esfacelamento e esgotamento.

O colapso, ao contrário de uma crise, não é passageiro.

O colapso, ao contrário de uma crise, é perfeitamente previsível.

O “Colapso Hídrico” se instalou porque esgotamos o atual modelo de desenvolvimento, que privilegia a distribuição de lucros em detrimento dos investimentos em pesquisa e conservação ambiental.

O “Colapso Hídrico” está acontecendo porque esfacelamos todas as oportunidades de adotarmos políticas públicas que priorizassem a modernização dos nossos recursos tecnológicos, para que diminuísse a pressão sobre os recursos naturais.

O “Colapso Hídrico” continuará porque o nosso sistema político está totalmente falido e não é mais capaz de planejar a médio e longo prazo.

O Brasil está começando a vivenciar o seu primeiro colapso ambiental. Outros virão. E as consequências são imprevisíveis. Um país que reduz 95% da Mata Atlântica, que incentiva a emissão de gases poluentes, através de políticas fiscais que estimulam o uso do transporte individual, que ignora a sistemática redução dos Biomas, que mantém uma produção agrícola ultrapassada, que produz leis como o Código Florestal e, principalmente, que elege políticos que não tem nenhum compromisso, a não ser com a perpetuação do poder para sustentar suas máquinas partidárias, está fadado a colapsar.

A primeira e – a mais importante – medida que devemos adotar agora é assumir a realidade como ela é. Devemos ser francos e admitir que o que estamos vivendo não é uma crise e sim um colapso. O fim de um ciclo econômico que falhou.

Não compreender – e aceitar – a diferença entre uma crise e um colapso é o mesmo que tratar gripe e câncer com chazinho caseiro. A gripe até pode passar, o câncer não. Ele sempre evolui. E para pior.

As Polianas de plantão – principalmente aquelas que têm um grau maior de responsabilidade sobre o que está acontecendo – vão taxar esse texto de extremamente pessimista. Vão continuar espalhando sua visão romântica sobre o mundo, enquanto as gotas nas torneiras continuarão sumindo.

Mas a verdade é que o sonho acabou. Ou mudamos ou sumimos. Simples assim.

FONTE: http://sustentabilidade.estadao.com.br/blogs/dener-giovanini/crise-hidrica-que-crise-nao-existe-nenhuma-crise-hidrica/

Eike Batista: Novas estruturas desabam no Império X

Empresário entrega OGX a credores e MMX entra com pedido de recuperação judicial

Jornal do Brasil

De acordo com Gilberto Braga, professor de Finanças do Ibmec/RJ, a recuperação judicial não resolve o problema. “É mais uma grande derrota esse pedido de recuperação, vem em uma hora duplamente ruim, porque é mais uma catástrofe dentro do desmoronamento do Grupo X, e porque o momento do mercado de minério de ferro está ruim no cenário internacional, em termos de preço. Isso torna o futuro dessa empresa totalmente incerto, mesmo em um ambiente de recuperação, porque a saída passaria pela atratividade do negócio”, explica.

O professor lembra que o próprio Eike levava em consideração determinado cenário de mercado que neste momento não se confirma. Se por um lado a recuperação judicial dá uma garantia de que as dívidas não serão executadas no momento, o que dá um fôlego para que a empresa se organize com a supervisão da justiça, por outro ela também não é uma solução, que seria uma retomada da produção internacional, o que neste momento não se mostra possível. 

Se fosse apenas o problema de mercado, em condições normais, a empresa poderia pedir empréstimos, recorrer a linhas de financiamento para se manter a espera de dias melhoras. O problema de mercado aliado a falta de credibilidade do grupo, no entanto, se tornaram mortais, acredita o professor.

“Não obstante os esforços da administração na negociação com credores e na busca por potenciais investidores, o pedido de recuperação judicial configurou-se como a alternativa mais adequada diante da situação econômico-financeira da Companhia”, informou a mineradora. 

No final de agosto, a MMX já tinha anunciado a revisão do plano de negócios para “priorizar as iniciativas geradoras de caixa”. Disse ainda que iria paralisar temporariamente a produção da unidade de Serra Azul, com férias coletivas de 30 dias para os funcionários envolvidos diretamente, em decorrência dos baixos preços do minério de ferro no mercado internacional. No início desta semana, contudo, a empresa informou que as atividades continuarão suspensas após esse período.

A OGPar, ex-OGX, por sua vez, teve a conversão dos R$ 13,8 bilhões de suas dívidas em ações, e deixa de ter Eike como principal acionista. Os credores passam a ter 71,43% da empresa e o restante fica dividido entre o empresário e os minoritários. A ação já estava prevista no plano de recuperação judicial. As ações da empresa também voltarão a ser negociadas na Bovespa, com o código “OGSA3”, mas ainda não há previsão para início. 

Além dos desafios que precisa enfrentar para tentar salvar suas empresas, Eike ainda tem que lidar com diversos processos judiciais, por uso de informação privilegiada para lucrar no mercado financeiro irregularmente, com a OSX e a OGX. Há ainda denúncias de lavagem de dinheiro, falsidade ideológica e formação de quadrilha, além de processos administrativos na CVM. No mês passado, a Justiça Federal do Rio de Janeiro informou que havia bloqueado R$ 117,3 milhões das contas do empresário no Brasil. A Justiça tinha decretado o bloqueio de bens e ativos financeiros do empresário até o limite de R$ 1,5 bilhão, para garantir recursos para ressarcir danos que tenham sido causados aos acionistas. 

Segundo o MPF, o grupo manipulou o preço das ações da OGX com dados falsos sobre a perspectiva da empresa, causando um prejuízo estimado de R$ 14,4 bilhões aos investidores. A diretoria da empresa prometeu a realização de negócios bilionários em operações de extração de petróleo nas bacias de Campos e Santos. Contudo, a projeção teria sido baseada em informações inverídicas sobre a capacidade de exploração das reservas. Entre 2009 e 2013, foram 55 informes no mercado, com estimativas de grande volume de gás e petróleo a ser extraído em poços controlados pela empresa. Estudos internos realizados pela empresa desde 2011, no entanto, apontavam a inviabilidade econômica das áreas em função dos custos e da operação. Em alguns casos, também era mencionada a inexistência de tecnologia para explorar as áreas.

Em um dos processos judiciais enfrentados por Eike, o da justiça fluminense, a audiência na tem data marcada, 18 de novembro. No mesmo dia, após pronunciamento das testemunhas de defesa e acusação, pode ser realizado o julgamento da ação. A decisão do juiz Flávio Roberto de Souza, da 3ª Vara Criminar da Justiça Federal, informa que o empresário teria utilizado “por duas vezes de informações relevantes, ainda não divulgadas ao mercado, que tinha conhecimento, propiciando para si vantagem indevida mediante a negociação, em nome próprio, com valores mobiliários”. O juiz negou o pedido de anulação da defesa.

O empresário teria arrecadado R$ 197 milhões na primeira negociação irregular de ações da empresa, entre maio e junho de 2013, com lucro indevido entre R$ 123 milhões e R$ 126 milhões. Depois, entre agosto e setembro do mesmo ano, obteve R$ 111 milhões com os negócios irregulares. 

A situação das empresas de Eike Batista, que em 2012 começaram a ficar mal das pernas, desceram a ladeira embaladas por 2013. De sétimo homem mais rico do mundo, Eike pulou para a centésima posição da revista Forbes já no início do ano passado. De acordo com informações do mercado, pelo menos dez executivos saíram das empresas do grupo com mais de R$ 100 milhões, e alguns com mais de R$ 200 milhões. Em resumo, Eike blefou sobre suas empresas, se endividou, inclusive com dinheiro público do BNDES, e conseguiu a recuperação judicial.

O império construído em diversos segmentos da economia, como petróleo, energia e portos, ruiu. No mês passado, Eike informou, em entrevista ao jornal O Globo, que o saldo de sua conta estava em US$ 1 bilhão negativo. 

Entre as muitas empresas do grupo, a MPX, agora Eneva, do setor de energia, foi vendida a um grupo alemão. Do setor naval, a LLX passou para o controle do grupo EIG e negociava suas dívidas, e a OSX demitia funcionários. A CCX, de mineração, havia colocado seus projetos na Colômbia à venda.

FONTE: http://www.jb.com.br/economia/noticias/2013/06/13/eike-batista-o-imperio-em-decadencia/