Jornalistas apontam combate à corrupção nos projetos da despoluição da Baía da Guanabara como causa mais provável.
Em artigo publicado no dia de hoje (28/07) pela Bloomberg News, os jornalistas David Biller e Michael Smith oferecem uma visão completa das prováveis causas do assassinato da geógrafa Priscila de Góes Pereira no dia 05 de Outubro de 2015 nas proximidades da estação Maria da Graça do metrô do Rio de Janeiro (Aqui!) (ver reprodução parcial abaixo).
E a versão que emerge desta matéria bem cuidada nada tem a ver com as insinuações levantadas na época de que Priscila Pereira teria a ver com questões passionais, mas sim com a postura que a geógrafa assassinada tinha em suas funções profissionais no “PROGRAMA DE SANEAMENTO DOS MUNICÍPIOS DO ENTORNO. DA BAÍA DE GUANABARA(PSAM) (Aqui!).
Ainda que a matéria não aponte para os potenciais mandantes do assassinato de Priscila Pereira, o que os jornalistas da Bloomberg mostram é que ela era pressionada para receber propinas que possibilitassem, entre outras coisas, a cobrança por serviços prestados nos esforços feitos para despoluir a Baía da Guanabara até o início dos Jogos Olímpicos.
Em outras palavras, o assassinato de Priscila Pereira nada teria tido a ver com paixões mal resolvidas, mas sim com sua indisposição para tolerar e aceitar propinas.
O interessante é que agora chegamos à exposição deste crime e de suas potenciais ligações com o fracasso do programa de despoluição da Baía da Guanabara pelas mãos de dois jornalistas que trabalham para a Bloomberg, e não para um dos grandes veículos mantidos pela mídia coporativa brasileira. Aliás, essa é a primeira notícia que esta matéria traz: a mídia estrangeira fazendo jornalismo investigativo de qualidade, enquanto a brasileira segue tentando nos distrair com cenas de grandeza que não resistem a um escrutínio minimamente sério.
No meio disso tudo há que se ter na memória a pessoa de Priscila Pereira que teve sua vida ceifada por se comportar de forma honrada e ética. Essa perda somada à condição deplorável em que a Baía da Guanabara se encontra são parte de nossa tragédia cotidiana.
No período em que foi assassinada, a geógrafa Priscila Pereira desenvolvia pesquisas na área do planejamento governamental sob a perspectiva do desenvolvimento territorial e regional, através do grupo de Pesquisa do Laboratório Estado, Economia e Território (LESTE/IPPUR/UFRJ).
Pelo menos com essa matéria da Bloomberg o que eu espero é que a investigação desse assassinato tenha a prioridade que merece, e até hoje não teve.
Lei assinada pela presidente eleita Dilma Rousseff em 2013 concede isenção de impostos para um total de 780 empresas envolvidas nos jogos olímpicos da Rio 2016; entre elas estão o Comitê Olímpico Internacional (COI), a Globo, a Odebrecht, o Bradesco, a Coca-Cola e a Nike. É uma exigência do COI ao país-sede, compromisso firmado na candidatura do país, e praxe em outras edições; no Brasil, o total previsto é de R$ 3,8 bilhões
247 – Uma lei assinada pela presidente eleita Dilma Rousseff em 2013 concede isenção de impostos para um total de 780 empresas envolvidas nos jogos olímpicos da Rio 2016.
Entre elas estão o Comitê Olímpico Internacional (COI), a Globo, a Odebrecht, o Bradesco, a Coca-Cola e a Nike. É uma exigência do COI ao país-sede, compromisso firmado na candidatura do país, e praxe em outras edições. No Brasil, o total previsto é de R$ 3,8 bilhões.
“A Lei tem o propósito de criar incentivos fiscais para o comitê organizador. Isso é nos moldes da Copa do Mundo para desonerar custos da realização”, informou o comitê ao blog do jornalista Rodrigo Mattos. “O Rio-2016 requer as habilitações. Só as empresas que estão com regularidade fiscal que podem ser incluídas, e só em notas para pagamento do Rio-2016.”
As isenções se restringem aos serviços ou produtos usados pelas empresas ou entidades para os Jogos, no período de janeiro de 2013 e 2017. Cada empresa passa a ter o direito a não pagar os impostos a partir do momento em que a Receita a inclui na lista. No caso das empresas nacionais, elas não precisam pagar nenhum imposto de importação para produtos ou serviços vindos do exterior. Também não pagam IPI de produtos adquiridos no país para realizar os Jogos, nem têm de quitar PIS/Pasep e Cofins por serviços contratados. Firmas vinculadas ao COI não têm de pagar nem imposto de renda.
A Globo Comunicações foi incluída na lista da Receita em maio de 2015 como prestadora de serviços e transmissora oficial do evento. O pagamento da importação de equipamentos também está isento. A emissora disse que ganhos com publicidade não estão livres de impostos. Com cotas de R$ 255 milhões, a Globo ganhará R$ 1,5 bilhão só em propaganda direta com os Jogos. “O valor da desoneração das emissoras é pequeno em relação ao total da isenção prevista em lei”, disse a assessoria.
Ontem (18/07) tive um daqueles momentos para nunca mais esquecer porque decidi não viver numa metróple: dirigi duas vezes pelo centro da cidade do Rio de Janeiro. A pouco menos de três semanas do início dos Jogos Olímpicos de 2016, o que vivenciei como motorista foi a mais pura manifestação do caos urbano. Desde ruas completamente fechadas a pessoas atravessando em qualquer ponto das ruas, estava lá a expressão mais pura de uma reforma urbana anti-popular.
Alguns poderiam dizer que depois dos Jogos Olímpicos, com as obras enfim terminadas, as coisas vão melhorar. Aliás, é isso que promete o serelepe prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes. Mas até o mais ingênuo dos cariocas já sabe que esse caos será uma herança que vai marcar o cotidiano da cidade por algum tempo, pois o que não foi feito antes dos Jogos certamente vai entrar em um compasso ainda mais lento, pois o que se avizinha é também uma crise financeira em nível municipal.
E tudo isso é para quê? Pelo que eu pude antever das mudanças já realizadas na paisagem, e isso não é novidade alguma para quem está pesquisando o assunto, a cidade do Rio de Janeiro está sendo preparada para se tornar de vez uma cidade global para os ricos. A primeira coisa é que os pobres estão sendo varridos dos locais que passam por essa transformação globalizante num evidente processo de gentrificação. Depois, apenas haverá espaço para aqueles que podem pagar para desfrutar das modernidades globalizadas e caras que estão sendo impostas na paisagem urbana carioca.
Para complicar ainda mais essa realidade de exclusão e segregação, é quase inevitável que uma grave crise financeira venha a se abater sobre essa Rio de Janeiro transformada. E como sempre não serão as empreiteiras e as corporações financeiras que vão arcar com os custos desta crise que é, essencialmente, planejada para acontecer.
Agora, como tudo isso está aí para ser visto, vamos ver como se comportam no futuro os que não foram convidados para esta festa. Mas, por enquanto aos menos para mim, a próximida ida ao Rio de Janeiro não será de carro.
Nos últimos dias temos ouvido e assistido declarações aparentemente contraditórias do prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, indicando que as Olimpíadas estão se tornando uma “oportunidade perdida” para a cidade que ele governa (Aqui!).
Alguns críticos de Eduardo Paes rapidamente apontam para o cinismo das declarações, já que o prefeito não só foi um dos maiores entusiastas da vinda deste megaevento para o Rio de Janeiro, mas como tratou de forma fortemente centralizadora todos os aspectos relativos aos mínimos detalhes em relação à implantação das infraestruturas físicas e logísticas definidas para garantir a realização do mesmo.
Aliás, quem não se lembra da imagem épica de Eduardo Paes, em companhia dos filhos, de Pezão e do seu pupilo Pedro Paulo) apertando a alavanca de detonação do elevado da Perimetral no final de 2013,?
Entretanto, não considero que os posicionamentos públicos de Eduardo Paes sejam só cinismo, mas sim uma tentativa de ocultar todas as facetas negativas que certamente emergirão durante a realização dos Jogos Olímpicos e, principalmente, após o seu encerramento. Nesse sentido, posto abaixo a íntegra de uma entrevista realizada pelo BBC com o professor Jules Boykoff, doutor em ciência política e professor da American University, de Washington DC.
De cara, considero que as diferentes nuances abordadas nesta entrevista revelam a real face desse megaevento, não apenas na sua edição Rio de Janeiro, mas ao longo do tempo em que os Jogos Olímpicos foram vendidos como um megaevento esportivo capaz de resolver problemas urbanísticos acumulados, apenas para gerar condições ainda mais precárias e antidemocráticas nas cidades-sedes.
O fundamental aqui é entender que do ponto de vista das empreiteiras e das corporações essa edição dos Jogos Olímpicos já é um sucesso de vendas. Felizmente, como mostra o professor Boykoff, o jogo (desculpem-me o trocadilho) ainda está sendo jogado em termos dos processos de resistência e enfrentamentos com o modelo de cidade que se associa a este megaevento. E talvez seja isto o que realmente preocupa Eduardo Paes.
Rio 2016 escancara crise do modelo dos Jogos Olímpicos ‘como nunca antes’, diz pesquisador dos EUA
Jefferson Puff – @_jeffersonpuffDa BBC Brasil no Rio de Janeiro
AFP. Para especialista, cada vez menos cidades se interessam em sediar Jogos
A Rio 2016 será marcada como a Olimpíada em que “o verniz das relações públicas se desfez de forma inédita na história dos Jogos, como nunca antes”, na opinião do pesquisador Jules Boykoff, doutor em ciência política e professor da American University, de Washington.
Em entrevista à BBC Brasil, ele disse que problemas surgidos na preparação dos locais sede – “privilégios para os mais ricos, remoções de muitas pessoas do seu local de moradia e militarização do espaço público” – não são novos, mas que no Rio “você vê essas tendências aumentadas, e com clareza muito maior”.
Ele diz, como exemplo, que no Rio “jamais houve a mínima ilusão” de que a Vila dos Atletas seria revertida, após os Jogos, em alguma projeto de valor social, como foi o caso em Olimpíadas anteriores.
BRIAN LEE. Jules Boykoff escreveu livro sobre história política dos Jogos
“A Olimpíada como megaevento está lentamente entrando em crise, e você vê elementos desta crise se apresentando com força maior no Rio.”
Em seu livro recém-lançado, Power Games: A Political History of the Olympics(“Jogos de Poder: Uma História Política das Olimpíadas”) ainda sem título oficial em português, Boykoff descreve o que vê como uma crise estrutural no modelo dos Jogos, da escolha da cidade-sede ao descompasso orçamentário e às promessas de legado não cumpridas.
Para o especialista, o COI (Comitê Olímpico Internacional), é parte do problema, por encorajar projeções de custo irreais no momento da candidatura das cidades-sede e por guardar seu próprio orçamento a sete chaves. Ele acredita que o Rio avançou muito pouco após dez anos sediando megaeventos.
Em entrevista à BBC Brasil, Boykoff, que jogou no time olímpico de futebol dos Estados Unidos nos anos 1990, diz que há cada vez menos cidades interessadas em sediar as Olimpíadas e que a tendência é que o COI encontre cada vez mais dificuldades em achar candidatos.
Veja os principais trechos da entrevista:
PA. Estudioso diz que ‘verniz das relações públicas’ caiu no Rio
BBC Brasil – A Rio 2016 enfrentou problemas como promessas não cumpridas na área ambiental, remoções de comunidades para dar lugar a obras, além de projetos que ficaram mais caros e atrasos em áreas importantes, como a expansão do metrô linha 4. São problemas que vêm se tornando rotina paras as cidades-sede ou tratam-se de questões específicas do Rio?
Jules Boykoff – A Olimpíada do Rio segue um padrão de problemas que estamos vendo em diversas cidades-sede nos últimos anos, e estes incluem os privilégios para os mais ricos, remoções de muitas pessoas do seu local de moradia e militarização do espaço público. Eu diria que no Rio você vê essas tendências aumentadas, e com clareza muito maior. No Rio o verniz das relações públicas dos Jogos se desfez de forma inédita na história das Olimpíadas, como nunca antes.
A Vila dos Atletas é um bom exemplo disto. Em Olimpíadas anteriores, os organizadores escolheram esta área para se obter um valor social positivo após os Jogos, com a transformação em moradias sociais. No Rio, jamais houve a mínima ilusão de que isto aconteceria.
Desde o início o plano foi converter os apartamentos em condomínios de luxo. O contexto em torno das Olimpíadas mudou de forma muito drástica. Elas estão agora numa crise que vai além dos Jogos do Rio 2016. A Olimpíada como megaevento está lentamente entrando em crise, e você vê elementos desta crise se apresentando com força maior no Rio.
GETTY IMAGES. Vila dos Atletas será transformada em condomínio de luxo.
BBC Brasil – Quais são os principais aspectos desta crise estrutural que o senhor identifica para a forma como as Olimpíadas vêm sendo projetadas e geridas?
Boykoff – Um grande indicativo é que cada vez menos cidades estão interessadas em sediar as Olimpíadas. Olhe para o processo de seleção para os Jogos de Inverno de 2022. Você vê que no final sobraram apenas dois locais: Almaty, no Cazaquistão, e Pequim, na China. Nenhuma das duas conhecidas como bastiões da democracia. E Pequim ganhou.
Se você olhar para trás, verá que todas as vezes que os cidadãos tiveram a oportunidade de dar sua opinião, num processo democrático, eles disseram não a sediar os Jogos. Isso aconteceu em Cracóvia, na Polônia, em Estocolmo, na Suécia, e em dois cantões da Suíça.
Em Oslo, deputados noruegueses também rejeitaram sediar a Olimpíada. O que se percebe é que, cada vez mais, se o processo de decisão é aberto à população ou a Casas parlamentares, numa consulta democrática, a resposta é não a sediar a Olimpíada.
BBC Brasil – A Olimpíada é vista por especialistas como o evento que mais extrapola o orçamento em comparação com qualquer outro grande evento. Sempre foi assim, ou é uma tendência recente?
Boykoff – Ao menos desde 1960 todas as Olimpíadas ultrapassaram o orçamento. Em parte, isso se deve ao fato de que as Olimpíadas se tornaram tão grandes. É o que alguns especialistas que estudam os Jogos chamam de “gigantismo”. E por causa disso os Jogos continuam crescendo mais e mais, acrescentando novos esportes, e conforme se tornam um alvo em potencial para grupos terroristas, o orçamento de segurança também aumenta.
As cidades são estruturalmente encorajadas a reduzirem o valor de tudo nos seus dossiês de candidatura. Oferecer estimativas menores do que os Jogos vão custar é crucial porque as cidades precisam de apoio da opinião pública durante o processo de candidatura.
GETTY IMAGES. Especialistas criticam gigantismo dos Jogos
BBC Brasil – Atualmente é praticamente impossível uma cidade-sede conseguir manter o orçamento previsto no processo de candidatura. Como o COI poderia ajudar a evitar este descompasso orçamentário?
Bookoff – Eu acho que o COI realmente é parte do problema porque tem demonstrado uma grande facilidade espontânea em ser enganado. Eles acreditam em qualquer coisa que qualquer candidato diga. Trata-se de um pensamento mágico por parte do COI, já que eles não fazem perguntas duras para as cidades candidatas.
O COI precisa ser muito mais transparente sobre o processo de votação das cidades-sede. Há a montagem de comitês e são produzidos relatórios técnicos sobre cada cidade, mas no final das contas as pessoas que votam podem ignorar toda essa documentação técnica e decidir porque têm uma relação com o presidente do país ou porque gostam do prefeito da cidade-sede.
BBC Brasil – Houve avanços no combate à corrupção no processo de seleção das cidades-sede? O COI diz que não pode divulgar informações sobre orçamento e gastos devido a contratos com parceiros comerciais e patrocinadores. Por que há tanta falta de transparência sobre as finanças do COI?
REUTERS. Candidatura de Sydney e outras cidade teve muita corrupção, diz especialista
Boykoff – É muito difícil saber por ser um processo tão cinzento e cheio de segredos. Houve muita corrupção em torno das candidaturas de Sydney, na Austrália, e de Nagano, no Japão. Eles destruíram todos os documentos em Nagano, então nem sabemos o que aconteceu. A corrupção saiu do controle na candidatura de Salt Lake City, nos EUA, para os Jogos de Inverno de 2002, eles foram pegos, e o escândalo levou a algumas reformas no COI.
Hoje em dia, os membros do COI não podem fazer visitas especiais às cidades-sede antes da votação, que era justamente quando muito da corrupção ocorria. A corrupção parece estar menos disseminada atualmente na relação do COI com os processos de candidatura. Eu aplaudo o COI por recentemente ter começado a ser um muito mais transparente com relação aos seus gastos. Eles revelaram alguns dos benefícios do presidente da entidade, Thomas Bach, e de quanto são as diárias de alguns dos diretores do comitê quando estão em viagem.
Se você é um membro executivo do COI e vem ao Rio para reuniões, além de ficar no Hotel Copacabana Palace, você pode receber uma diária de US$ 900 para seus gastos pessoais. Se você é um membro normal, a diária é de US$ 400. Compare isso ao rendimento médio de um morador da Rocinha, de US$ 240 por mês.
Só por estar dentro da lei não significa que é ético, e só por estar sendo revelado não significa que não é chocante. O COI precisa ser mais responsável com o legado e os impactos dos Jogos para as cidades-sede. Muitas vezes, o COI diz que não pode divulgar informações sobre orçamento devido a contratos com seus patrocinadores. Trata-se na verdade de um escudo atrás do qual o comitê se esconde para justificar que por isso não pode compartilhar informações financeiras.
BBC Brasil – Quando é que os Jogos começaram a perder seu apelo para as cidades?
Boykoff – Eu acho que 1976 foi o ano mais decisivo para a história política do COI, primeiro por conta de Montreal, quando o prefeito disse que os Jogos custariam US$ 125 milhões, e disse que seria mais fácil um homem ter um bebê do que a Olimpíada entrar em deficit orçamentário. Ela acabou custando US$ 1,5 bilhão e levou 30 anos para que a dívida deixada pelos Jogos fosse paga pelos contribuintes.
No mesmo ano, no processo de candidatura dos Jogos de Inverno, os cidadãos de Denver, nos EUA, se posicionaram, fizeram protestos e conseguiram exigir um plebiscito no qual votaram contra sediar os Jogos, dizendo que isto acabaria com o meio ambiente e traria dívidas, e o COI teve que mudar a sede para Innsbruck, na Áustria.
GETTY IMAGES. Dívida dos Jogos de Montreal demoraram 30 anos para serem pagas
BBC Brasil – O senhor ressalta vários pontos negativos e problemas em sediar as Olimpíadas, mas quais são os benefícios que uma cidade pode obter ao sediar os Jogos?
Boykoff – Olhando para as Olimpíadas recentes eu diria que um dos maiores ganhos para uma cidade que sedia os Jogos pode ser o avanço na rede de transporte público. Veja o caso de Atenas, em 2004. A maior parte das pessoas viu os Jogos de Atenas como um desastre total. É fato que eles mal terminaram as obras antes dos Jogos, mas melhoraram o sistema de metrô, e isso é algo que todos os cidadãos de Atenas podem usufruir todos os dias.
Se a linha 4 for concluída, no caso do Rio este seria um grande ganho para o transporte público. Já em quesitos ambientais e de sustentabilidade o COI precisa melhorar. Se as promessas ambientais tivessem sido cumpridas no Rio este seria um grande ganho para os cariocas.
REUTERS. se concluída, linha 4 do metrô pode ser legado para cidade
BBC Brasil – O Rio acaba de sair de um ciclo de dez anos como sede de grandes eventos. Houve os Jogos Panamericanos, Jornada Mundial da Juventude, Rio+20, Jogos Mundiais Militares, Copa das Confederações, Copa do Mundo e agora Olimpíada. Se houvesse tantos avanços com a realização desses megaeventos, a cidade não deveria ser, a esta altura, muito melhor e com problemas muito mais resolvidos, em setores como transporte público e saneamento básico?
Boykoff – Sim, poderíamos esperar que após dez anos de megaventos o Rio estaria num outro patamar de transporte público, com melhor saneamento básico, tratamento de esgoto e questões de sustentabilidade resolvidas. Haveria maior avanço se muitas das promessas feitas para cada um desses eventos tivessem sido cumpridas.
Mas, dez anos depois, aqui estamos nos perguntando como foi possível gastar todos esses bilhões de dólares e como muito desse dinheiro público acabou servindo para proporcionar vantagens aos segmentos mais ricos da população carioca, as elites econômica e políticas. É doloroso refletir sobre todo esse dinheiro usado em megaeventos no Rio e o pouco que se conseguiu de beneficio para os cariocas.
AP. Megaeventos não resolveram problemas da cidade
BBC Brasil – O senhor diria que os países que optam por pagar pelas arenas e instalações olímpicas, em vez de criar parcerias com a iniciativa privada, e depois usufruem 100% dos locais e podem dar finalidades coletivas a eles, acertam mais do que o modelo escolhido no Rio, onde em troca dos recursos para construção das arenas, grandes empreiteiras receberam o direito de explorar as regiões com empreendimentos de luxo, como na Vila dos Atletas, Campo de Golfe e parte do Parque Olímpico?
Boykoff – Eu acho que este seria um passo potencialmente muito positivo a ser tomado. Em geral a cidade-sede paga por essas construções, mas há um risco envolvido. O ideal seria o Estado pagar e depois poder usufruir 100% das instalações no plano de legado.
Caso o Rio tivesse usado lições de Olimpíadas anteriores nos aspectos onde houve avanços, poderia ter chegado a um plano muito bom. Usando, por exemplo, o sistema de transporte público de Atenas, e o estádio de natação de Londres. De forma geral, nenhuma Olimpíada recente serviu muito para o bem coletivo, e essa é uma das maiores enganações.
BBC Brasil – Seis meses após os Jogos, corre-se o risco de que o Estado e a Prefeitura do Rio se colocaram em dívidas muito maiores do que o imaginado por conta da Olimpíada?
Boykoff – Fazer predições é algo muito difícil, sobretudo num ambiente tão volátil e com tantas mudanças como a política e a economia do Estado e da cidade do Rio, onde há tantas turbulências constantes. Mas eu diria que o futuro ainda está em aberto no Rio, e há muito espaço para mudanças. Há diversas cartas sobre a mesa, e oportunidade de agitar e transformar. Resta saber se esta oportunidade será tomada.
Ainda em relação à participação de duas empresas pertencentes ao pai do líder do PMDB na Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro, André Lazaroni, acabei me lembrando de que no dia 22 de maio, o Portal Viu! havia publicado uma matéria bastante ampla, assinada pela jornalista Cláudia Freitas, sobre a relação umbilical entre políticos e empreiteiras (Aqui!).
E pelo que se pode depreender da leitura da matéria do Portal Viu!, o alcance das obras das empresas do pai de André Lazaroni com participação de recursos públicos extrapola os Jogos Olímpicos e o território da cidade do Rio de Janeiro, chegando até no Norte Fluminense.
E ai fica bem claro que a crise é seletiva, muito seletiva!
Por fim, há que se notar que no presente caso, o Portal Viu! deu um furo de reportagem que demorou quase 2 meses para aparecer na mídia corporativa nacional. Isso demonstra que o jornalismo investigativo que anda sufocado na mídia tradicional está encontrando espaços na internet. De quebra, este caso mostra que santo de casa faz milagre sim. E na condição de colaborador do Portal Viu!, só posso desejar que o projeto possa condicionar funcionando de forma a nos fornecer informação de excelente qualidade, como foi a desse caso.
Os Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro já estão com um custo próximo de R$ 40 bilhões , mas em pelo menos um quesito não conseguirão deixar nenhum legado que mereça ser lembrado positivamente. Em matéria assinada pelo jornalista Ítalo Nogueira publicada pelo jornal Folha de São Paulo no dia 02/07 foi informado que todas as metas ambientais prometidas na candidatura junto ao Comitê Olímpico Internacional (COI) serão descumpridas (Aqui!).
Na matéria são apresentados alguns dos fracassos com que a cidade do Rio de Janeiro terá de conviver após o encerramento do megaevento esportivo. Entre as promessas importantes que foram solenemente descumpridas estão o tratamento total do esgoto lançado baía de Guanabara, e o tratamento dos problemas ambientais da lagoa de Jacarepaguá, que margeia o Parque Olímpico, e que continuará completamente poluída e sob acelerado processo de assoreamento.
Eu sinceramente não me surpreendo com esse descompasso entre a promessa e o que foi efetivamente realizado em prol da melhoria ambiental dos importantes ecossistemas existentes na cidade do Rio de Janeiro. Apesar disso, considero lamentável que tanto dinheiro esteja sendo gasto com estruturas físicas que não poderão ser usadas pela maioria da população carioca, enquanto quase nada tenha sido aplicado em questões que poderiam ser sim um legado positivo dos Jogos Olímpicos. A começar pelo tratamento de esgotos in natura que continuarão sendo despejados na Baía da Guanabara.
Em entrevista dada hoje no programa “Faixa Livre” compartilhei a minha opinião pessoal de que a situação de crise seletiva causada pelas ações políticas do (des) governo estadual do Rio de Janeiro estão causando uma exasperação sem precedentes dentro do funcionalismo público estadual. Adicionei a minha preocupação de que na ausência da devida organização política dos diferentes sindicatos que representam as categorias que formam o funcionalismo estadual, o risco é de que tenhamos uma explosão social que reverbere profundamente durante a realização dos Jogos Olímpicos.
Dito isso, mostro duas imagens abaixo que mostram que as coisas podem estar se acelerando no sentido de um protesto massivo do funcionalismo que convivendo com a realidade dos atrasos e parcelamentos de salários, agora se vê ameaçado com o início de demissões até de servidores concursados.
A primeira imagem é a da convocação de um ato para amanhã na frente da Alerj e que foi convocado pela chamada Frente Povo Sem Medo. A segunda é de um protesto realizado na manhã desta segunda-feira por policiais e bombeiros militares no Aeroporto Internacional do Galeão.
A junção dessas duas imagens mostra qual volátil as coisas poderão se tornar no Rio de Janeiro caso o (des) governo do Rio de Janeiro se mantenha no seu curso atual de penalizar os servidores e a população, enquanto continua com seu tratamento preferencial para as Olimpíadas e corporações privadas que operam no estado.
Uma coisa é certa: uma boa parcela dos servidores já não aguenta mais e está com a paciência esgotada com os usos e costumes do governo comandado pelo PMDB em consórcio com o PP. Simples assim!
Tive a oportunidade de visitar Londres pouco mais de 60 dias antes dos Jogos Olímpicos de 2012 e observei cenas de encerramento de trabalhos de modificação de ruas e praças e que ocorriam de forma urgente, mas com jeito de que iriam estar prontas antes do “D”, o da abertura do megaevento esportivo.
Passados quatro anos me vi caminhando no centro da cidade do Rio de Janeiro que também deverá abrir em breve mais uma edição deste megaevento após gastos bilionários que comprometerão a saúde financeira do município e do estado por várias décadas. Uma primeira constatação é de que as mesmas cenas de urgência se repetem com trabalhadores fazendo um esforço dobrado para completar obras, que dificilmente estarão prontas até o dia de abertura dado que paira uma injustificada (ao menos dado os preços das obras) aparência de completa improvisação.
Mas mesmo naqueles pontos em que as obras avançaram deu para notar que uma mudança capital no tecido urbano da cidade do Rio de Janeiro está emergindo e não é bom. Falo aqui da destruição de diversas singularidades que marcam a história da cidade para torná-la uma espécie de imitação cara das capitais européias. E isso começa pelas obras na área do chamado “Porto Maravilha” e alcançam até as áreas de trânsito do VLT.
O que parece estar em curso no centro do Rio de Janeiro é um processo de fechamento aos circuitos lentos de interação pessoal para um rápido onde se materializa a supremacia do grande capital internacional.
Apesar de eu não ser o primeiro a falar nesse “legado” dos megaeventos esportivos especificamente sobre a cidade do Rio de Janeiro, visto que pesquisadores como Gilmar Mascarenhas, professor e pesquisador da UERJ, e Carlos Vainer, professor e pesquisador da UFRJ, já vem tratando a mais tempo das mudanças nem sempre positivas que os megaeventos causam. Nesse sentido, sugiro que assistam a um depoimento do prof. Vainer no programa Juca Entrevista do jornalista Juca Kfouri (Aqui!)
Entretanto, enquanto alguém que transitou a pé pelo centro do Rio de Janeiro por mais de uma década entre os anos 1980 e 1990, posso já dizer que todo o dinheiro gasto nas supostas melhorias urbanísticas não serviu para democratizar a circulação ou acesso e, provavelmente, o que resulta dessas intervenções não será melhor para a população carioca. Os grandes ganhadores serão, sem nenhuma dúvida, as empreiteiras e as corporações financeirase, por que não, o Comitê Olímpico Internacional (COI).
Os Jogos ainda nem começaram, mas não hesito em dizer: que triste legado!
Ainda pessoas de boa índole que não imputam aos que (des) governam hoje as devidas responsabilidades sob a desculpa que estamos em meio a uma crise geral. Mas como venho acompanhando, graças ao pessoal do blog Transparência RJ, a gastança desenfreada que anda sendo feito com o dinheiro público, me permito a apontar que a questão é de prioridade mesmo.
Vejamos um exemplo bem drástico do tipo de prioridade torta que controla as decisões sobre onde e quanto gastar. Na última quarta-feira (22/06), o Portal G1 publicou de forma até discreta o virtual desmanche da unidade fluminense do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais sob a desculpa de que não havia recursos para manter os técnicos que ali trabalhavam (Aqui!).
Pois bem, e quanto custaria manter o CEMADEN/RJ em funcionamento? Em função dos serviços prestados isto sairia por módicos R$ 38.750,00 mensais ou R$465.000,00 por ano. Apenas por comparação, o custo anual do CEMADEN/RJ equivale a 2,3% do valor pago pelo aluguel de ambulâncias para os Jogos Olímpicos (Aqui!) e a 2,4% do valor de um dos trens chineses que foram comprados com dinheiro público para serem entregues à SuperVia (Aqui!).
Como estive nas áreas de desastre na região Serrana no início de , 2011 que decorreram de fortes chuvas torrenciais, pude testemunhar que a falta de um serviço de alerta como o representado pelo CEMADEN contribuiu para potencializar a tragédia que ocorreu. Por essa razão considero inexplicável que se sucateie o CEMADEN em prol, por exemplo, do aluguel de ambulâncias para as Olimpíadas. Aliás, inexplicável é pouco.
Com o singelo título “Não existe crise para as Olimpíadas“, o pessoal do Blog Transparência RJ revelou nesta segunda-feira (20/06) mais um caso que escracha a relatividade da crise financeira que assola o estado do Rio de Janeiro. Segundo o que apurou a equipe do Transparência RJ, o (des) governo do Rio de Janeiro irá gastar uma verdadeira fortuna apenas com o aluguel de ambulâncias para atender os Jogos Olímpicos e Paraolímpicos (Aqui!).
Em troca de um contrato de R$ 20 milhões, a empresa “Sistema de Emergência Médica Móvel do Rio de Janeiro Ltda” terá de trabalhar 29 dias, o que dá a bagatela de R$ 688.695,17 diários nos cofres da empresa.
O que mais me impressiona em mais este gasto milionário é que a “Sistema de Emergência Médica Móvel do Rio de Janeiro Ltda” irá obter com essa contrato um valor que é maior que a dívida que a Universidade Estadual do Norte Fluminense (Uenf) acumula com todos os seus fornecedores de serviços básicos (água, luz, eletricidade) e insumos básicos para pesquisa (gases, reagentes, rações para animais).
Esse diferença de tratamenro que o (des) governo do Rio de Janeiro dá a um empreendimento privado como os jogos olímpicos que são propriedade do Comitê Olímpico Internacional (COI) em detrimento de uma instituição de ensino público mostra bem que a crise em que estamos afundados é muito, mas muito, seletiva.
E não custa nada lembrar que essas ambulâncias alugadas teriam custado muito menos aos cofres estaduais se tivessem sido compradas para uso durante os jogos olímpicos para serem depois distribuídas a hospitais públicos.