As lições de Sérgio Cabral Filho que o prefeito Wladimir Garotinho deveria lembrar

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Por Douglas Barreto da Mata

Líderes políticos, como artistas, esportistas, e porque não dizer, até nós mesmos, temos uma face pública e outra privada. Nós, pobres mortais, temos até uma vida particular bem maior que desejaríamos ter…nossa vida pública se resume a trabalho, escola, e outras obrigações enfadonhas.  Nada de viagens, restaurantes caros, enfim, a mesmice da pobreza se mistura nas duas esferas de convivência, para nos dar aquilo que é, nos dias atuais, quase uma sentença de morte: o anonimato.

Já para as pessoas que vivem ou utilizam sua imagem pública como ferramenta de vida, quase sempre suas personagens públicas são confundidas com aspectos privados de suas vidas, em busca da tão desejada popularidade.

Quando se tratam daqueles que exercem cargos públicos, ou que são figuras “famosas”, há de se ter um certo cuidado, um tipo de decoro, de forma a preservar as instâncias privadas (família, negócios, etc), e afastar a contaminação e confusão entre o que se faz, e principalmente, o que se pode fazer em público, e o que deve ficar restrito às esferas privadas de cada um.

É um exercício doloroso, porque a popularidade é tipo uma droga, e como tal, vicia.  Como tal (como uma droga) ela (a popularidade) traz sentimentos de invencibilidade e de infalibilidade.  Esses sentimentos, se não forem bem dosados, intoxicam a privata persona.

Esta intoxicação se manifesta no exato momento que passamos a imaginar que todos nossos hábitos e atos íntimos, nossas preferências podem ser catapultadas e entendidas pelas esferas públicas às quais nos dirigimos.  Nem sempre os intoxicados percebem, como em todos os outros vícios.

Como resultado, a esfera pública (o público) passa a entender que pode julgar e interferir em nosso comportamento, e isso gera um ruído, porque tais escrutínios (julgamentos) são, geralmente, indesejáveis, quando não violentos e cruéis.

Um exemplo? Sérgio Cabral Filho.  Jornalista, Presidente da ALERJ, eleito Governador, “amigão” do Presidente Lula 2 (mandato 2), classe média alta, herdeiro de um capital social e intelectual invejável, de seu pai, jornalista famoso nos meios “formadores de opinião” da Capital do Rio, leia-se, ricos da Zona Sul.

Pois bem. Ninguém nunca questionou os hábitos de Sérgio Cabral, nem do pai, nem do filho, enquanto gozavam dos privilégios comuns à classe à qual pertenciam, e aos meios onde circulavam. Ou seja:  Cabral filho não precisou fingir ser pobre, ou esconder sua origem, nada disso.

O pacto político que o elegeu (Cabral) Governador não precisou mais do que “popularizar” a imagem dele, é certo, mas não o fez andar de ônibus ou trem da Central, entrar na fila do restaurante popular, ou fazer a mudança dele e da família do Leblon para Bangu.

Qual foi o fim da figura pública de Sérgio Cabral Filho, que inclusive levou junto a figura e o legado do pai?  A República dos Guardanapos.

A prisão, as investigações, até seu alegado envolvimento com as agressões sofridas pelo seu vizinho de cela, o ex Governador Garotinho, nada disso destroçou tanto a imagem de Cabral, quanto a imagem dele e outros apaniguados, em Paris, com guardanapos na cabeça. Vejam bem que ali não havia nenhuma cena pornográfica, nenhuma evidência de desvio de dinheiro público, nenhuma cena de violência ou destempero do ex Governador. 

Então, o que aconteceu?  A afronta, a falta de decoro, o ato público de escárnio. Esta atitude disparou um sentimento comum (e mortal) no restante das pessoas que não podem fazer o mesmo: a hipocrisia, e passamos a criticar o que é, paradoxalmente, desejado no íntimo por cada um de nós.

Afinal, quem não deseja dançar em um restaurante mega chic em Paris com os amigos, fazendo o que bem entender, inclusive papel ridículo?  O problema é que o público não tolera tais comportamentos em seus mandatários.

O público, seja por hipocrisia, seja por inveja, não importa, não permite o excesso.

Todo mundo sabia da vida boa de Cabral, de seus confortos, de jantares, o que, aliás, são próprios da vida de governador.  O público sabia, e nunca toleraria, também, ver um governador maltrapilho, barba por fazer, e morando em um quitinete em Copacabana, justamente porque soaria falso, e igualmente ofensivo. O público, em sua maioria pobre, não aceita que os seus representantes “brinquem de pobre”, mas odeiam ainda mais a opulência ofensiva.

Descer de uma SW HILUX Toyota? Ok.  Descer de uma Ferrari? Nunca.

É isso que o Prefeito de Campos dos Goytacazes parece não ter entendido.  Mesmo fugindo como o diabo foge da cruz das redes sociais, sempre tem alguém a nos mostrar, compartilhar vídeos.

Este fim de semana, as redes sociais dos opositores do Prefeito tentaram emplacar críticas aos seus gostos e preferências de lazer, às suas companhias, e a uma certa opulência.

Talvez para afastar da memória da população o registro de uma autoridade estadual cambaleando pelas ruas de Londres, de madrugada, falando alto, como se estivesse para lá de Bagdá, digamos, alguns coqueiros.

O argumento de que ninguém tem nada a ver com a vida particular deles é correto.  Até certo ponto.

Aqueles que fazem de suas vidas particulares instrumentos de engajamentos para alavancarem suas carreiras, como é muito comum hoje em dia, não podem recorrer ao refúgio da privacidade, toda vez que foram surpreendidos em situações adversas ou forem questionados por seus hábitos privados de consumo, ou outros quaisquer.

Aqueles que demonstram publicamente sua fé (que é algo que deveria ser privado), falam de comportamentos, regras, normas de convivência, e até de caráter alheios, não têm o benefício da privacidade. É o jogo.

Neste sentido, parece que o Prefeito de Campos dos Goytacazes está oferecendo, de bandeja, as armas para que seus desafetos transformem uma bem sucedida carreira, e uma imagem até aqui impecável, de pai, homem público, em uma figura de playboy, perdulário e indiferente.

Não se trata de fingir de pobre, como já dissemos, nem ignorar o fato de que é filho de casal de governadores, e de uma bem sucedida família de políticos, e que isso trouxe para ele vantagens em relação à imensa maioria dos cidadãos e cidadãs que o elegeram.

Nada disso. A questão é o decoro, o respeito ao fato de que sua posição privilegiada não pode ferir os sentimentos de quem está  por baixo no grande esquema da vida.

É hipocrisia nossa, da maioria? Sim, claro que é, mas saber disso de nada adianta.  Pois são os hipócritas, que são a maioria, que votam ou não votam em seus representantes.

Os brocados ensinam:  

“Quem fala demais dá bom dia a cavalo”.  “Galinha que muito sassarica quebra o bico”. “À mulher de César, não basta ser honesta, tem que parecer honesta”.

Mas deixe eu ficar quieto, porque “porco metido leva arame no focinho”.

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