Greve dos Servidores Ambientais: O Dilema Político do Governo Lula

Eles nos empurraram para uma greve e agora tentam nos ameaçar com judicialização. Mas a verdade é que o governo está em uma posição delicada

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*Wallace Rafael Rocha Lopes

No sábado, 22 de junho, o site Metrópoles publicou uma matéria dizendo que, na próxima semana, a AGU acionará o STJ para decretar a ilegalidade da greve do Ibama. “Acabou a paciência. Virou mais uma questão política que de direito sindical”, afirmou um ministro do governo, sob reserva.

Quem acompanha esse processo de negociação desde o início e viu tantos verdadeiros absurdos acontecerem sabe que isso já era esperado. Eles nos empurraram para uma greve e agora tentam nos ameaçar com judicialização. Mas a verdade é que o governo está em uma posição delicada.

A pergunta que fica é: será mesmo que este governo vai assumir, diante do Brasil e do mundo, uma postura persecutória contra os servidores da área ambiental, já tão assediados e humilhados no governo Bolsonaro? Mesmo com os servidores contando com o massivo apoio de boa parte de parlamentares (de direita, de centro e de esquerda), dos movimentos sociais pela causa ambiental e animal, dos artistas e da imprensa nacional e internacional que acompanhou e continua acompanhando toda a nossa trajetória de luta pela sobrevivência?

Se isso realmente acontecer, será um choque de realidade para muita gente, inclusive para muitos de nós que acreditaram que os tempos seriam outros depois de ajudarmos a colocar Bolsonaro na lata de lixo da história e de enfrentarmos com coragem e abnegação os milicianos escolhidos a dedo por Salles e seus asseclas para frear nosso ímpeto em proteger nossos indígenas, as unidades de conservação, nossa fauna, flora, biodiversidade e toda a política ambiental que ajudamos a construir.

Eu prefiro acreditar que este governo, e aqui leia-se LULA, coloque a mão na consciência, seja minimamente coerente com sua história sindicalista e com suas nítidas pretensões de se tornar uma referência mundial na questão ambiental e climática, e determine, ainda no início desta semana, a retomada das negociações que foram encerradas unilateralmente pelo representante designado no Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos (MGI), sem sequer analisar nossa proposta e muito menos a contraproposta que construímos na tentativa de facilitar um acordo.

Todo esse processo de negociação começou em outubro de 2023 e de lá para cá os servidores sempre se mostraram dispostos a colaborar na construção de um acordo que considere a realidade dos dois lados da mesa, e não seja simplesmente uma imposição do “empregador” sobre o “empregado”, o que seria mais uma incoerência vexatória para um governo do dito “partido dos trabalhadores”.

Talvez seja válido lembrar que, nesses meses em que estivemos mobilizados, nós conseguimos mostrar para o mundo a relevância do nosso trabalho para o futuro de toda a humanidade, só que agora de uma outra forma. Digo de uma outra forma porque nós estamos mais acostumados a fazer isso literalmente doando nossas vidas em campo, como foi o caso dos nossos colegas Olavo, Rochinski, Raimundo, Welington, Gaspar e tantos outros. Tudo isso para que os representantes desse país possam estufar o peito cheio de orgulho na frente de chefes de Estado de outros países para dizerem “nós estamos fazendo a nossa parte e agora os países ricos precisam fazer a sua”.

Agora isso não será mais possível. O voluntarismo que fez a gente entregar os resultados de 2023, como a redução contundente do desmatamento na Amazônia, com a mesmíssima estrutura combalida que foi herdada do governo anterior, não existe mais. Agora, o que nos move é a certeza de que somente com um MMA, Ibama, ICMBio e SFB fortalecidos nós iremos parar de enxugar gelo e caminhar para uma sustentabilidade verdadeira. E isso começa com servidores públicos valorizados.

E é por isso que, mesmo que este governo continue esse show de incoerências, mesmo que toda a nossa depauperada estrutura ainda assim seja considerada essencial e que sobrevenha uma improvável decisão judicial contra um direito que também pertence aos trabalhadores e trabalhadoras da área ambiental, nossa luta vai continuar e cada vez mais fortalecida. Vão descobrir da pior forma que, do jeito que a área ambiental foi e continua sendo relegada, nós servidores só teremos condição de fazer o ordinário, e talvez nem isso. Sem o nosso EXTRAordinário, a área ambiental naturalmente morrerá por inanição. Sem o nosso sangue e suor, não tem Marina na lista de personalidades da revista Time; não tem Lula discursando bonito na COP; não tem desenvolvimento, muito menos um que seja sustentável.

Que venha o assédio judicial, moral e institucional… que venham os abusos, as perseguições e a imposição de toda a cartilha do governo Bolsonaro contra os servidores ambientais mais uma vez. Nós continuaremos aqui honrando o nosso compromisso com a sociedade e lutando para que meio ambiente e sustentabilidade sejam mais que palavras bonitas para florir discursos políticos.

*Wallace Rafael Rocha Lopes é diretor adjunto da Ascema Nacional (Associação Nacional dos Servidores da Carreira de Especialista em Meio Ambiente), sendo analista ambiental do Ibama desde 2009, onde já atuou em diversas áreas. Compõe o quadro de Agentes Ambientais Federais e Coordenadores de Operações de Fiscalização Ambiental no Cerrado e na Amazônia. É bacharel e mestre em Engenharia Ambiental (UFT) e doutorando em Desenvolvimento Sustentável (UnB). É membro da Frente Ampla de Desenvolvimento Socioambiental (FADS).


Fonte:  Jornal GGN

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