A pergunta que Guilherme Boulos terá de responder: quanto vale Jerusalém?

jerusalém

Por Douglas Barreto da Mata 

Não é novidade para ninguém, que teve a paciência de conviver comigo, mais de perto, que eu sou um cinéfilo.  Entendo a essência do teatro, como real possibilidade do ator exercer seu ofício, mas sempre me apaixonou a 7ª arte, por sua complexidade construtiva, a necessidade de juntar um monte de gente e recursos para criação e narração de uma história.

Para mim, esse vetor principal do filme é a pergunta que Balian, o Barão de Ibelin (Orlando Bloom), faz a Saladin (Ghassan Massoud), às portas da muralha de Jerusalém, que estava prestes a ser dizimada pelos muçulmanos:  “Quanto vale Jerusalém?” Ao que Saladin responde: “Jerusalém vale tudo, Jerusalém vale nada”. 

Essa resposta, além de revelar a reconhecida sabedoria do líder islâmico, filosoficamente propõe, ali, naquele momento dramático, que as coisas valem o valor que damos por elas, e espicha um pouco mais o dilema, para perguntar também: o que somos capazes de fazer por aquilo que acreditamos?

Essa é a base de boa parte de nossas relações sociais, e…políticas. Motivação.

Uma lição, que deveria ser estudada com carinho pelos “petistas da feijoada”, de Campos dos Goytacazes, o pessoal do “sou PT, mas voto Feijó”, e que hoje se encastelou na campanha de Jefferson como cruzados em Jerusalém, mas sem a menor noção dos que os cerca, ao contrário do protagonista do filme.

No dia de hoje, a mídia nacional se debruça sobre a pergunta, que Guilherme Boulos terá que responder:  Quanto vale São Paulo?

Sim, estabilizado, momentaneamente, no topo das intenções de voto na corrida paulista, mas sem chance de resolver no primeiro turno, o cruzado terá que conversar com Ricardo Nunes, atual prefeito, candidato à reeleição, e apadrinhado por ninguém menos que Jair Messias Bolsonaro.

Nem vou mencionar a tragédia de um segundo turno com Pablo Marçal, porque, sabemos, a direita e sua parcela mais extremada vão convergir contra o cruzado Boulos.

Porém, se esse quadro atual se consolidar, o que farão Lula e Boulos? Há hipóteses. Jair Bolsonaro, apesar de se comportar como um imbecil, de imbecil nada tem.  É preciso não confundir o personagem com quem o interpreta. O ex-presidente sabe que existem chances reais de seu grupo não levar a prefeitura paulistana, o que mexe no tabuleiro de 2026, e etc.

Jair sabe da importância de SP, mas sabe que sem poder concorrer em 2026, seu grupo e seu capital políticos perigam minguar, inclusive com a chance de que outros aspirantes ao local que ele ocupa apareçam.

Ele já deu a entender que a “normalização” da tensão política, que é seu principal alimento, ameaça a diluição dos extremos no grande caldo de cultura e tesão nacional, o centro!  Baixou decreto ex-presidencial proibindo o PL de se coligar com os vermelhos nessas eleições.

Jair precisa de anistia ou, melhor e mais, precisa de um amplo acordo político e jurídico (como se os dois fossem coisas separadas, rs) para ser colocado de novo no páreo.  O cálculo dele, pode passar, eu imagino, por uma “liberação” de Nunes para negociar com Boulos, exigindo em troca que Lula trabalhe pelo consenso da sua anistia, seja lá com o argumento ele tenha que usar, já que nesse movimento, caberia a maior parte do prejuízo a Lula.

Lula, ele mesmo, já andou acenando com essa possibilidade, dizendo que o país precisa se pacificar, talvez, com a esperteza que só ele tem, a dos sobreviventes, de que teria que fazer essa jogada em algum tempo futuro, que parece ter chegado.  Quem olhar mais de perto vai poder perceber que o “afastamento” de Bolsonaro dos dois pólos da direita em São Paulo é mais que má vontade, porque Ricardo Salles não foi declarado candidato, como ele desejava.

É, em parte, isso, no entanto, é mais.  O truque está em se poupar do desgaste de explicar a sua base fiel de fanáticos que ele negociaria com Lula e Boulos, caso fosse um padrinho mais ativo de Nunes.  Novamente, Jair vai “terceirizar” o prejuízo da conversa a Nunes, e se duvidar, vai até fazer alguma declaração (combinada) contra a conversa Nunes/Boulos, enquanto negocia por trás.

É um aprendizado, como já disse, para o pessoal do PT, da feijoada campista.

No fim, a realidade se impõe sobre as idiossincrasias, o que é ótimo, aliás. Na verdade, tudo isso que escrevi pode não passar de mera especulação, e é, na medida que mesmo que haja estas conversas, raramente um dos atores envolvidos a confirmaria.

A questão de fundo, ou central é: a necessidade de ter essa conversa, e a possibilidade que ela exista, não nessa ordem.

O pessoal daqui tenta justificar suas posições com sofismas, do tipo, Wladimir é Bolsonaro, ao mesmo tempo que mentem ao dizer que não há diferenças entre o prefeito e a delegada, enquanto, ingenuamente, tentam esconder o fato de que agem a mando dos padrinhos da moça, como, como linha auxiliar da extrema-direita.

Agora, o líder maior, Lula, pode ter que conversar com seu arqui-inimigo, e inacreditavelmente, trabalhar para que ele volte ao cenário eleitoral.  Fica a dica:  Inimigo, ou você aniquila de vez, ou se prepara para negociar com ele.

Quanto vale Jerusalém? Quanto vale São Paulo? Quanto vale o PT de Campos?

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