Há poucos dias um leitor deste blog me cobrou uma reflexão mais apurada sobre o que representou o colapso catastrófico do conglomerado de empresas pré-operacionais do ex-bilionário Eike Batista, e me comprometi a dar uma resposta mais completa quando pudesse na forma de uma postagem, e é isso que tentarei aqui.
A primeira coisa que me veio à mente foi a entrevista que concedi ao Instituto Humanitas da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos) e que foi publicada online em 19 de Novembro de 2013 (Aqui!). A começar pela sugestiva chamada da matéria “Colapso de Eike Batista é ensaio do que virá com a manutenção das Parcerias Público-Privadas”, creio que naquele momento já era possível oferecer uma boa perspectiva acerca do futuro dos chamados “campeões nacionais” que se tornaram célebres durante os dois mandatos do presidente Luís Inácio Lula da Silva, os quais em sua maioria resultaram em grandes fracassos e que causaram graves prejuízos ao tesouro nacional.
Lamentavelmente toda a crise que vem assolando o governo da presidente Dilma Rousseff, bem como sua guinada em direção a um receituário neoliberal, vem impedindo que se faça uma reflexão sobre quais foram os erros que permitiram que não apenas Eike Batista, mas outros “campeões nacionais” não se colocassem à altura das expectativas. Além disso, tampouco foi operado qualquer esforço para estabelecer mecanismos de controle sobre as empresas envolvidas em projetos alinhados, ao menos em tese, com o que se convencionou rotular de “neodesenvolvimentismo“. Punir eventuais usos indevidos de recursos aportados via diferentes bancos públicos (a começar pelo BNDES), isto então nem pensar. Um bom exemplo desse tipo de prática leniente é o comportamento lerdo que tem caracterizado o trâmite dos processos existente contra Eike Batista dentro da Comissão de Valores Mobiliários (CVM).
Dentro deste cenário, o meu prognóstico é que não apenas não foram aprendidas as lições necessárias para impedir apostas em tigres de papel como Eike Batista se mostrou ser, como também não se fez nada, como já disse acima, para desenvolver mecanismos voltados para punir eventuais desvios de recursos públicos. O resultado disso é péssimo, pois além de não haver qualquer ganho em termos de controle das relações entre entes públicos e privados, o que aumenta a sensação de impunidade, e, consequentemente o descrédito nas instituições de Estado que deveriam zelar pelo uso correto de recursos públicos.
Alguém poderia me lembrar das rumorosas operações alcunhadas de Lava Jato e Zelotes como prova de que estou errado em minha análise. Mas eu convido os mais otimistas para verificar qual tem sido a repercussão objetiva em termos de salvaguardas que possam ser usadas para impedir que os crimes ocorram. Nesse sentido, a ação do Ministério Público por mais rigorosas que pareçam ser, não passam nem perto de impedir que as portas dos cofres públicos sejam arrombadas. Quando muito a Lava Jato e a Zelotes são tramelas colocadas após o ladrão entrar e sair de uma casa com dinheiro e pertences. A razão para isso é só uma: as elites brasileiras não tolerariam que o Estado se negasse a fornecer os beneplácitos que têm sido oferecidos desde que as naus portuguesas aportaram na costa da Bahia em 1500.
Outro aspecto que me parece merecer atenção é o fato de que no emblemático caso do Porto do Açu, todas as inúmeras violações de direitos sociais e os danos ambientais que vem ali ocorrendo desde 2009 continuam literalmente impunes. E o pior é que não apenas Eike Batista continua objetivamente desobrigado de responder pelas ações que foram cometidas em seu nome até a débâcle do Grupo EBX, mas como também se encontram desobrigados a responder por suas obrigações todos os agentes públicos e autoridades eleitas que colaboraram para que isto ocorresse.
Essa situação de completa falta de “accountability” por parte dos responsáveis, e consequente impunidade, é que me faz ter a certeza de que as principais lições do colapso do império “X” não foram aprendidas, o que torna a sua repetição quase uma certeza, ainda que o nome das empresas e empreendimentos quebrados sejam outros. E eu não tenho dúvida de apontar de que não se trata de “se vai acontecer”, mas de “quando vai acontecer”. A razão para isto é simples: a impunidade é o maior dos incentivos para a repetição de erros. A ver!