
A situação ambiental na bacia do Rio Doce já não era boa antes do rompimento da barragem do Fundão da Mineradora Samarco (Vale+BHP Billiton), mas piorou consideravelmente após o início do TsuLama. É que somado aos problemas da erosão de encostas e lançamento de rejeitos urbanos e industriais, há agora a carga física dos rejeitos entulhando trechos inteiros da calha principal do Rio Doce, e que causa reverberações no fluxo hídrico de seus tributários.
Se somarmos a situação do rio à ocorrência de chuvas torrenciais, como está ocorrendo nas últimas semanas, a possibilidade é que as cidades situadas à beira do Rio Doce comecem a sofrer com inundações que, por tabela, trarão para o interior delas parte dos rejeitos que escaparam em Bento Rodrigues.
Pois bem, observando jornais mineiros e capixabas já posso dizer que passamos do campo da possibilidade para o da realidade. Informações divulgadas pela CPRM e pelas redes sociais dão conta de uma abrupta elevação da cota, e de episódios de inundação em várias cidades, incluindo Governador Valadares (MG) e Colatina (ES).
Logo no início do surgimento do TsuLama comentei aqui no blog e em entrevistas a jornalistas que uma das possíveis consequências do aumento da carga de sedimentos na calha dos rios atingidos direta ou indiretamente pelo problema seria justamente a propensão ao aumento de inundações. Para dizer isso me baseei numa monografia que orientei sobre os efeitos do derrame de bauxita em Miraí (MG) e que atingiu o Rio Muriaé, e que teve como consequência direta o aumento de inundações.
O problema das inundações é apenas mais um que decorre do TsuLama, mas é um particularmente importante porque tenderá a ter efeitos de multiplicação no tempo e no espaço. É que parte significativa do material acumulado na calha do Rio Doce irá demorar muito tempo para chegar ao oceano, o que provavelmente causará a repetição de inundações anuais, mesmo em anos em que o montante de chuvas não justifique a ocorrência.
Por essa e outras é que o recente acordo entre o governo federal e os de Minas Gerais e Espírito Santo com a Vale e a BHP Billiton se torna completamente esquisito. É que em vez de oferecer leniência e o controle efetivo da situação às corporações, o caminho que deveria estar sendo adotado deveria ser justamente o oposto, ou seja, a adoção de punições exemplares e o fortalecimento dos órgãos ambientais.
Agora, aos habitantes das cidades próximas do Rio Doce e de seus tributários o caminho é cobrar a responsabilização de quem causou o TsuLama. Do contrário, o tango da impunidade vai continuar, mas quem vai realmente dançar serão os próprios atingidos.