Uma bandeira necessária, um debate urgente: a reabertura do Restaurante Popular em Campos dos Goytacazes

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Por Luciane Soares da Silva*

Tenho acompanhado com atenção a questão da reabertura do restaurante popular de Campos. Em primeiro lugar, acho fundamental ao processo democrático a prática do debate público ampliado. Ou seja, fora das esferas estritamente governamentais. Em segundo lugar, recebi com celeridade todos os esclarecimentos solicitados à Secretaria de Desenvolvimento Humano e Social. Mas com boas intenções não se faz necessariamente uma boa política pública e creio que é necessário explicitar o que tenho visto neste processo.

Ampliar este debate é urgente. Precisamos compreender as mudanças na forma de funcionamento do Restaurante Popular em Campos dos Goytacazes. Compreendi que existe uma defesa do acesso universal por parte do Conselho de Assistência Social em detrimento das formas segmentadas de acesso apresentadas pela Prefeitura. E isto me pareceu absolutamente correto. Mesmo compreendendo a função do Cadastro Único, fico em dúvida sobre dividir em 3 grupos os usuários a partir de critérios como renda (situação de extrema pobreza, usuários cadastrados no Cadastro único e demais usuários). Creio que esta é uma das diferenças principais na posição de Conselheiros e Prefeitura.

O funcionamento de um Conselho é algo importante para o aprimoramento da democracia. E aqui, torna-se especialmente importante pela qualidade dos conselheiros envolvidos nesta construção. Uma vez eleito, ele deve ter poder efetivo em sua ação, não pode ser uma peça decorativa.

Acredito que seria fundamental a apresentação de um projeto, não sobre segurança alimentar (que me parece aliás ser muito mais amplo e complexo do que o modelo disposto para Campos pela Prefeitura, sendo um legado do governo Lula para o país). Seria fundamental compreender: a) a necessidade real de atuação de uma empresa terceirizada; b) a forma de contratação dos pequenos agricultores, já que suas condições são singulares e muitas vezes, precarizadas quanto ao escoamento da produção e documentação; c) o cálculo para estabelecimento dos valores praticados pois estão altos em relação a outros restaurantes populares no país, embora o poder público possa declarar o contrário; d) a relação entre o recolhimento de alimentos a serem reaproveitados e a empresa que os reaproveitará. 

Mesmo que estas explicações já tenham sido prestadas nas instâncias devidas, me parece necessário que estudantes, trabalhadores e demais usuários da cidade, possam acessar a informação com transparência. E não creio que seja correto ver nesta solicitação a ação de uma oposição soturna e mal intencionada. A oposição em um sistema democrático é absolutamente saudável. Há que se apresentar o máximo de informações e esgotar o diálogo antes que a Câmara de Vereadores aprove um projeto (seja o de segurança alimentar inclusive) de tamanha importância. Como seria diferente? Por que seria diferente?

Exatamente porque a transparência é um ideal que diferencia gestões, estas questões poderiam nortear um projeto. Ouvir quem está realizando o Café Solidário, ouvir os comerciários do centro, ouvir a população em situação de rua, os pesquisadores do tema e incorporar sugestões antes da reabertura.

Um dos maiores problemas que encontrei no acompanhamento desta reabertura são as informações desencontradas. Há quem pense que o restaurante terá gratuidade (pois esta declaração de fato foi dada), há quem não saiba o que é o Cadastro Único, há quem esteja desempregado e não corresponda a nenhuma das faixas estabelecidas por não enquadrar-se na classificação de “extrema pobreza”. Aqueles que se arvoram a gerir a coisa pública, não devem agir com ansiedade ou irritação diante das demandas da sociedade civil. Creio que há sim que se falar de envio de projeto á Câmara pois não cabe ao gestor estabelecer o conteúdo da ação da sociedade civil e de seus representantes.

Não cabe questionar a forma da produção de documentos. Se foram escritos a mão, se não dominam exatamente o linguajar jurídico, se apresentam erros de português. Nada disto invalida o essencial: a organização dos interessados na defesa de um bem público. Se estes julgarem que a qualidade da informação é insuficiente, estão absolutamente legitimados para apresentação de todo tipo de questionamento dentro do período estabelecido por lei. E creio que é este o caso. Como é este o caso em várias outras esferas da administração Diniz, conhecida por sua dificuldade de diálogo. Compreendo que a falta de experiência anterior possa produzir insegurança. O próprio prefeito ao gravar um vídeo chamando o ex governador Anthony Garotinho para briga, expôs publicamente estas fraquezas. Mas passado o tempo, é hora de assumir com probidade os processos de gestão. Cessando com os discursos que endereçam a terceiros as responsabilidades que cabem unicamente a esta atual administração municipal.

Sem clareza na apresentação do funcionamento da relação jurídica entre as partes envolvidas, todo o discurso sobre inclusão, segurança alimentar, ampliação do atendimento, perde força, transformando-se em um engodo para a população. Lembrando que o valor subsidiado pelo governo municipal é dinheiro do contribuinte. Ou seja,mais uma razão para entender porque teremos de pagar X ou Y por uma refeição. Seria importante sabermos se de fato seria mais custoso, moroso e burocrático ter a Prefeitura como principal ente de operação do restaurante sem a empresa terceirizada. E seria igualmente importante saber quais empresas se apresentaram e com quais condições de operação, ou seja, como será feita a licitação para isto.

Para conversar com a população e sobre o restaurante, será realizada na segunda feira, dia 17 de dezembro as 9:00 horas, uma plenária pública sobre o tema em frente ao Restaurante Popular atualmente fechado. Todos os setores da sociedade civil estão convidados. Será fundamental a presença de representantes da Prefeitura de Campos dos Goytacazes, afinal é uma grande oportunidade de conversar diretamente com os usurários do serviço sobre a reabertura e as formas de funcionamento. Mesmo após o fechamento, o endereço segue como ponto de aglutinação de pessoas em busca de alimento. Creio que esta parcela da população tem direito a refeições de qualidade e informação. 

*Luciane Soares da Silva é presidente da Associação de Docentes da UENF (ADUENF)  e chefe do Laboratório de Estudos da Sociedade Civil e do Estado  LESCE/UENF

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