Uma das primeiras e mais grotescas decisões do início do governo Bolsonaro foi a edição da Medida Provisória nº 870, de 1º de janeiro de 2019, de revogar disposições constantes da Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional (Losan), que visa assegurar o direito humano à alimentação adequada. A medida na prática esvazia o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea) e encerra décadas de uma esforço coletivo para a eliminação da fome no Brasil.
À primeira vista esse desmantelamento visaria apenas remover da esfera de decisões organizações não governamentais e movimentos sociais de uma área estratégica para a formulação de políticas públicas. Aliás, ninguém que acompanhou a trajetória de Jair Bolsonaro pode se sentir surpreso com a dissolução do Consea.
O problema é que entre as atribuições do Consea estava não apenas garantir que todos os brasileiros tenham acesso cotidiano a alimentos, mas também que estes sejam saudáveis, livres de doenças e contaminações.
E aí que parece residir o nó da questão. Os latifundiários que passaram a exercer forte influência em ministérios estratégicos não possuem o menor interesse de que a população tenha maior controle sobre, por exemplo, o tipo de agrotóxico e a quantidade que é usada na produção dos alimentos que chegam à mesa dos brasileiros.
A extinção prática do Consea impedirá que políticas em prol de alimentos saudáveis possam ser formuladas e, menos ainda, executadas sob o controle da população. Em termos ainda mais sombrios, o que teremos pela frente é a possibilidade de que a comida que os brasileiros, especialmente os segmentos mais pobres da população, esteja ainda contaminada por resíduos de agrotóxicos, muitos dos quais já foram banidos em outras partes do planeta.