Apesar dos recordes de liberação de agrotóxicos, muitos deles banidos em outras partes do mundo, a sede por veneno não parece nem um pouco próxima de ser saciada. Isso é o que indica a chamada de uma consulta pública pelo Ministério da Agricultura (MAPA) para permitir a aceleração dos processos de registros de agrotóxicos, utilizando o que eu classifico como uma estratégia de “licenciamento fast food”, na medida em que a segurança dos trabalhadores e os riscos ambientais e para a saúde humana serão secundarizados em nome de se beneficiar o combate a um determinado número de ditas pragas agrícolas que estão acometendo as grandes áreas de monoculturas de exportação.
Um dos detalhes mais pitorescos (na falta de melhor palavra) é o fato que “os pleiteantes de processos de registro de agrotóxicos já protocolados poderão, no período de 30 dias da publicação dessa Portaria, candidatar até 20 processos para o processo de seleção de prioridades de que trata essa Portaria.”. Em outras palavras, serão os produtores de veneno que ditarão as prioridades de liberação, a despeito da existência de produtos similares no mercado ou, mais importante ainda, do grau de toxicidade das substâncias que deveriam ser analisadas para liberação.
E o que fica mais evidente ainda é que a análise das prioridades ficará a cargo apenas do Ministério da Agricultura, sem que sejam ouvidos outros órgãos como a Agência Nacional de Vigilância Sanitária e o Ibama. Este medida já parece ser uma consequência direta dos termos estabelecidos pelo Decreto 10.833 assinado pelo presidente Jair Bolsonaro no dia 08 de outubro de 2021, e que já foi condenado em nota técnica assinada por uma série de pesquisadores e organizações da sociedade civil.
A verdade é que esta portaria do MAPA adota uma forma bem draconiana de auto licenciamento em uma área em que o Brasil já lidera o mercado mundial em termos do uso de substâncias altamente perigosas para o ambiente e a saúde humana. Com isso, os problemas que serão disparados com o uso intensivo e disseminado de substâncias causadoras de diversos tipos de doenças deverão aumentar exponencialmente. E tudo isso em nome do aumento das taxas de lucros aviltantes que os controladores do mercado mundial de grãos já auferem.
Enquanto isso investir em sistemas agroecológicos que dispensem o uso de quantidades gigantescas desses venenos agrícolas continua a ser prioridade zero para Jair Bolsonaro e para a ministra Tereza Cristina.
Por fim, uma curiosidade. Ao consultar a página do Ministério da Agricultura e abrir a janela das chamadas “Consultas Públicas“, não encontrei nenhuma que se refira à Portaria Nº 451.
Vejam abaixo o que diz na Portaria Nº 451, de 19 de novembro de 2021l
Art. 1º Determinar o rito de seleção de processos de registro que comporão a lista de prioridades do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento.
Art. 2º O Departamento de Sanidade Vegetal e Insumos Agrícolas da Secretaria de Defesa Agropecuária publicará no site do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento a lista de pragas prioritárias.
§1º O Departamento de Sanidade Vegetal e Insumos Agrícolas escolherá 10 pragas da lista de pragas prioritárias;
§2º As pragas selecionadas serão elencadas em ordem numérica de acordo com prioridade estabelecida pelo Departamento de Sanidade Vegetal sendo ordenadas de acordo com o Anexo II;
Art. 3º Os pleiteantes de processos de registro de agrotóxicos já protocolados poderão, no período de 30 dias da publicação dessa Portaria, candidatar até 20 processos para o processo de seleção de prioridades de que trata essa Portaria.
§1º Os processos e respectivas pontuações deverão ser entregues ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento por meio do Formulário contido no Anexo III;
§2º Erros de preenchimento e cálculo no Anexo poderão inabilitar a pleiteante ao processo de seleção;
§3º Empresas que não houverem comercializado no ano anterior ao menos a metade dos agrotóxicos dos quais seja titular de registro terão seus produtos inabilitados.
§4º A pleiteante deverá concordar com a divulgação pública do requerimento de registro contido no processo que vier a ser priorizado.
Art. 4º Os processos apresentados conforme Artigo 3º serão ordenados pela pontuação obtida a partir da fórmula constante no Anexo I e a lista deverá ser publicada pela Coordenação-Geral de Agrotóxicos e Afins do Departamento de Sanidade Vegetal e Insumos Agrícolas em sítio eletrônico do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento.
Art. 5º Os produtos com maior pontuação serão distribuídos na planilha do anexo II de acordo com os seguintes critérios:
§1º O produto com maior pontuação será vinculado à praga prioritária de maior importância controlada por ele;
§2º Os demais produtos serão distribuídos sob mesmo critério do §1º até a completude da planilha;
§3º Produto com mesmo ingrediente ativo de produto selecionado com maior pontuação não será escolhido para a mesma praga prioritária;
§4º Produtos já listados não serão incluídos mais de uma vez independentemente de conterem recomendações para outras pragas prioritária;
§5º Em caso de empate na pontuação serão escolhidos os produtos com maior número de pragas-alvo controlada;
§6º A Coordenação-Geral de Agrotóxicos e Afins auditará o cálculo dos Pontos de Produto dos produtos selecionados;
§7º Erros de cálculo ou informações inverídicas poderão implicar na inabilitação de todos os processos da pleiteante;
§8º Casos omissos serão resolvidos pela Coordenação-Geral de Agrotóxicos e Afins;
Art. 6º Cada produto formulado priorizado automaticamente priorizará no máximo 1 (um) produto técnico para cada ingrediente ativo contido na sua formulação.
Parágrafo único. Quando o produto formulado priorizado selecionado contiver mais de um produto técnico por ingrediente ativo, a empresa pleiteante deverá indicar ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento qual produto técnico deseja priorizar
Art. 7º Serão selecionados no máximo 30 produtos formulados para priorização.