Os estudos acerca dos impactos da ideologia Neoliberal já trouxeram inúmeros “insights” sobre o que acontece com os seres humanos que se deixam absorver pela visão de mundo que a mesma oferece [1 e 2]. A coisa vai da solidão profunda, passa pelo consumismo desenfreado e acrítico, e desemboca na completa insensibilidade frente aos semelhantes a partir de uma visão completamente individualista de realização pessoal, já que tudo deve ser resolvido a partir da capacidade de competir e, sim, vencer [3].
É interessante notar que no bojo da aplicação das políticas neoliberais houve um crescimento exponencial das taxas de desemprego e a precarização do acesso aos elementos de mitigação das enfermidades sociais e clínicas desenvolvidas a partir da criação de uma visão de mundo que por um lado infatiliza e, por outro, objetifica todas as relações pessoais e inter-pessoais.
O problema é que vejo grassando na atual greve dos professores da Universidade Estadual do Norte Fluminense uma síntese de todas essas características neoliberais. É que de um lado os professores em greve são pintados como demônios insensíveis que não se preocupam com os impactos na formação dos alunos transformados em consumidores de conhecimento. Entretanto, em contrapartida, não há qualquer menção de se cobrar do (des) governo Pezão que pare de asfixiar financeiramente a instituição, fato esse que não apenas está no bojo da greve, como também impedirá que o estudante/consumidor=cliente possa alcançar uma formação minimamente qualificada para que possa assim pleitear uma colocação num mercado que cada vez cobra mais excelência para os poucos escolhidos para terem empregos. E, pior, com a aceitação tácita de que os fornecedores do conhecimento (i.e., professores) devam fazer isso, em que pese a falta de salários e condições de trabalho. A eles importa apenas o pleno exercício da sua condição de clientes preferenciais.
E aí parece residir uma das grandes dificuldades para se enfrentar as deformações psicossociais originadas pela hegemônia da ideologia neoliberal. É que o cidadão transformado em consumidor se torna plenamente apático quando se trata de enfrentar o aparato estatal que age para restringir o número de aquinhoados com as possibilidades de acessar os arquétipos que representam o sucesso no mundo neoliberal.
Certamente desconstruir a ideologia neoliberal não é uma tarefa simples, já que ela hoje se apresenta como hegemônica. Mas como Karl Marx já elaborou de forma seminal na “Ideologia Alemã”, a saída do labirinto neoliberal se dará a partir do oferecimento de práticas materiais que apontem no sentido da superação de seu modelo de mundo. E nas atuais circunstâncias da Uenf, por exemplo, aqueles que falam na superação das ideologias como método de volta a uma normalidade intangível sabem perfeitamente que estão exercendo práticas para evitar a fuga do labirinto em que se colocaram e querem atrair mais companhias para, provavelmente, diminuir a solidão em que se meteram.
[1] https://link.springer.com/article/10.1057/pcs.2014.5
[2] http://naspa.tandfonline.com/doi/pdf/10.2202/1940-1639.1620?needAccess=true