O jornalista (neo) con e blogueiro da Veja, Leandro Narloch, possui um blog onde se titula um “caçador de mitos” e disseminador de “uma visão politicamente incorreta da história, ciência e economia”. Pois bem, na postagem, Narloch, o autodenominado “caçador de mitos” faz uma tentativa (bisonha diria eu) de refutar o perigo que os agrotóxicos representam para a população brasileira (Aqui!) .
Um leitor mais leigo que ler o subtítulo da postagem de Narloch já vai ser levado a uma falsa compreensão da realidade. É que as amplas evidências dos problemas causados por agrotóxicos sobre os sistemas naturais e a saúde humana não são mero jogo estatístico divulgado por “ONGs e ativistas”. Na verdade, em que pese alguns números divulgados de forma mais solta, os problemas associados ao uso intensivo de agrotóxicos já possuem uma ampla literatura científica, que torna iinevitável até para a indústria produtora de venenos agrícolas ter de reconhecer os efeitos colaterais dos agrotóxicos.
Narloch também nos oferece uma visão simplista do processo de contaminação de alimentos por agrotóxicos ao omitir informações cruciais para que se entenda como se dá a assimilação sistêmica de determinadas substâncias, os herbicidas, até o processo de contaminação “cruzada” que é causada pelo fenômeno da deriva de agrotóxicos, processo esse que implica que mesmo culturas que não foram alvo do uso de agrotóxicos também podem ser contaminadas.
O “caçador de mitos” também nos priva de uma análise mais acabada do que acontece aos agrotóxicos após serem lançados no ambiente. É que ao repercutir de forma acrítica a informação dada pelo agrônomo Alfredo José Barreto Luiz, da Embrapa Meio Ambiente de que um “prazo é calculado para que as substâncias químicas ativas dos agrotóxicos já tenham se transformado em outras (pela ação da temperatura, luz, umidade etc.), restando em quantidade tão reduzida e diluída que não oferece mais perigo”, Narloch omitiu a informação crucial de que a maioria das substâncias químicas ativas que compõe os agrotóxicos normalmente geram subprodutos, os quais podem ser ainda mais tóxicos para o ambiente e seres vivos. Aliás, para não errar dessa forma, o jornalista (neo) con deveria apenas se lembrar da máxima cunhada em 1777 por Lavoisier de que “na natureza nada se cria, tudo se transforma”.
Outro fato importante que foi omitido na postagem de Leandro Narloch é que o Brasil hoje é um paraíso de substâncias que foram banidas em outras partes do mundo, principalmente na Europa, por causarem graves danos ambientais e a saúde humana. Assim, ainda que o uso por hectares possa ser aqui maior ou menor do que em outras partes do mundo (uma informação que precisa ser constantemente checada porque há um paulatino abandono dos agrotóxicos por determinados países enquanto aumenta no Brasil), o fato é que aqui estamos consumindo legal e ilegalmente produtos que foram banidos em outras partes do mundo, incluindo a China. Aliás, eu e outras colegas da Universidade Estadual do Norte Fluminense mostramos isso num artigo publicado na revista científica Crop Protection em 2012 (Aqui!).
Para coroar sua suposta tentativa de desconstruir o mito de que estamos sendo envenenados por agrotóxicos por meio do consumo de alimentos contaminados, nos fornece a sugestão de que podemos almoçar tranquilos já que não ingerimos “5 litros de agrotóxicos por ano”. Além dessa sugestão ser uma simplificação do uso do quantidade como elemento demonstrativo do problema que é o uso excessivo de agrotóxicos no Brasil, a mesma esconde o fato de que análises feitas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) vem consistentemente documentando a presença de resíduos de agrotóxicos em vários alimentos fartamente consumidos pelos brasileiros. Em outras palavras, não há nenhuma razão objetiva para “almoçarmos tranquilos”. Aliás, a situação é, ou deveria ser, de extrema preocupação já que os efeitos documentados do contato prolongadaos com agrotóxicos incluem câncer, autismo, doenças no sistema nervoso, e por ai vai.
Finalmente, há que se frisar que ao nos oferecer uma visão rósea do problema ao sugerir que há algo parecido com o consumo seguro de agrotóxicos, visto que não há. Ao fazer isto, o (des) construtor de mitos nada mais faz do que propagar o mito de que há um uso seguro para esse grupo de substâncias. A verdade é que não há, e qualquer coisa que sinalize o contrário, não passa de mito. Mito esse, frise-se, cuja manutenção interessa apenas à indústria química e ao latifúndio agroexportador. Simples assim!