No reino do “licenciamento ambiental Fast Food”: Consema/SP aprova obra de transposição em santuário ecológico baseado em inócuo plano de monitoramento

Abordei aqui em diferentes postagens o imbróglio que havia se tornado a aprovação do projeto da Sabesp para realizar a transposição do Rio Itapanhaú para supostamente atender a demanda hídrica no chamado sistema do Alto Rio Tietê (Aqui! Aqui!). Todo o problema começou quando um parecer técnico emitido pela Fundação Florestal condenou o Estudo de Impacto Ambiental (EIA) por causa das fragilidades e omissões técnicas que o mesmo continha (Aqui!).

Depois deste parecer, o problema foi se arrastando até que um dos diretores da Fundação Florestal, Carlos Zachi Neto, deu a esperada chancela com base num inócuo plano de monitoramento sobre a intrusão da língua salina no interior do ecossistema em que o Rio Itapanhaú está inserido (Aqui!).

Pois bem, agora acabo de ser informado, para nenhuma surpresa para mim, que o Conselho Estadual do Meio Ambiente (Consema) de São Paulo aprovou nesta 3a. feira (27/07), a obra de transposição do Rio Itapanhaú com base no tal plano de monitoramento proposto pela Sabesp e chancelado pela Fundação Florestal (Aqui!).

A primeira questão que emerge desta decisão é que a mesma se dá ao arrepio de um parecer técnico que efetivamente desvelou a baixa qualidade técnica do EIA apresentado pela Sabesp. E em vez de se seguir o sóbrio parecer emitido inicialmente pela Fundação Florestal, o que se viu foi uma sucessão de ações que possibilitaram a liberação da obra no dia de hoje.  Esse é para mim o aspecto mais problemático, pois se é possível aprovar a transposição de um rio colocado dentro de uma região de alto interesse ecológico com base num inócuo plano de monitoramento, e sem quaisquer medidas de mitigação, estão abertas as portas para que o “licenciamento ambiental Fast Food” possa cumprir plenamente o seu papel de efetivamente regredir o processo de avaliação de impacto ambiental para antes da década de 1970. E isso não é apenas lamentável, mas extremamente perigoso dado o precedente que abre para se aprovar qualquer coisa que seja, independente de custos sociais e ambientais.

Uma segunda questão é que graças a uma injunção de fatos desconectados, a aprovação de hoje pode se tornar tão inócua quanto o tal plano de monitoramento proposto pela Sabesp, e agora aceito pelo Consema/SP.  Quais são estes fatos em minha opinião?  O primeiro deles é que há um parecer técnico que, apesar de ignorado, apontou para as claras limitações do EIA apresentado pela Sabesp. A isso se soma uma cobertura jornalística qualificada a partir das matérias escritas pelos jornalistas Giovana Girardi,  Fábio Leite (ambos do Estadão) e Miguel Martins (da Carta Capital) que tratou o problema de forma clara e isenta. Esses dois fatos somados dão ao Ministério Público de São Paulo a possibilidade de questionar todos as evidentes limitações que embasaram a decisão do Consema/SP.

Esse caso é tão emblemático do processo de regressão do processo de licenciamento ambiental que já convidei uma parceira de pesquisa para elaborarmos um estudo comparativo do processo de licenciamento feito no Porto do Açu em São João da Barra, que ficou a cargo do Instituto Estadual do Ambiente  do Rio de Janeiro (Inea), com este relacionado ao Rio Itapanhaú, que foi realizado pela Companhia Ambiental do estado de São Paulo (Cetesb). É que dado o conhecimento que acabei tendo dos dois casos, a minha hipótese é que nenhum dos documentos preparados para obter as licenças passaria pelos critérios internacionais de avaliação. 

Mas uma coisa é certa. Quando se trata de usar as melhores técnicas para avaliar a viabilidade e os impactos de projetos que interferem na saúde dos ecossistemas, no reino do “licenciamento ambiental Fast Food” vale mesmo aquela Lei de Murphy que postula que “nada está tão ruim, que não possa piorar”.

6 comentários sobre “No reino do “licenciamento ambiental Fast Food”: Consema/SP aprova obra de transposição em santuário ecológico baseado em inócuo plano de monitoramento

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    • Ana Carolina,

      Eu, na verdade, já li todos esses pareceres. Por isso mesmo resolvi abordar novamente esse assunto no meu blog. E concordo com você que entre o segundo parecer e o que Sr. Carlos Zacho assinou há algo muito incoerente. Minha torcida é que o Ministério Público de São Paulo continue tratando desse caso como tem sido noticiado.

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  2. Prezado, vc poderia consultar o processo da Fundação Florestal, onde o Sr Carlos emitiu parecer desfavorável em 14/04/16. Depois, sem justificativa técnica desconsiderou tudo que ele mesmo havia escrito e assinado e liberou a obra mediante “monitoramento “.

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